Imediatistas do amanhã
Das coisas todas que leio sobre educação e
escolarização, suas mazelas, teorias de "tecnoeducadores", relatos de
professores, pais e comparando anos anteriores com os atuais cheguei a
uma conclusão.
O aluno de hoje não vive o presente, ele é um
imediatista do amanhã. É uma falsa visão do futuro vazio. Quem não vive
o dia de hoje não organizará seu futuro, pois não há passado e muito
menos termos de comparação para priorizar ações. Nosso jovem não é
imaturo ao concluir o seu ensino
fundamental ou médio. Apenas não tem parâmetros da sua história passada e
do seu presente. É difícil encaminhar a educação e a escolarização
dentro de uma situação assim. Temos que pensar formas de contextualizar
educação e a escolarização de tal forma que a produção do conhecimento
não se desagregue do ontem, para que haja o entendimento do hoje e
reflita de modo produtivo no amanhã.
Renato Hirtz
Setembro de 2014
Fonte da imagem:
Idéias
Mais importante do que fabricar um computador assim como
todos seus efeitos sociais e econômicos foi a ideia de construí-lo. Mais
importante do que a fabricação de um carro e todos os efeitos na vida
humana, foi a ideia de criá-lo.
Quem tem ideias ( comumente chamado de inventores ) são as peças mais importantes dentro de todo o contexto humano.
Sempre incentivei as feiras de ciências nas escolas por onde passei e tudo o que levava o aluno a criar, inventar ou ter ideias.
Fossem elas as mais mirabolantes ou até mesmo utópicas. O essencial é
levar o aluno a formular ideias-pensar-criar-expor usando da informação
que lhe é transmitida e através do seu conhecimento construído.
Atualmente observo que deixamos no passado este tipo de atividade onde
se oportuniza a produção de ideias. Elas, as ideias, são a mola
propulsora em todas as atividades do ser humano.
E as escolas que
trabalham com projetos integradores e multidisciplinares incrivelmente
desenvolvem no educando o processo de criação de ideias e a construção
do seu conhecimento.
Renato Hirtz
Fiorela e a queda
Uma mulher vistosa.
Extremamente objetiva e excelente no
comando de uma equipe de trabalho. Sua voz rompia o silêncio dos corredores e
salas da repartição pública onde trabalhava. Sempre com um sorriso nos lábios
possuía uma habilidade no trato dos problemas mais simples aos mais complexos. Era
uma fonte de energia e transferia com
facilidade esta capacidade aos seus comandados.
Não
havia trabalho ou problema que lhe causasse algum desconforto. Vestida com
elegância, sempre maquilada e sobre seus sapatos de saltos alto somava-se a uma
boa varrida numa faxina em uma sala até recepcionar com todo o cerimonial
devido uma autoridade que vinha tratar assuntos profissionais. Sempre possuía
uma solução na ponta da língua. Detentora de raciocínio rápido vislumbrava
sempre uma alternativa de solução para algum entrave que surgisse.
Não
se descuidava de sua aparência. Social ou despojadamente mantinha uma elegância nata. Sempre nas
quartas-feiras, por força de suas horas extras, tirava um tempinho para ir ao
salão de beleza para tratar seus cabelos, pele e principalmente as unhas. Deixava toda a
rotina de trabalho direcionada de tal forma que nada ficasse pendente na sua
ausência.Verificava a situação de cada setor sob sua responsabilidade. Nada
podia parar por estar ausente. Depois de todo um ritual de orientações e
repetidas verificações de que tudo andaria em nível de excelência partia para
sua sessão de embelezamento.
Naquela
tarde alguns problemas deveriam ser solucionados ao final do expediente e ela
deveria retornar. Nada podia sair fora de seu conhecimento e comando. Dispensou
o uso do carro. Foi lépida e faceira caminhando até o instituo de beleza. Era
assim que às vezes chamava. Como já tinha uma certa idade, na sua época esta
era a denominação dos atuais salões de beleza. Uma caminhada de ida e volta lhe
faria bem. Entre muitos cumprimentos aos conhecidos e alguns admiradores chegou
ao seu destino.
Entre
lavar, tratar e mudar a tonalidade da cor dos cabelos conversava alegremente com
suas conhecidas. Ali era uma espécie de central de notícias novas e
oportunidade de relembrar casos passados. Fazer as unhas das mãos e dos pés era
a próxima etapa separada por um paradisíaco cafezinho. Era um momento seu. Coisa
que beirava a magia de histórias de princesas. Tudo pronto e satisfeita com o
resultado é hora de retornar ao mundo real. Despedidas feitas,sai em direção ao
prédio onde trabalha.
Sua
sensação era de que todos na rua sabiam que ela havia saído de um instituto de beleza.
Novamente entre acenos e expressões de saudações aos que a conheciam cuidava
para não roçar as mãos em
nada. Numa sacola iam seus sapatos. Nos pés um chinelo de
dedo para não estragar o esmalte. Deveria ficar bem seco para voltar a calçar
seus habituais sapatos de salto alto. A cor do esmalte contrastava com a cor de
sua pele. Ficará muito bonito.
Atravessando
uma rua e outra, passando pelos transeuntes com cuidado para não pisarem em
seus pés chegou a uma parada de ônibus. Ali se aglomeravam muitas pessoas na
expectativa da chegada dos coletivos. A calçada ocupada no seu todo impedia a
sua passagem. Desviou para o leito da rua e o bendito chinelo de dedo solta uma
das tiras. O desequilíbrio foi inevitável. O tropeço mais ainda. E diante de
uma pequena multidão, Fiorela, desaba. Foi ao chão por inteira.
Socorrida
por alguns cidadãos prestativos ergueu-se tentando manter sua altivez e sorriso
machucado e embaçado pelo tombo. Agradecida segue quase em disparada na direção
do local onde trabalhava. Sacola rasgada,chinelos na mão,joelhos esfolados e
cabelo desfeito era o verdadeiro quadro da dor e sem a moldura. Poderia ter
quebrado um dos pés ou uma das mãos.Quem sabe um braço. Imagina se tivesse
contundido o rosto.
Sua
chegada na repartição foi um alvoroço. Sua situação gerou as mais diversas
reações. Das tradicionais expressões de espanto até risos contidos giravam em torno da chefe. Entre encontrar
paninhos e água para lavar os machucados, escova para reparar o penteado e
palavras de consolo ouve-se as primeiras palavras de Fiorela.
-
Calma gente. Calma.Vamos manter a calma. Foi só um susto. Ainda bem que
consegui salvar o esmalte das unhas das mãos e pés ! Ainda bem. Nenhum arranhão
no esmalte ! O cabelo se dá um jeito. Vamos voltar ao trabalho.
E
lá se foram todos de volta a rotina.
(Renato Hirtz – 2012 – Lembrança
de um fato real)
Geração do Eu
Interessante
como os conflitos de gerações permanecem ao longo do tempo, mas com
instrumentos diferentes. Houve um tempo que os conflitos de gerações se
originavam pela forma da expressão musical que determinavam os padrões de
comportamento da nova geração. Logo adiante a moda ditava a forma de se rebelar
contra os paradigmas da geração anterior através de roupas extravagantes, uso
dos cabelos cumpridos pelos homens e o uso de entorpecentes. Uma ridicularizava
a outra por seus comportamentos tidos como ultrapassados ou absurdos. Por aí, e
sempre as gerações antecedentes conflitavam com os novos rumos das gerações seguintes.
As duas absorviam com relutância o antigo e o novo.
Estas
influências entre uma e outra geração foram seguindo seus passos e configurando
padrões sociais, políticos e econômicos. A geração Baby Boomers compunha-se
daqueles que traziam em sua conduta a consideração ao próximo, seguidora dos
valores morais, forte civismo, possuidora de religiosidade e apego as tradições
e coletivamente participativa. Surgia logo após a II Guerra Mundial e por todo
o contexto trazia as sequelas do horror do combate bélico. Aí possuir a
característica da fraternidade pós-guerra. Porém com o passar do tempo
tornou-se, aos olhos dos seus descendentes uma geração de caretas,
Com o desenvolvimento tecnológico e
industrial surge a geração X. Preocupada entre tantas outras coisas com a
liberdade do indivíduo, traz consigo o impulso do consumismo diante de tantas
ofertas que se apresentam. O poder de compra é foco. E para tal o dinheiro é
buscado de forma compulsiva. Com ele vem à preocupação com o brilho de sua
imagem social e, por conseguinte alcançar a fama diante do contexto onde está
inserido. Há um afastamento dos valores da geração Baby Boomers. Alguns
estudiosos falam da geração “do umbigo”. Cada um engajado em suas perspectivas
afastando-se do coletivo. O que mais importa é obter muito dinheiro, muitas
vezes sem preocupações com a forma, para obter os prazeres da tecnologia. Há
uma nítida desilusão com a forma de encarar o mundo da geração anterior. A
preocupação com os outros e vista como uma forma ultrapassada originando uma
decepção ao sentir que àquele também está usando-o para ultrapassá-lo em seus
objetivos.
A geração Milennials (geração Y) tem
em suas mãos o processo tecnológico muito mais acelerado colocando a sua
disposição recursos e ferramentas incrivelmente produtivas e prazerosas. Os
valores externos são muito mais importantes do que os valores internos, não
importando mais os enfadonhos discursos sobre moral, sentimentos e filosofias
de vida e religiosidade. Embora, se estes discursos servirem para obter uma
situação financeira melhor poderá ser seguido até por ali. A desconfiança passa
a ser um dos focos do comportamento. O sujeito que está ao meu lado é ou não é
meu algoz? Ou quem sabe será ou não o meu algoz para obter minha situação
financeira, meu cargo ou posição social? As relações se estabelecem como um
contrato onde a unilateralidade da vantagem seja minha. O companheirismo e amizades
se estabelecem por conveniências da manutenção do status, no mínimo, ou na
busca da ascensão seja ela qual for. Ganhar dinheiro é o objetivo.
