A escola era num bairro de alunos de classe média e média baixa. Todos se conheciam, pois estudavam desde o Jardim de Infância. Consequentemente, a amizade era de longa data.Não obstante,haviam as rivalidades que surgiram com o passar do tempo ou com aqueles alunos que chegavam de outras escolas. Os professores conheciam todos. Costumes,potencialidades,dificuldades,os pais e até mesmo os avós.A escola era uma verdadeira família e os alunos se comunicavam sem necessitar falar tal o nível de conhecimento que possuíam uns dos outros.
A turma era do terceiro ano do ensino médio e já se ia quase a metade do ano. O professor Rinaldo era querido por todos e tinha uma forma peculiar de ministrar as suas aulas que os alunos mostravam interesse e aprendiam bastante. Havia Reginaldo,um gordinho muito safado com cara de bebê que aprontava todas.O Severino era um magrão que esqueceu de parar de crescer e se destacava na turma,lógico,pelo seu tamanho e um vozeirão de amedrontar.Janira era a espoleta que acompanhava as travessuras dos seus colegas e vivia dando gargalhadas por qualquer coisa e José que era um problema.Esquecido,tonto e muito nervoso era "tirado" sempre para sofrer nas mãos de seus colegas.
E foi com ele que aconteceu uma “ocorrência” das brabas num certo dia. O professor Rinaldo estava ministrando uma “aula daquelas”, todo concentrado e eufórico por seus alunos estarem prestando muita atenção. O assunto era interessante para os alunos e por isto todos prestavam a atenção.Um cochicho aqui e outro ali era o máximo que se ouvia,além da voz do professor. José estava com os olhos e boca tão abertos olhando para o professor falar que este lhe dirige uma pergunta:
- José está entendendo o que estou falando?
- Hein?
- Perguntei se estás compreendendo o que estou explicando?
- O quê? -Por favor, José, preste a atenção, pois desta forma perderás o “fio da meada”!
- Fio do quê? Acho que já perdi.
E, era este o grande defeito do José. Perdia tudo.Cadernos,livros,o inseparável boné (quando não o perdia),o horário,enfim era um esquecido. E a aula já se ia para o seu final. Haveria um intervalo e depois o professor Rinaldo continuaria na mesma turma para mais um período.
-No próximo período usaremos o livro e anotaremos algumas coisas no caderno, falou o professor Rinaldo. Ele mal tinha acabado de falar e José interveio.
-Professor eu esqueci meu caderno e livro da sua matéria. Trouxe todos os outros livros e cadernos,menos estes ! A turma caiu na risada.
- Isto é filme velho, professor, o José não esquece o que está grudado no corpo, pois o resto já era, diz Reginaldo. E o sinal estridente do intervalo foi ouvido. Os alunos foram para o pátio gozar de seu recreio.
No retorno do intervalo o professor Rinaldo deparou-se com um pequeno tumulto no fundo da sala de aula e no meio dele está José branco como papel e muito nervoso.
- O que aconteceu aí, questiona o professor em tom de voz firme.
- Olha só o que fizeram com meu material escolar professor! É uma barbaridade! Por que não vão fazer isto com as coisas das mães deles!
José berrava já iniciando um choro de desespero. Professor Rinaldo se aproxima do bolo de alunos que rodeiam José e sua classe, abre caminho por entre eles e se depara com algo inusitado. Todo o material escolar do José estava geometricamente empilhado em cima da classe atravessado, geometricamente no centro,por um prego monumental que saia do outro lado do tampo da mesa.
- O que é isso? Quem fez isto? Pessoal, isto é coisa que se apronte? Quem foi o mentor e o executor desta barbárie?- professor Rinaldo mantinha a fleuma, mas por dentro era uma cascata de risos. A cena era insólita, indisciplinada e ao mesmo tempo cômica. Como tiveram aquela idéia ? Indaga a turma e nada. O silêncio era fúnebre.Depois de usar de todos os seus artifícios de educador e até uma veia longínqua de policial,o professor determinou que chamassem a diretora da escola para solucionar o caso.
Lá veio a professora Ernestina. Uma dama no trato com os alunos.Calma,firme e comedida em suas palavras e ações ouviu atentamente o relato do professor. Parou em frente a turma,olhou no rosto de todos,respirou profundamente e com um esboço de sorriso tímido se dirigiu candidamente para Reginaldo e disse:
-Por favor, Reginaldo, pegue seu material e me acompanhe até a sala da Direção sem discussões prévias.
Reginaldo num vermelhão pegou seus livros e cadernos, colocou embaixo do braço e saiu em direção ao corredor.
-Por favor, José, disse a diretora, pegue seu material e se dirija, também, a sala da direção.
-Sim senhora, estou indo...para onde mesmo ?
E a turma veio abaixo numa gargalhada sonora quando José agarrou seu material para colocar embaixo do braço e a classe veio junta. A diretora e o professor não agüentaram ver a cena dantesca e tiveram que se unir aos risos da turma.
-Desculpe, esqueci que pregaram meu material na classe.
Na sala da direção a professora Ernestina questiona Reginaldo:
-Por que pregaste o material do José na classe?
Reginaldo sentado em frente à diretora levanta os olhos com aquela carinha de bebe e dispara:
- Todo o mundo diz que o José esquece tudo, só não esquece o que está pregado no corpo. Preguei o material dele na classe para ele não esquecer em casa.
- Três dias de suspensão e só volta com o pai e a mãe, e vê se não esquece!
E José olha par a diretora e pergunta ansiosamente ?
- E porque mesmo a senhora me chamou aqui ?
Autor:
Renato Hirtz
Nenhum comentário:
Postar um comentário