Nos dias atuais o consumismo é
crescente por consequência da agressiva e massiva influência dos meios de
comunicação. De toda a ordem novos produtos e formas de manter a imagem, status
e tudo mais são lançados diariamente no mercado. A individualidade que foi
determinada pela internet e por todo o seu contexto provoca a solidão produtiva
e benéfica. Somos parte de grupos virtualmente. As amizades e as relações
passam a ser exercidas através de redes sociais. Num paradoxo, somos um grupo
formado por uma cadeira, telas e teclados que interagem com o mundo lá fora. Eu
aqui e os outros individualmente lá fora. É a geração Generation Me. Aquela do
“faça você mesmo”. Ela absorve esta nova juventude que nasceu junto ao
computador e sob o domínio da tecnologia. E para isto é necessário ganhar muito
dinheiro em detrimento de todo o resto. Ela passa a descrer das instituições,
das autoridades, do sentido de família, de regras e leis. A crença é em si mesmo.
Nada mais é relevante do que o “eu próprio” que tenho acesso a tudo e a todos
muito mais do que qualquer outro. As gerações passadas e seus preceitos básicos
são ridículos e ultrapassados. O mundo é dos Generation Me. Autossuficientes e
incrivelmente adaptados a si mesmo. O mundo é daqueles que não tem modéstia. Se
há equivocados, errados ou incoerentes... são os outros. Sempre os outros. Não
há tempo a perder com divagações. Hiperativo, produtivo e proativo.
Há muitos pontos positivos em todo
este processo? Não podemos negar. E como
será a próxima geração. Melhor ou pior do que esta? Vamos aguardar, solitários, para ver.
Renato Hirtz
Maio/2013
Ler ou não ler, eis a
questão
Às
vezes me pego tamborilando os dedos sobre o teclado. A vontade de escrever um
texto sobre determinado assunto esbarra em um questionamento que teima em
surgir cada vez que isto acontece. Quem vai ler? Quem vai se interessar sobre
aquilo que escrevo? O motivo de tudo isto esbarra numa avantajada muralha de
informações que estão a nosso dispor na internet. A internet veio dinamizar a
troca de informações. É muito rápida a veiculação de notícias, crônicas,
comentários e tantas outras formas de dizer alguma coisa. É óbvio que o volume
é imenso. Em contra partida observa-se que as pessoas estão cada vez mais
saturadas deste volume de informações e trazem sequelas do hábito de não gostar
de ler.
Penso
nos dias de outrora, não de forma melancólica. Longe disto. Lembro-me de como
as comunicações eram realizadas. Você queria se comunicar com um parente, ou
fazia por um gigantesco aparelho telefônico (comparado aos dias de hoje) ou
através de uma carta levada diligentemente por um carteiro. Pior quando o
amigo, parente ou sua amada não possuía o telefone. Cartas que levavam dias
para chegar e esperarmos outros tantos para a resposta. As notícias mais
atualizadas eram do final do dia anterior. O meio mais rápido, na época, era o
rádio. Notícias quentíssimas eram narradas de forma pomposa e sem nenhuma
interatividade possível. O que se poderia fazer era escrever uma carta ou
telefonar para participar de forma tímida com a emissora. Eis novamente os dois
baluartes da comunicação: o telefone e as famosas missivas.
Hoje,
quando abro minha caixa de e-mail aparece uma avalanche de comunicações. São
aqueles que comunicam novos trabalhos científicos realizados, outros que enviam
sugestões de como encarar a vida, os indesejados que ofertam desde jantares até
utilidades para o lar com lucros tentadores e os cheios de humor com piadas
envelhecidas pelo tempo e pela repetição. Há os enviados por amigos que
insistem na sua participação em correntes do bem ou do mal e os absolutamente
fanáticos por este ou aquele partido que tentam, pela repetição, fazerem com
que suas convicções políticas se alterem e você se filie e levante a bandeira
política dele. Recebo também, e-mail dos inventores de notícias que vem
trazendo a última que aconteceu com um famoso e completa com uma foto montagem
feita no Photoshop. E no final observa que a fonte da informação é extremamente
segura. E por aí vai.
E
nas redes sociais a coisa pega. É uma fonte riquíssima para estudos profundos
de psicologia, sociologia e antropologia. Chegaria ao ponto de dizer que
psiquiatras usam destas redes sociais para fazer análises gratificantes do
comportamento humano e suas mazelas. Ali se acha de tudo. E os mais frenéticos
“rede socialistas” não medem esforços para que sejam lidas e curtidas suas
informações. Claro, bloqueamos os indesejados nas redes sociais e nos contatos
de e-mail, assim como aqueles que seguimos no twitter. Não somos masoquistas ao
ponto de suportar com prazer informações de origem descabida ou sem conteúdo.
Com
tudo isto, volta a minha indagação inicial. Escrevo? E quem vai ler. Assim como
eu não tenho todo o tempo do mundo para assimilar este volume de informações e
passo batido por cima de muita coisa... quantos não fazem o mesmo. Por uma
série de motivos as pessoas não suportam mais explicações detalhadas ou textos
medianamente longos. No cotidiano, até por ser professor, quando vou explicar
alguma escuto com frequência a expressão: “resume”. Um aviso com mais de 3
linhas não é de todo lido. A informação tem que ser rápida e com isto o
conhecimento se torna cada vez mais superficial para a grande maioria.
Se
você chegou até... que bom. Você ainda tem paciência para ler e não aderiu à
nova moda: “resume”.
Renato Hirtz
Maio/2013
Síndromes do século 21
Interessante
observar alguns posicionamentos das pessoas diante de situações em suas relações
interpessoais. As atitudes tomadas mudam a cada tempo e elas se deixam envolver
por verdadeiros modismos que pensam facilitar o convívio na sua vida particular
ou profissional. Ao contrário, provocam improdutividade, conflitos e tornam-se
indivíduos intragáveis ao trato e a beira do ridículo. Até por que trazem em sua
bagagem certo grau de incompetência e frustrações pessoais e transfere isto
aqueles que inevitavelmente tenham que conviver com elas. Na realidade
tornam-se soberbamente insuportáveis quando portadoras destas síndromes da
moda.
Uma das “disfunções”
a que me refiro é a Síndrome do Noé. Esta enfermidade atinge aqueles que adoram
passar suas responsabilidades ou até mesmo seu alto grau de má vontade para a
pessoa mais próxima ou àquele seu desafeto na organização em que desenvolve
suas atividades. Nunca nada que é questionado ou solicitado é de competência
dele (até por que não há possui). Sempre o assunto ou a resolução de um
problema é com o próximo. Aliás, ele adora o próximo na medida em que este se
ferra trabalhando mais do que ele. A sua expressão é característica e
diagnostica sua doença ao ter na ponta da língua a expressão “no é cumigo”. O
cidadão entra numa repartição e faz uma saudação de bom dia e ela salta do seu
lugar dizendo “no é cumigo”. E já trata de indicar com quem devemos contatar. É
o retrato da má vontade faltando apenas um button com as iniciais MV. Leia-se
Má Vontade. O pior quando perde seu tempo argumentando um rol de justificativas
do seu impedimento em atender ao solicitante. A justificativa mais expressiva é
estar extremamente atarefada e com um descabido acúmulo de trabalho.
Outra terrível mal
que vem crescendo assustadoramente é a Síndrome da Gabriela. Os sintomas levam
a recordação da letra da música que diz “eu nasci assim, eu cresci assim...” É
o ícone da falta de estrutura emocional e da má educação. A pessoa em seu
delírio se diz autêntica, de personalidade forte, verdadeira e que diz aquilo
que pensa. Devemos suportar todos os seus desmandos verbais de forma pacífica e
até pedir desculpas quando ousamos levá-la ao entendimento de que certa atitude
não foi a mais correta para determinado momento. “Eu sou assim, sempre fui
assim direta, franca e digo o que penso”. E ela tem seus defensores que chegam
até nós contemporizando que devemos entender as pessoas, pois a fulana é
daquele jeito. Argumentam que ela necessita de entendimento, de paciência e que
esta característica é difícil de alterar. E nós? Onde vamos buscar um
tratamento para exorcizar sérias crises que ela provoca com sua conduta? Precisamos
ao contrário delas ter um alto grau de paciência e educação para conviver com
estes enfermos que veem a impossibilidade de mudar ou no mínimo possuir a
sensibilidade no trato com aqueles que convivem. A convivência se estabelece
para que possamos evoluir e a evolução deve ser sempre para melhor. Caso contrário
é deletéria.
“Alguém me disse”
é outra síndrome que afeta grande parte das pessoas. Ela possui outros nomes
vulgares como “Me contaram” ou “Fiquei sabendo”. É extremamente maligna e surge
em momentos impróprios de nossa rotina diária. O portador deste mal gosta de
conversar em corredores e locais ermos de uma repartição. Normalmente não gosta
de muita gente ao seu redor. Sua preferência é pelos sugestionáveis colegas e
amigos. Ele dispara suas frases “alguém me disse que a fulana... não sei se é
verdade...” e sai estrategicamente. A semente da maldade está plantada. Pronto.
Orgasticamente satisfeito aguarda a confusão ser formada. Caso venha a ser
inquirido por terceiros ou envolvidos de onde ele tirou seu dito usa
descaradamente a frase inicial “alguém me disse... não lembro quem...”. Pior é
quando introduz no orifício anal de quem nada tem haver com o caso a origem de
sua informação descabida. Infelizmente não assume nunca o que diz e sempre joga
a confusão armada no colo de um terceiro.
Existem muitas
outras síndromes nas relações interpessoais. Para não alongar muito o comentário
vamos a mais uma. Esta é a que provoca os maiores entraves na modernização,
produtividade e resultados positivos. É a denominada de “sim tá bom”. Outros
nomes a identificam: “sempre foi assim”, “decha sim”. O enfermo tem uma
insustentável incapacidade de aderir ao novo. Detesta transformações, alteração
ou inovações. Primeiro por que tem certo nível de dificuldade para aprender e
utilizar novas tecnologias. Segundo possui um apavorante medo de que estas
alterações lhe acarretaram um saldo maior de trabalho. Os colegas tem que
suportar sua morosidade tanto intelectual como produtiva. O que poderia ser
realizado em minutos ele leva horas com sua caneta esferográfica, lápis preto nº
2, uma borracha e papel carbono. Este é seu kit de trabalho. Até mesmo uma
modificação do layout no escritório lhe provoca de náuseas a uma inquietação
que chega as raias de uma crise de pânico.
E assim vamos nós
entre trancos e barrancos aguentando estes enfermos com os quais temos que
conviver e pior, possuem plena certeza que fazemos parte de um grupo de desumanos
que não possuem as mínimas condições de viver em sociedade.
Renato Hirtz - janeiro de 2013
Pedagogia e Andragogia – qual a diferença?
Pelo uso da palavra,
todo tem uma ideia do significado de Pedagogia. Ela tem origem grega. Paidós é
criança e agogé significa conduzir. Na realidade eram indivíduos sob a condição
de escravos que acompanhavam as crianças em suas atividades. Nos tempos atuais,
Pedagogia, é usada para a graduação em licenciatura que formará o pedagogo. No
seu âmbito de estudos há disciplinas filosóficas, científicas e
técnico-pedagógicas. Até bem pouco tempo conhecíamos este profissional atuando
na equipe diretiva de uma escola, interligando e interagindo com toda a equipe
profissional de um estabelecimento de ensino. O conjunto formado por estes
profissionais que atuam diretamente no processo de escolarização e educação tem
como orientador o que denominamos atualmente de pedagogo escolar. Ele atua para
que o processo pedagógico seja dinâmico, atual e produtivo pra ao educando. Pedagogia
num conceito bem amplo é a arte e a ciência de ensinar crianças. Nos dias
atuais, a atividade profissional de um pedagogo não se restringe ao âmbito
escolar, apenas. Sua inserção profissional tem uma gama de possibilidades. A
indústria, o comércio, a assistência social e muitas outras áreas de atividades
que necessitem de um processo educacional utilizam-se dos seus conhecimentos
para uma produtividade com ganho real.
O que há de novo nesta área de atuação é o tipo de
indivíduo que vai participar do processo educacional. Tradicionalmente a
pedagogia, como vimos, tinha seu foco na criança. A aprendizagem então segundo Knowles, seguia um modelo padronizado. Todo o processo era
de responsabilidade do professor para as decisões sobre o que será ensinado,
como será ensinado e se foi aprendido. É a educação dirigida pelo professor,
deixando para o aprendiz apenas o papel de submissão às suas instruções. E o
pedagogo tinha muito mais um papel de supervisor do que estava sendo ou não
cumprido, do que qualquer outra coisa. Existiam mecanismos e posicionamentos
quase que inflexíveis por parte dos educadores em relação ao seu pupilo. Acreditava
a pedagogia, ser a educação centrada no professor e da responsabilidade dele o
que deveria ser aprendido pelo educando. Isto ocorria devido a uma visão antiga
de que o aluno chegava à escola muito inexperiente e sem bagagem de conhecimentos.
Não se abria espaço para a criança ou o adolescente contribuir com sua parcela
na construção de seu próprio conhecimento. Os programas ou conteúdos
curriculares eram inflexíveis e uniformes. Ele era tratado como um ser passivo
que deveria aprender aquilo que era estabelecido pelo seu educador.
Segundo
Malcolm Knowles, a pedagogia era focada em aspectos que tornavam a
educação “envelopada”. Malcolm considera para uma analise do processo
pedagógico fatores como: a
necessidade de conhecer, autoconceito
do aprendiz, o papel da experiência, prontidão para aprender, orientação para
aprendizagem e a motivação. Quanto à necessidade de conhecer os educandos necessitam
saber somente o que o professor tem a ensinar, se quiserem a aprovação. Como
aplicarão estes conteúdos na sua vida futura não era levado em conta. O conceito
do professor sobre o aprendiz é o de uma pessoa dependente que necessitava ser “adestrada”.
Este era o autoconceito, um ser dependente. A experiência do aprendiz não era
levada em consideração. Não havia significado para sua aprendizagem. O que era
levado em conta era o conteúdo que o professor transmitia e o que estava
escrito nos livros. Daí a imperiosa necessidade das técnicas de repetição, memorização,
leituras, dever de casa e tudo o mais que levasse o aluno a decorar as
informações transmitidas. Nisto tudo se concentrava a metodologia da aprendizagem
ou pedagógica. Ou o aluno aprendia o que lhe era transmitido ou era retido no
seu nível até apresentar a capacidade de promoção, isto por que a orientação
para a aprendizagem se baseava em numa estruturação padrão de conteúdos programados
ou programáticos dentro do planejamento pedagógico. A lógica que acompanhava a
distribuição dos conteúdos era a da visão pedagógica da época e a motivação do
alunado partia da obrigatoriedade de alcançar uma média padrão obtida através
de provas, testes, trabalhos e exercícios de repetição.
Ainda se encontra, em muitas
instituições de ensino nos mais diversos níveis estruturas, planejamentos e
professores que se utilizam desta prática educacional para realizar a
escolarização de seus alunos. O mais impressionante, ainda nos dias atuais, é
encontrar profissionais da educação em ambiente acadêmico que pauta seu
exercício profissional nesta linha de pensamento. Ele é o ator principal e os
seus alunos desempenham o papel de coadjuvante. Nestas últimas décadas grandes
mudanças houve na visão de um processo educacional (ou pedagógico) mais
democrático. Democrático no sentido de que a dinâmica pedagógica deve ser uma
via de duas mãos. Aquele que ensina também aprende com seu s pupilos. Já vai
longe (findou em 1968) a imagem do professor catedrático que tinha o saber e a
verdade em suas mãos como algo findo. A educação evolui muito com o surgimento
de novos teóricos.Ao mesmo tempo há uma incompreensão na aplicabilidade destas
novas teorias. Se junta a isto o descaso do poder público no investimento e
adequação as novas tecnologias e processos educacionais. Soma-se, enfim, a tudo
isto a desvalorização do magistério como um todo.
Com
as novas visões de mundo, a necessidade de especialização profissional com o
objetivo de melhores salários e condições de vida o educando começaram a
transformar as suas características. As turmas, em sala de aula, já não
mantinham o antigo padrão de faixa etária. Cai por terra a relação entre faixa
etária e nível de aprendizagem. Os mais velhos, que não tiveram oportunidade de
aprender na “época devida” retornam a sala de aula. Muda o padrão da antiga
escola. Na mesma turma várias faixas etárias, objetivos diferenciados e bagagem
de experiências diferenciadas. Há uma enorme distancia, conforme os aspectos
levantados por Knowles, entre uma criança que inicia sua
alfabetização, o jovem que está no ensino médio e o adulto que irá se
alfabetizar ou terminar seus estudos. Os aspectos psicológicos, sociais e
individuais são extremamente diferentes. Obvio que as propostas de vida de uma
criança, jovem e o adulto são muito diferenciadas. E o professor continua sendo
o mesmo e as escolas com sistemas de ensino com as mesmas técnicas, dinâmicas e
pressupostos para as diferentes faixas etárias.
Surge então, a Andragogia (do
grego: andros - adulto e gogos - educar). É um caminho educacional que busca
compreender o adulto.
É a arte ou ciência de orientar adultos a aprender (definição creditada a Malcolm Knowles, anos 1970). Usa-se
este vocábulo para designar a educação voltada para o adulto, em contraposição
à pedagogia, que se refere à educação de crianças.
Esta nova forma de educar vem provocar uma nova visão do processo educacional.
KNOWLES, 1970 definiu este novo caminho como “a arte e ciência de orientar
adultos a aprender”. Há uma reviravolta nos conceitos educacionais e inicia-se
o processo da construção do próprio conhecimento, respeitando as
individualidades dos alunos, suas experiências de vida pré-escolar e durante
seu processo de escolarização. O professor passa a ser um orientador, moderador
ou tutor da construção do conhecimento de seu pupilo. CONNER, 1997 diz que a
Andragogia veio oferecer uma nova alternativa para pedagogia e refere-se à
aprendizagem em qualquer idade focada no estudante e não no professor. É o
aprender fazendo. Professor e aluno passam a ter uma responsabilidade
compartilhada na aprendizagem. Pierre Fourter (1973), diz que esta alternativa é um
conceito amplo de educação do ser humano, em qualquer idade.
Eduard Lindeman (1926) identificou pontos-chave para a educação de
adultos, mais tarde transformaram-se em suporte de pesquisas. Hoje são fundamentos
da moderna teoria da aprendizagem de adulto. “A orientação de aprendizagem do
adulto está centrada na vida; por isto as unidades apropriadas para se
organizar seu programa de aprendizagem são as situações de vida e não
disciplinas. A experiência é a mais rica fonte para o adulto aprender; por
isto, o centro da metodologia da educação do adulto é a análise das
experiências”.Cavalcante (1999) estabelece as diferenças entre a Pedagogia e a
Andragogia.Segundo ele, na Pedagogia os
objetivos são definidos e formulados pelo professor. Já na Andragogia os
objetivos são negociados com a participação livre e crítica do estudante. Vale
ressaltar que pedagogia e andragogia não se apresentam como formas antagônicas
de ensino e sim como práticas complementares (SILVA: 2004). Na verdade as duas
concentram-se na a arte e ciência de ensinar e conduzir as pessoas tenham elas
a idade que for.
RenatoHirtz
Dezembro 2012
Da informação ao conhecimento
Muitas vezes questionei a
diferença entre uma pessoa bem informada de outra que possui conhecimento.
Já encontrei pela minha trajetória de vida muitas bem informadas e que não
possuíam nenhuma habilidade no manejo destas informações. Outras apresentavam
uma capacidade de desempenho em determinadas funções sem ter quase nada de
informações sobre aquilo que estavam fazendo.
Há poucos dias li um artigo
publicado na Harvard Business Review onde Davenport
definiu conhecimento como a informação interagindo com 4 fatores importantes: a
experiência, o contexto, a interpretação e a reflexão. Estes combinados entre
si resultam na utilização da informação para que possamos agir tomando decisões
produtivas em nossas vidas. É improdutivo termos uma grande quantidade de
informações sejam elas específicas ou genéricas se não obtivermos um produto
seja ele econômica ou socialmente aproveitável. Em resumo, a informação deve
ser vivenciada para gerar conhecimento. Ela vem estruturada como pequenos
blocos e muitas vezes embutidas de sutis sugestões ou manipulações conforme as
tendências da fonte de origem. São dados inertes e só produzem efeito quando
manipuladas e interpretadas. Foray enuncia que “o conhecimento é uma questão de
capacidade cognitiva”. E capacidade cognitiva envolve os 4 fatores citados
anteriormente. Outro aspecto interessante que distingue um de outro é sua forma
de aquisição. A informação é adquirida a um custo muito próximo do zero.
Raramente requer um esforço maior do que a leitura de um jornal assistir um
programa de televisão ou uma palestra. Por mais interessante que seja nos
embute na mete dados inertes. Já o conhecimento é gerado, produzido por vias
mais complexas, como já vimos. Há um esforço relevante que envolve esta
construção. E pior, este intricado processo de construção de um conhecimento é
extremamente difícil de ser comunicado a outros. Esta passagem quase inexiste.
Cada um tem que passar pelos fatores envolventes que, sendo repetitivo, são a
experiência, o contexto, a interpretação e a reflexão.
Aí relembro meus saudosos dias
de professor e minhas leituras atuais sobre a Educação (prefiro falar em
Escolarização) e as ideias ditas inovadoras sobre ela. Percebo que continuamos
insistindo na relação professor/aluno. Um ensina e o outro aprende. O que
ensina ou tenta repassar informações ou conhecimento. O outro deve mostrar que
possui capacidade de acumular informações ou reproduzir teoricamente o
conhecimento. Na verdade o caminho é a construção do conhecimento. Ela é
individual, sem tempo determinado e dentro de um contexto que engloba as
relações interpessoais, com objetivos comuns. É necessário a vivencia na
prática a partir de informações fornecidas ou buscadas nos mais diversos
veículos midiáticos. È imprescindível direcionar esta construção do
conhecimento para comunidades afins dos mesmos interesses práticos.
Renato Hirtz
Novembro de 2012
Fonte da imagem:
Casamento romântico
As
transformações sociais são muito sutis. Os anos setenta marcaram uma mudança
que venho se desenhando aos poucos e se transformando numa nova forma de relacionamento.
Houve um movimento muito forte da libertação feminina.Este foi resultado de uma
caminhada que teve seu início em anos anteriores sob forte pressão até mesmo
das próprias mulheres. Regras, tabus e lendas sobre o universo feminino
começaram a ser questionadas e quebradas por este movimento.
Os
séculos anteriores ao vinte impunham um contexto machista ao comportamento
feminino e seu papel na sociedade. Todo o desempenho da mulher como parte
integrante da família, nas suas relações sociais e por ventura nos seus
vínculos empregatícios era limitado por regras rígidas que permeavam o empírico
até o âmbito religioso. Havia limites que estabeleciam um padrão moral e ético
da mulher. Na esfera judicial ainda há resquícios de uma legislação que
beneficiava o homem em detrimento ao lado feminino. Deveres eram muitos e
direitos quase nada.
As
obrigações matrimoniais vinham carregadas de funções e responsabilidades muito
mais para o lado da mulher impondo rigorosos castigos ou provocavam escândalos
quando não cumpridos. A educação familiar calcava uma orientação neste
sentido.Ao homem tudo ou quase tudo.A mulher, quem sabe, além das prendas
domésticas a sorte de ser professora ou membro de uma associação religiosa
firmemente observada pelos seus pares.
E
por aí podemos dar inúmeros exemplos do papel quase insignificante da mulher na
sociedade humana. Porém,com o passar dos anos, com os movimentos feministas e
toda a tecnologia que foi se agigantando e facilitando a comunicação de massa a
mulher foi conquistando o seu lugar em meio a tudo isto.E ultrapassou muitas
barreiras. Hoje assume postos antes nunca sonhados nem pelo homem e muito menos
por ela mesma. E exercendo atividades nunca imagináveis, aproxima de si
tensões, problemas e até mesmo doenças que eram típicas da atividade masculina.
E
neste turbilhão da liberdade busca freneticamente manter a liberdade
conquistada e almejar sempre mais. E aí surgem as primeiras mudanças na relação
homem e mulher. E com tudo isto o dia de uma mulher tornou-se muito curto para
tudo o que ela deseja fazer. O trabalho, a carreira, quem sabe mais um curso de
aperfeiçoamento, os filhos, o marido e as lidas da casa. Pouco tempo. Com isto
as mulheres mais jovens estão optando por sua carreira em detrimento de uma
vida conjugal que chamo de casamento romântico. Elas estão estabelecendo
relações com seus parceiros de forma contratual. Uma das cláusulas é exatamente
o não comprometimento de sua relação com o outro em função de seus objetivos de
vida. E elas assumem este propósito, muitas vezes, sacrificando até mesmo
aqueles bons momentos de romantismo.
A
mulher como ser humano tem, também, a necessidade de crescer intelectualmente e
profissionalmente. Penso que ela deve ser independente. Sou a favor da igualdade entre os indivíduos
seja qual for a sua opção sexual. Uma relação entre duas pessoas é feita por
concessões, trocas e aprendizados. Deveria ser um horror aqueles casamentos
arranjados dos séculos passados onde um suportava o outro em nome das
convenções sociais e obrigações matrimoniais. O que vislumbro é o fim do
casamento tradicional, dentro das convenções sociais onde o homem era a cabeça
da família e a mulher o esteio do lar. Aquele par de eternos namorados que
passeiam pelos jardins e parques de mãos dadas. As trocas de gentilezas e
caricias não serão mais vistas. Quem sabe até aquela mesa bem para o almoço de
domingo que congregava os partícipes da família sejam raras, regadas a um bom
macarrão, galeto e salada de maionese. O ritual de preparar-se para deitar e
dormir juntos não sejam mais feito pelo par. E tantas outras atividades que
aproximavam o casal se extingam.
Pela
velocidade adquirida pelos compromissos, tanto do homem como da mulher, não há
mais tempo para detalhes. Responsabilidades se acumulam as soluções não esperam
e a produtividade aponta a linha de chegada. Nada pode impedir a caminhada. Se
o parceiro não acompanha o melhor a fazer é dispensá-lo sabedor que tenho a
minha independência garantida. Filhos não são bem vindos nesta etapa e se
vierem para tomar muito tempo disponível é melhor não tê-los. Não há mais
relação de identidade com a casa que não há tempo para arrumar. A casa é
coordenada e tem a face da diarista que toma conta deste departamento. As
amizades e relações sociais são feitas em meio às atividades via dispositivos midiáticos.
Entramos num redemoinho dirigido por um sistema (chamo eu) consumista. Uma
guerra de poder. O melhor carro, o melhor aparelho de TV, o melhor isto e
aquilo. Tudo do bom e do melhor que pouco uso, mas possuo. Até o sexo deve ser
muito rápido e rapidamente dar prazer. Se não der prazer aqui, talvez encontre
logo ali.
Não se estabelece relações duradouras que venham atrapalhar o foco
das metas propostas. Tudo feito muito às pressas para não perder tempo. E vão
se perdendo momentos inesquecíveis em troca de momentos fúteis e vazios. A
relação mais duradoura que se observa é com as cartelas de antidepressivos e
ansiolíticos. Este é a estrada pela qual caminhamos.
Renato Hirtz
Outubro de 2012.
Fonte da imagem:

Das coisas todas que leio sobre educação e escolarização, suas mazelas, teorias de "tecnoeducadores", relatos de professores, pais e comparando anos anteriores com os atuais cheguei a uma conclusão.
O aluno de hoje não vive o presente, ele é um imediatista do amanhã. É uma falsa visão do futuro vazio. Quem não vive o dia de hoje não organizará seu futuro, pois não há passado e muito menos termos de comparação para priorizar ações. Nosso jovem não é imaturo ao concluir o seu ensino fundamental ou médio. Apenas não tem parâmetros da sua história passada e do seu presente. É difícil encaminhar a educação e a escolarização dentro de uma situação assim. Temos que pensar formas de contextualizar educação e a escolarização de tal forma que a produção do conhecimento não se desagregue do ontem, para que haja o entendimento do hoje e reflita de modo produtivo no amanhã.
Renato Hirtz
Setembro de 2014
Fonte da imagem:
Idéias
Mais importante do que fabricar um computador assim como todos seus efeitos sociais e econômicos foi a ideia de construí-lo. Mais importante do que a fabricação de um carro e todos os efeitos na vida humana, foi a ideia de criá-lo.
Quem tem ideias ( comumente chamado de inventores ) são as peças mais importantes dentro de todo o contexto humano.
Sempre incentivei as feiras de ciências nas escolas por onde passei e tudo o que levava o aluno a criar, inventar ou ter ideias. Fossem elas as mais mirabolantes ou até mesmo utópicas. O essencial é levar o aluno a formular ideias-pensar-criar-expor usando da informação que lhe é transmitida e através do seu conhecimento construído.
Atualmente observo que deixamos no passado este tipo de atividade onde se oportuniza a produção de ideias. Elas, as ideias, são a mola propulsora em todas as atividades do ser humano.
E as escolas que trabalham com projetos integradores e multidisciplinares incrivelmente desenvolvem no educando o processo de criação de ideias e a construção do seu conhecimento.
Renato Hirtz
Fiorela e a queda
Uma mulher vistosa.
Extremamente objetiva e excelente no
comando de uma equipe de trabalho. Sua voz rompia o silêncio dos corredores e
salas da repartição pública onde trabalhava. Sempre com um sorriso nos lábios
possuía uma habilidade no trato dos problemas mais simples aos mais complexos. Era
uma fonte de energia e transferia com
facilidade esta capacidade aos seus comandados.
Não
havia trabalho ou problema que lhe causasse algum desconforto. Vestida com
elegância, sempre maquilada e sobre seus sapatos de saltos alto somava-se a uma
boa varrida numa faxina em uma sala até recepcionar com todo o cerimonial
devido uma autoridade que vinha tratar assuntos profissionais. Sempre possuía
uma solução na ponta da língua. Detentora de raciocínio rápido vislumbrava
sempre uma alternativa de solução para algum entrave que surgisse.
Não
se descuidava de sua aparência. Social ou despojadamente mantinha uma elegância nata. Sempre nas
quartas-feiras, por força de suas horas extras, tirava um tempinho para ir ao
salão de beleza para tratar seus cabelos, pele e principalmente as unhas. Deixava toda a
rotina de trabalho direcionada de tal forma que nada ficasse pendente na sua
ausência.Verificava a situação de cada setor sob sua responsabilidade. Nada
podia parar por estar ausente. Depois de todo um ritual de orientações e
repetidas verificações de que tudo andaria em nível de excelência partia para
sua sessão de embelezamento.
Naquela
tarde alguns problemas deveriam ser solucionados ao final do expediente e ela
deveria retornar. Nada podia sair fora de seu conhecimento e comando. Dispensou
o uso do carro. Foi lépida e faceira caminhando até o instituo de beleza. Era
assim que às vezes chamava. Como já tinha uma certa idade, na sua época esta
era a denominação dos atuais salões de beleza. Uma caminhada de ida e volta lhe
faria bem. Entre muitos cumprimentos aos conhecidos e alguns admiradores chegou
ao seu destino.
Entre
lavar, tratar e mudar a tonalidade da cor dos cabelos conversava alegremente com
suas conhecidas. Ali era uma espécie de central de notícias novas e
oportunidade de relembrar casos passados. Fazer as unhas das mãos e dos pés era
a próxima etapa separada por um paradisíaco cafezinho. Era um momento seu. Coisa
que beirava a magia de histórias de princesas. Tudo pronto e satisfeita com o
resultado é hora de retornar ao mundo real. Despedidas feitas,sai em direção ao
prédio onde trabalha.
Sua
sensação era de que todos na rua sabiam que ela havia saído de um instituto de beleza.
Novamente entre acenos e expressões de saudações aos que a conheciam cuidava
para não roçar as mãos em
nada. Numa sacola iam seus sapatos. Nos pés um chinelo de
dedo para não estragar o esmalte. Deveria ficar bem seco para voltar a calçar
seus habituais sapatos de salto alto. A cor do esmalte contrastava com a cor de
sua pele. Ficará muito bonito.
Atravessando
uma rua e outra, passando pelos transeuntes com cuidado para não pisarem em
seus pés chegou a uma parada de ônibus. Ali se aglomeravam muitas pessoas na
expectativa da chegada dos coletivos. A calçada ocupada no seu todo impedia a
sua passagem. Desviou para o leito da rua e o bendito chinelo de dedo solta uma
das tiras. O desequilíbrio foi inevitável. O tropeço mais ainda. E diante de
uma pequena multidão, Fiorela, desaba. Foi ao chão por inteira.
Socorrida
por alguns cidadãos prestativos ergueu-se tentando manter sua altivez e sorriso
machucado e embaçado pelo tombo. Agradecida segue quase em disparada na direção
do local onde trabalhava. Sacola rasgada,chinelos na mão,joelhos esfolados e
cabelo desfeito era o verdadeiro quadro da dor e sem a moldura. Poderia ter
quebrado um dos pés ou uma das mãos.Quem sabe um braço. Imagina se tivesse
contundido o rosto.
Sua
chegada na repartição foi um alvoroço. Sua situação gerou as mais diversas
reações. Das tradicionais expressões de espanto até risos contidos giravam em torno da chefe. Entre encontrar
paninhos e água para lavar os machucados, escova para reparar o penteado e
palavras de consolo ouve-se as primeiras palavras de Fiorela.
-
Calma gente. Calma.Vamos manter a calma. Foi só um susto. Ainda bem que
consegui salvar o esmalte das unhas das mãos e pés ! Ainda bem. Nenhum arranhão
no esmalte ! O cabelo se dá um jeito. Vamos voltar ao trabalho.
E
lá se foram todos de volta a rotina.
(Renato Hirtz – 2012 – Lembrança
de um fato real)
Geração do Eu
Interessante
como os conflitos de gerações permanecem ao longo do tempo, mas com
instrumentos diferentes. Houve um tempo que os conflitos de gerações se
originavam pela forma da expressão musical que determinavam os padrões de
comportamento da nova geração. Logo adiante a moda ditava a forma de se rebelar
contra os paradigmas da geração anterior através de roupas extravagantes, uso
dos cabelos cumpridos pelos homens e o uso de entorpecentes. Uma ridicularizava
a outra por seus comportamentos tidos como ultrapassados ou absurdos. Por aí, e
sempre as gerações antecedentes conflitavam com os novos rumos das gerações seguintes.
As duas absorviam com relutância o antigo e o novo.
Estas
influências entre uma e outra geração foram seguindo seus passos e configurando
padrões sociais, políticos e econômicos. A geração Baby Boomers compunha-se
daqueles que traziam em sua conduta a consideração ao próximo, seguidora dos
valores morais, forte civismo, possuidora de religiosidade e apego as tradições
e coletivamente participativa. Surgia logo após a II Guerra Mundial e por todo
o contexto trazia as sequelas do horror do combate bélico. Aí possuir a
característica da fraternidade pós-guerra. Porém com o passar do tempo
tornou-se, aos olhos dos seus descendentes uma geração de caretas,
Com o desenvolvimento tecnológico e
industrial surge a geração X. Preocupada entre tantas outras coisas com a
liberdade do indivíduo, traz consigo o impulso do consumismo diante de tantas
ofertas que se apresentam. O poder de compra é foco. E para tal o dinheiro é
buscado de forma compulsiva. Com ele vem à preocupação com o brilho de sua
imagem social e, por conseguinte alcançar a fama diante do contexto onde está
inserido. Há um afastamento dos valores da geração Baby Boomers. Alguns
estudiosos falam da geração “do umbigo”. Cada um engajado em suas perspectivas
afastando-se do coletivo. O que mais importa é obter muito dinheiro, muitas
vezes sem preocupações com a forma, para obter os prazeres da tecnologia. Há
uma nítida desilusão com a forma de encarar o mundo da geração anterior. A
preocupação com os outros e vista como uma forma ultrapassada originando uma
decepção ao sentir que àquele também está usando-o para ultrapassá-lo em seus
objetivos.
A geração Milennials (geração Y) tem
em suas mãos o processo tecnológico muito mais acelerado colocando a sua
disposição recursos e ferramentas incrivelmente produtivas e prazerosas. Os
valores externos são muito mais importantes do que os valores internos, não
importando mais os enfadonhos discursos sobre moral, sentimentos e filosofias
de vida e religiosidade. Embora, se estes discursos servirem para obter uma
situação financeira melhor poderá ser seguido até por ali. A desconfiança passa
a ser um dos focos do comportamento. O sujeito que está ao meu lado é ou não é
meu algoz? Ou quem sabe será ou não o meu algoz para obter minha situação
financeira, meu cargo ou posição social? As relações se estabelecem como um
contrato onde a unilateralidade da vantagem seja minha. O companheirismo e amizades
se estabelecem por conveniências da manutenção do status, no mínimo, ou na
busca da ascensão seja ela qual for. Ganhar dinheiro é o objetivo.
Nos dias atuais o consumismo é
crescente por consequência da agressiva e massiva influência dos meios de
comunicação. De toda a ordem novos produtos e formas de manter a imagem, status
e tudo mais são lançados diariamente no mercado. A individualidade que foi
determinada pela internet e por todo o seu contexto provoca a solidão produtiva
e benéfica. Somos parte de grupos virtualmente. As amizades e as relações
passam a ser exercidas através de redes sociais. Num paradoxo, somos um grupo
formado por uma cadeira, telas e teclados que interagem com o mundo lá fora. Eu
aqui e os outros individualmente lá fora. É a geração Generation Me. Aquela do
“faça você mesmo”. Ela absorve esta nova juventude que nasceu junto ao
computador e sob o domínio da tecnologia. E para isto é necessário ganhar muito
dinheiro em detrimento de todo o resto. Ela passa a descrer das instituições,
das autoridades, do sentido de família, de regras e leis. A crença é em si mesmo.
Nada mais é relevante do que o “eu próprio” que tenho acesso a tudo e a todos
muito mais do que qualquer outro. As gerações passadas e seus preceitos básicos
são ridículos e ultrapassados. O mundo é dos Generation Me. Autossuficientes e
incrivelmente adaptados a si mesmo. O mundo é daqueles que não tem modéstia. Se
há equivocados, errados ou incoerentes... são os outros. Sempre os outros. Não
há tempo a perder com divagações. Hiperativo, produtivo e proativo.
Há muitos pontos positivos em todo
este processo? Não podemos negar. E como
será a próxima geração. Melhor ou pior do que esta? Vamos aguardar, solitários, para ver.
Renato Hirtz
Maio/2013
Ler ou não ler, eis a
questão
Às
vezes me pego tamborilando os dedos sobre o teclado. A vontade de escrever um
texto sobre determinado assunto esbarra em um questionamento que teima em
surgir cada vez que isto acontece. Quem vai ler? Quem vai se interessar sobre
aquilo que escrevo? O motivo de tudo isto esbarra numa avantajada muralha de
informações que estão a nosso dispor na internet. A internet veio dinamizar a
troca de informações. É muito rápida a veiculação de notícias, crônicas,
comentários e tantas outras formas de dizer alguma coisa. É óbvio que o volume
é imenso. Em contra partida observa-se que as pessoas estão cada vez mais
saturadas deste volume de informações e trazem sequelas do hábito de não gostar
de ler.
Penso
nos dias de outrora, não de forma melancólica. Longe disto. Lembro-me de como
as comunicações eram realizadas. Você queria se comunicar com um parente, ou
fazia por um gigantesco aparelho telefônico (comparado aos dias de hoje) ou
através de uma carta levada diligentemente por um carteiro. Pior quando o
amigo, parente ou sua amada não possuía o telefone. Cartas que levavam dias
para chegar e esperarmos outros tantos para a resposta. As notícias mais
atualizadas eram do final do dia anterior. O meio mais rápido, na época, era o
rádio. Notícias quentíssimas eram narradas de forma pomposa e sem nenhuma
interatividade possível. O que se poderia fazer era escrever uma carta ou
telefonar para participar de forma tímida com a emissora. Eis novamente os dois
baluartes da comunicação: o telefone e as famosas missivas.
Hoje,
quando abro minha caixa de e-mail aparece uma avalanche de comunicações. São
aqueles que comunicam novos trabalhos científicos realizados, outros que enviam
sugestões de como encarar a vida, os indesejados que ofertam desde jantares até
utilidades para o lar com lucros tentadores e os cheios de humor com piadas
envelhecidas pelo tempo e pela repetição. Há os enviados por amigos que
insistem na sua participação em correntes do bem ou do mal e os absolutamente
fanáticos por este ou aquele partido que tentam, pela repetição, fazerem com
que suas convicções políticas se alterem e você se filie e levante a bandeira
política dele. Recebo também, e-mail dos inventores de notícias que vem
trazendo a última que aconteceu com um famoso e completa com uma foto montagem
feita no Photoshop. E no final observa que a fonte da informação é extremamente
segura. E por aí vai.
E
nas redes sociais a coisa pega. É uma fonte riquíssima para estudos profundos
de psicologia, sociologia e antropologia. Chegaria ao ponto de dizer que
psiquiatras usam destas redes sociais para fazer análises gratificantes do
comportamento humano e suas mazelas. Ali se acha de tudo. E os mais frenéticos
“rede socialistas” não medem esforços para que sejam lidas e curtidas suas
informações. Claro, bloqueamos os indesejados nas redes sociais e nos contatos
de e-mail, assim como aqueles que seguimos no twitter. Não somos masoquistas ao
ponto de suportar com prazer informações de origem descabida ou sem conteúdo.
Com
tudo isto, volta a minha indagação inicial. Escrevo? E quem vai ler. Assim como
eu não tenho todo o tempo do mundo para assimilar este volume de informações e
passo batido por cima de muita coisa... quantos não fazem o mesmo. Por uma
série de motivos as pessoas não suportam mais explicações detalhadas ou textos
medianamente longos. No cotidiano, até por ser professor, quando vou explicar
alguma escuto com frequência a expressão: “resume”. Um aviso com mais de 3
linhas não é de todo lido. A informação tem que ser rápida e com isto o
conhecimento se torna cada vez mais superficial para a grande maioria.
Se
você chegou até... que bom. Você ainda tem paciência para ler e não aderiu à
nova moda: “resume”.
Renato Hirtz
Maio/2013
Síndromes do século 21
Interessante
observar alguns posicionamentos das pessoas diante de situações em suas relações
interpessoais. As atitudes tomadas mudam a cada tempo e elas se deixam envolver
por verdadeiros modismos que pensam facilitar o convívio na sua vida particular
ou profissional. Ao contrário, provocam improdutividade, conflitos e tornam-se
indivíduos intragáveis ao trato e a beira do ridículo. Até por que trazem em sua
bagagem certo grau de incompetência e frustrações pessoais e transfere isto
aqueles que inevitavelmente tenham que conviver com elas. Na realidade
tornam-se soberbamente insuportáveis quando portadoras destas síndromes da
moda.
Uma das “disfunções”
a que me refiro é a Síndrome do Noé. Esta enfermidade atinge aqueles que adoram
passar suas responsabilidades ou até mesmo seu alto grau de má vontade para a
pessoa mais próxima ou àquele seu desafeto na organização em que desenvolve
suas atividades. Nunca nada que é questionado ou solicitado é de competência
dele (até por que não há possui). Sempre o assunto ou a resolução de um
problema é com o próximo. Aliás, ele adora o próximo na medida em que este se
ferra trabalhando mais do que ele. A sua expressão é característica e
diagnostica sua doença ao ter na ponta da língua a expressão “no é cumigo”. O
cidadão entra numa repartição e faz uma saudação de bom dia e ela salta do seu
lugar dizendo “no é cumigo”. E já trata de indicar com quem devemos contatar. É
o retrato da má vontade faltando apenas um button com as iniciais MV. Leia-se
Má Vontade. O pior quando perde seu tempo argumentando um rol de justificativas
do seu impedimento em atender ao solicitante. A justificativa mais expressiva é
estar extremamente atarefada e com um descabido acúmulo de trabalho.
Outra terrível mal
que vem crescendo assustadoramente é a Síndrome da Gabriela. Os sintomas levam
a recordação da letra da música que diz “eu nasci assim, eu cresci assim...” É
o ícone da falta de estrutura emocional e da má educação. A pessoa em seu
delírio se diz autêntica, de personalidade forte, verdadeira e que diz aquilo
que pensa. Devemos suportar todos os seus desmandos verbais de forma pacífica e
até pedir desculpas quando ousamos levá-la ao entendimento de que certa atitude
não foi a mais correta para determinado momento. “Eu sou assim, sempre fui
assim direta, franca e digo o que penso”. E ela tem seus defensores que chegam
até nós contemporizando que devemos entender as pessoas, pois a fulana é
daquele jeito. Argumentam que ela necessita de entendimento, de paciência e que
esta característica é difícil de alterar. E nós? Onde vamos buscar um
tratamento para exorcizar sérias crises que ela provoca com sua conduta? Precisamos
ao contrário delas ter um alto grau de paciência e educação para conviver com
estes enfermos que veem a impossibilidade de mudar ou no mínimo possuir a
sensibilidade no trato com aqueles que convivem. A convivência se estabelece
para que possamos evoluir e a evolução deve ser sempre para melhor. Caso contrário
é deletéria.
“Alguém me disse”
é outra síndrome que afeta grande parte das pessoas. Ela possui outros nomes
vulgares como “Me contaram” ou “Fiquei sabendo”. É extremamente maligna e surge
em momentos impróprios de nossa rotina diária. O portador deste mal gosta de
conversar em corredores e locais ermos de uma repartição. Normalmente não gosta
de muita gente ao seu redor. Sua preferência é pelos sugestionáveis colegas e
amigos. Ele dispara suas frases “alguém me disse que a fulana... não sei se é
verdade...” e sai estrategicamente. A semente da maldade está plantada. Pronto.
Orgasticamente satisfeito aguarda a confusão ser formada. Caso venha a ser
inquirido por terceiros ou envolvidos de onde ele tirou seu dito usa
descaradamente a frase inicial “alguém me disse... não lembro quem...”. Pior é
quando introduz no orifício anal de quem nada tem haver com o caso a origem de
sua informação descabida. Infelizmente não assume nunca o que diz e sempre joga
a confusão armada no colo de um terceiro.
Existem muitas
outras síndromes nas relações interpessoais. Para não alongar muito o comentário
vamos a mais uma. Esta é a que provoca os maiores entraves na modernização,
produtividade e resultados positivos. É a denominada de “sim tá bom”. Outros
nomes a identificam: “sempre foi assim”, “decha sim”. O enfermo tem uma
insustentável incapacidade de aderir ao novo. Detesta transformações, alteração
ou inovações. Primeiro por que tem certo nível de dificuldade para aprender e
utilizar novas tecnologias. Segundo possui um apavorante medo de que estas
alterações lhe acarretaram um saldo maior de trabalho. Os colegas tem que
suportar sua morosidade tanto intelectual como produtiva. O que poderia ser
realizado em minutos ele leva horas com sua caneta esferográfica, lápis preto nº
2, uma borracha e papel carbono. Este é seu kit de trabalho. Até mesmo uma
modificação do layout no escritório lhe provoca de náuseas a uma inquietação
que chega as raias de uma crise de pânico.
E assim vamos nós
entre trancos e barrancos aguentando estes enfermos com os quais temos que
conviver e pior, possuem plena certeza que fazemos parte de um grupo de desumanos
que não possuem as mínimas condições de viver em sociedade.
Renato Hirtz - janeiro de 2013
Pedagogia e Andragogia – qual a diferença?

O que há de novo nesta área de atuação é o tipo de
indivíduo que vai participar do processo educacional. Tradicionalmente a
pedagogia, como vimos, tinha seu foco na criança. A aprendizagem então segundo Knowles, seguia um modelo padronizado. Todo o processo era
de responsabilidade do professor para as decisões sobre o que será ensinado,
como será ensinado e se foi aprendido. É a educação dirigida pelo professor,
deixando para o aprendiz apenas o papel de submissão às suas instruções. E o
pedagogo tinha muito mais um papel de supervisor do que estava sendo ou não
cumprido, do que qualquer outra coisa. Existiam mecanismos e posicionamentos
quase que inflexíveis por parte dos educadores em relação ao seu pupilo. Acreditava
a pedagogia, ser a educação centrada no professor e da responsabilidade dele o
que deveria ser aprendido pelo educando. Isto ocorria devido a uma visão antiga
de que o aluno chegava à escola muito inexperiente e sem bagagem de conhecimentos.
Não se abria espaço para a criança ou o adolescente contribuir com sua parcela
na construção de seu próprio conhecimento. Os programas ou conteúdos
curriculares eram inflexíveis e uniformes. Ele era tratado como um ser passivo
que deveria aprender aquilo que era estabelecido pelo seu educador.
Segundo
Malcolm Knowles, a pedagogia era focada em aspectos que tornavam a
educação “envelopada”. Malcolm considera para uma analise do processo
pedagógico fatores como: a
necessidade de conhecer, autoconceito
do aprendiz, o papel da experiência, prontidão para aprender, orientação para
aprendizagem e a motivação. Quanto à necessidade de conhecer os educandos necessitam
saber somente o que o professor tem a ensinar, se quiserem a aprovação. Como
aplicarão estes conteúdos na sua vida futura não era levado em conta. O conceito
do professor sobre o aprendiz é o de uma pessoa dependente que necessitava ser “adestrada”.
Este era o autoconceito, um ser dependente. A experiência do aprendiz não era
levada em consideração. Não havia significado para sua aprendizagem. O que era
levado em conta era o conteúdo que o professor transmitia e o que estava
escrito nos livros. Daí a imperiosa necessidade das técnicas de repetição, memorização,
leituras, dever de casa e tudo o mais que levasse o aluno a decorar as
informações transmitidas. Nisto tudo se concentrava a metodologia da aprendizagem
ou pedagógica. Ou o aluno aprendia o que lhe era transmitido ou era retido no
seu nível até apresentar a capacidade de promoção, isto por que a orientação
para a aprendizagem se baseava em numa estruturação padrão de conteúdos programados
ou programáticos dentro do planejamento pedagógico. A lógica que acompanhava a
distribuição dos conteúdos era a da visão pedagógica da época e a motivação do
alunado partia da obrigatoriedade de alcançar uma média padrão obtida através
de provas, testes, trabalhos e exercícios de repetição.
Ainda se encontra, em muitas
instituições de ensino nos mais diversos níveis estruturas, planejamentos e
professores que se utilizam desta prática educacional para realizar a
escolarização de seus alunos. O mais impressionante, ainda nos dias atuais, é
encontrar profissionais da educação em ambiente acadêmico que pauta seu
exercício profissional nesta linha de pensamento. Ele é o ator principal e os
seus alunos desempenham o papel de coadjuvante. Nestas últimas décadas grandes
mudanças houve na visão de um processo educacional (ou pedagógico) mais
democrático. Democrático no sentido de que a dinâmica pedagógica deve ser uma
via de duas mãos. Aquele que ensina também aprende com seu s pupilos. Já vai
longe (findou em 1968) a imagem do professor catedrático que tinha o saber e a
verdade em suas mãos como algo findo. A educação evolui muito com o surgimento
de novos teóricos.Ao mesmo tempo há uma incompreensão na aplicabilidade destas
novas teorias. Se junta a isto o descaso do poder público no investimento e
adequação as novas tecnologias e processos educacionais. Soma-se, enfim, a tudo
isto a desvalorização do magistério como um todo.
Com
as novas visões de mundo, a necessidade de especialização profissional com o
objetivo de melhores salários e condições de vida o educando começaram a
transformar as suas características. As turmas, em sala de aula, já não
mantinham o antigo padrão de faixa etária. Cai por terra a relação entre faixa
etária e nível de aprendizagem. Os mais velhos, que não tiveram oportunidade de
aprender na “época devida” retornam a sala de aula. Muda o padrão da antiga
escola. Na mesma turma várias faixas etárias, objetivos diferenciados e bagagem
de experiências diferenciadas. Há uma enorme distancia, conforme os aspectos
levantados por Knowles, entre uma criança que inicia sua
alfabetização, o jovem que está no ensino médio e o adulto que irá se
alfabetizar ou terminar seus estudos. Os aspectos psicológicos, sociais e
individuais são extremamente diferentes. Obvio que as propostas de vida de uma
criança, jovem e o adulto são muito diferenciadas. E o professor continua sendo
o mesmo e as escolas com sistemas de ensino com as mesmas técnicas, dinâmicas e
pressupostos para as diferentes faixas etárias.
Surge então, a Andragogia (do
grego: andros - adulto e gogos - educar). É um caminho educacional que busca
compreender o adulto.
É a arte ou ciência de orientar adultos a aprender (definição creditada a Malcolm Knowles, anos 1970). Usa-se
este vocábulo para designar a educação voltada para o adulto, em contraposição
à pedagogia, que se refere à educação de crianças.
Esta nova forma de educar vem provocar uma nova visão do processo educacional.
KNOWLES, 1970 definiu este novo caminho como “a arte e ciência de orientar
adultos a aprender”. Há uma reviravolta nos conceitos educacionais e inicia-se
o processo da construção do próprio conhecimento, respeitando as
individualidades dos alunos, suas experiências de vida pré-escolar e durante
seu processo de escolarização. O professor passa a ser um orientador, moderador
ou tutor da construção do conhecimento de seu pupilo. CONNER, 1997 diz que a
Andragogia veio oferecer uma nova alternativa para pedagogia e refere-se à
aprendizagem em qualquer idade focada no estudante e não no professor. É o
aprender fazendo. Professor e aluno passam a ter uma responsabilidade
compartilhada na aprendizagem. Pierre Fourter (1973), diz que esta alternativa é um
conceito amplo de educação do ser humano, em qualquer idade.
Eduard Lindeman (1926) identificou pontos-chave para a educação de
adultos, mais tarde transformaram-se em suporte de pesquisas. Hoje são fundamentos
da moderna teoria da aprendizagem de adulto. “A orientação de aprendizagem do
adulto está centrada na vida; por isto as unidades apropriadas para se
organizar seu programa de aprendizagem são as situações de vida e não
disciplinas. A experiência é a mais rica fonte para o adulto aprender; por
isto, o centro da metodologia da educação do adulto é a análise das
experiências”.Cavalcante (1999) estabelece as diferenças entre a Pedagogia e a
Andragogia.Segundo ele, na Pedagogia os
objetivos são definidos e formulados pelo professor. Já na Andragogia os
objetivos são negociados com a participação livre e crítica do estudante. Vale
ressaltar que pedagogia e andragogia não se apresentam como formas antagônicas
de ensino e sim como práticas complementares (SILVA: 2004). Na verdade as duas
concentram-se na a arte e ciência de ensinar e conduzir as pessoas tenham elas
a idade que for.
RenatoHirtz
Dezembro 2012
Da informação ao conhecimento
Muitas vezes questionei a
diferença entre uma pessoa bem informada de outra que possui conhecimento.
Já encontrei pela minha trajetória de vida muitas bem informadas e que não
possuíam nenhuma habilidade no manejo destas informações. Outras apresentavam
uma capacidade de desempenho em determinadas funções sem ter quase nada de
informações sobre aquilo que estavam fazendo.
Há poucos dias li um artigo
publicado na Harvard Business Review onde Davenport
definiu conhecimento como a informação interagindo com 4 fatores importantes: a
experiência, o contexto, a interpretação e a reflexão. Estes combinados entre
si resultam na utilização da informação para que possamos agir tomando decisões
produtivas em nossas vidas. É improdutivo termos uma grande quantidade de
informações sejam elas específicas ou genéricas se não obtivermos um produto
seja ele econômica ou socialmente aproveitável. Em resumo, a informação deve
ser vivenciada para gerar conhecimento. Ela vem estruturada como pequenos
blocos e muitas vezes embutidas de sutis sugestões ou manipulações conforme as
tendências da fonte de origem. São dados inertes e só produzem efeito quando
manipuladas e interpretadas. Foray enuncia que “o conhecimento é uma questão de
capacidade cognitiva”. E capacidade cognitiva envolve os 4 fatores citados
anteriormente. Outro aspecto interessante que distingue um de outro é sua forma
de aquisição. A informação é adquirida a um custo muito próximo do zero.
Raramente requer um esforço maior do que a leitura de um jornal assistir um
programa de televisão ou uma palestra. Por mais interessante que seja nos
embute na mete dados inertes. Já o conhecimento é gerado, produzido por vias
mais complexas, como já vimos. Há um esforço relevante que envolve esta
construção. E pior, este intricado processo de construção de um conhecimento é
extremamente difícil de ser comunicado a outros. Esta passagem quase inexiste.
Cada um tem que passar pelos fatores envolventes que, sendo repetitivo, são a
experiência, o contexto, a interpretação e a reflexão.
Aí relembro meus saudosos dias
de professor e minhas leituras atuais sobre a Educação (prefiro falar em
Escolarização) e as ideias ditas inovadoras sobre ela. Percebo que continuamos
insistindo na relação professor/aluno. Um ensina e o outro aprende. O que
ensina ou tenta repassar informações ou conhecimento. O outro deve mostrar que
possui capacidade de acumular informações ou reproduzir teoricamente o
conhecimento. Na verdade o caminho é a construção do conhecimento. Ela é
individual, sem tempo determinado e dentro de um contexto que engloba as
relações interpessoais, com objetivos comuns. É necessário a vivencia na
prática a partir de informações fornecidas ou buscadas nos mais diversos
veículos midiáticos. È imprescindível direcionar esta construção do
conhecimento para comunidades afins dos mesmos interesses práticos.
Renato Hirtz
Novembro de 2012
Fonte da imagem:
Casamento romântico

Renato Hirtz
Outubro de 2012.
Mito
da Caverna e a possibilidade de vivermos uma realidade
simulada
Tentei
recordar o nome de um livro que li em minha juventude, mas a memória não me
ajudou. Era um conto de ficção onde o autor desenvolvia a sua história em torno
de um mundo controlado por uma grande máquina. Ela gerenciava desde as
condições atmosféricas para a possibilidade da existência e continuidade da
vida até o comportamento humano. Tudo era comandado por este potente artefato
com inteligência. O layout do ambiente, a formação e informações que cada ser
vivente deveria trazer ao nascer e por aí ia se formando a história deste
mundo. E todo o complexo funcionava sem a percepção da programação que se
desenvolvia, haja vista que os indivíduos vinham com diferentes níveis de
raciocínio e com limites previamente estabelecidos.
Não
vou contar o livro todo. O fato interessante está nos acontecimentos
programados para reequilibrar o sistema e evitar danos à programação. As
guerras, as doenças, a violência e tudo mais eram intrigantes interferências
que colocavam em perigo o funcionamento correto do esquema estabelecido. Era
necessário eliminar estas interferências fossem eliminadas. Eram inseridas
pequenas ações de correção. Espécies eram extintas, populações eliminadas e
tantos outros comandos com objetivo de equilibrar todo o processo e mantê-lo
funcional.
O
que me fez lembrar isto foi a leitura poucos dias atrás das pesquisas
realizadas no campo da física quântica. Dentro destas pesquisas uma delas se
refere à possibilidade de vivermos uma realidade simulada. Tal qual o livro que
citei antes, a maioria das pessoas e de estudiosos das diversas áreas do
conhecimento humano se referem a isto como um delírio da ficção científica ou
como uma blasfêmia contra todos os dogmas religiosos. Imaginem o universo, o nosso mundo e nós,
seres racionais dotados de inteligência resultados de um complexo sistema que
determina toda a nossa realidade ou quem sabe a nossa irrealidade.
Um
grupo de pesquisadores da Universidade de Bonn, na Alemanha, desenvolveu um
método para identificar se o mundo que percebemos é mesmo real. Os cientistas
liderados por Silas Beane, da Universidade de Bonn na Alemanha são os
revolucionários que acreditam na tese de que o nosso universo pode ser uma simulação
numérica feita em um computador insanamente poderoso. Ele
parte,entre outros estudos das teorias de dois filósofos importantes: Platão e
Descartes.O primeiro,com sua criação do Mito da Caverna (onde nosso mundo seria
uma projeção de um mundo perfeito ) e o segundo pela sua citação de que tudo
que a gente vê e sente poderiam ser sensações criadas por um ser.Juntando tudo isto ao conhecimentos da física quântica
tenta provar ( ou não ) que fazemos parte de um mundo simulado.
Não
vou entrar na intricada explicação da teoria da cromodinâmica quântica (TCQ), de
nanos, mícron, quarks e glúons. Deixo para os físicos,pois não é minha área.Meu
objetivo é fazer as pessoas refletirem sobre muitos acontecimentos de nossas
vidas que parecem programados.Há até expressões que usamos cotidianamente como “tinha
que acontecer assim”.Quem sabe lá os acontecimentos que estão ocorrendo, a
maioria inacreditáveis, seja na área do comportamento humano ou as grandes
catástrofes não sejam erros nos comando da programação da matriz? Poderia levar
este devaneio a acreditar que os desvios de conduta do homem sejam
interferências virais alterando comandos e resultados? Ou, a história do final
do mundo tão falada seja um processo de reformulação do sistema e dos softwares
eliminando arquivos mal intencionados, dados nocivos e elementos que não estão
respondendo e correspondendo a programação estabelecida pela matriz.
Deixo
mais uma questão para reflexão. Quem será o programador desta realidade simulada?
Quem será o controlador deste universo que pode ser uma simulação numérica feita em um inacreditável computador potentíssimo? E nós,
seríamos as estações ou terminais que deveriam manter o controle do mundo em que
vivemos e estaríamos falhando?
Leia mais em:
Os caminhos ou
trilhas pedagógicas
Na minha
caminhada como profissional da educação sempre argumentei que um planejamento
pedagógico eficiente deveria se basear em projetos interdisciplinares. Estes
projetos deveriam ser instigantes e permear todas as disciplinas, professores,
alunos e a comunidade em que o processo educacional está inserido. Nada mais
produtivo do que a aplicação do antigo e até hoje usado método científico.
É de comum
acordo entre todos os agentes da educação que a curiosidade é a mola propulsora
da aquisição de conhecimento e a inserção da metodologia científica na busca da
formulação de uma resposta a um questionamento leva o educando a palmilhar um
caminho lógico para elaborar sua resposta. Tendo o professor como orientador do
caminho e das alternativas de soluções do problema levantado, vai estimulando o
aluno a buscar nas hipóteses levantadas e na experimentação a avaliação de
resultados baseados na estrutura que a escola disponibiliza para chegar as suas
conclusões.
A descentralização
do poder de aprendizagem leva o professor do papel de transmissor de
conhecimentos para uma posição muito mais atuante de orientador, tal qual uma
bússola que norteia e estimula o aluno a construção de seu conhecimento. O
aluno adquire a posição de um mestre de obras colocando na prática a planta
traçada pelo seu orientador, hoje chamado de tutor educacional. Nada disso terá
o efeito desejado se não houver a interdisciplinaridade e a intersetorialidade
educacional. Ou seja, a escolarização assim realizada deverá ter a participação
de todos os professores, nas suas respectivas disciplinas interagindo e
complementando esta construção. Da mesma forma, todos os setores da escola
devem estar imbuídos desta ação colaborando setorialmente seja de forma presencial
ou digital. Da equipe diretiva que vai planejar as ações, da equipe de
supervisão pedagógica que vai gerenciar o processo, biblioteca, audiovisual,
informática que irá disponibilizar o acesso a redes sociais e internet, e por
aí vamos.
A construção
do conhecimento neste processo necessita de um fechamento. O aluno poderá ser
avaliado de forma globalizada, até por que já vivemos este processo, e não de
forma individual. Isto elimina uma forma indireta de exclusão, onde um aluno
com dificuldades em matemática tivesse uma retenção em determinada série,
apesar de demonstrar conhecimento nas demais disciplinas. Até por que
conhecimento desconhece o processo de subtração.Conhecimento se adiciona na
medida de nossa necessidade. E,por final,o aluno terá uma avaliação final onde
terá que divulgar todo o conhecimento
adquirido. Hoje,chamamos de socialização. Aqui o educando compartilha
seu conhecimento com seus pares e tutores.
Para a grande
maioria dos professores e escolas que já trabalham com projetos trimestrais ou
semestrais isto não é novidade. Têm perfeita noção de que este tipo de
atividade funciona e vai além das expectativas de um prognóstico pedagógico. O
aluno tem a chance de se descobrir e de se superar descobrindo habilidades desconhecidas e o
tutor educacional identificadas estas
habilidades reforçá-las e projetar um mais além.
Trilhas
pedagógicas é o novo nome para esta modalidade conhecida há bastante tempo e
pouco usada, pois há um volume maior de trabalho e de comprometimento no
quadrado que deveria ser perfeito com a descentralização do poder pedagógico e
a intersetorialidade: escola tutor aluno comunidade escolar. “… a cultura
escolar adquire a função de refazer e renomear o mundo e de ensinar os alunos a
interpretar os significados mutáveis com que os indivíduos de diferentes
culturas e tempos históricos dotam a realidade de sentido. Ao mesmo tempo lhes abre as portas para
compreender suas concepções e as de quem os rodeiam.” (Fernando Hernández).
Este refazer
do processo de escolarização, e consequentemente educacional, adquire uma nova
face na interpolação dos recursos físicos tradicionais da instituição (os
jornais, revistas, a aula expositiva ou presencial, as apostilas etc.) e os
recursos tecnológicos baseados nos meios midiáticos (jornal digital, redes
sociais, e-books, sites, blogs, vídeos conferências e outros tantos). Cabe à
escola como instituição de ensino saber gerenciar estes caminhos da construção
do conhecimento (ou do saber), da mesma forma o educador ser o marco orientador
do uso de todas estas ferramentas. Neste ponto, entramos em outro ponto de
discussão que é a necessidade da constante atualização do tutor de ensino para
que não caia junto com seu tutelado nas teclas Ctrl + C e CTRL + V. Ou ainda
pior, transferir os velhos e surrados textos e conteúdos programáticos para
dentro de um banco de dados e dizer que está palmilhando um novo caminho
pedagógico.
(Renato Hirtz – setembro 2012)
Leia mais em:
Fonte da imagem:
Mito
da Caverna e a possibilidade de vivermos uma realidade
simulada
Tentei
recordar o nome de um livro que li em minha juventude, mas a memória não me
ajudou. Era um conto de ficção onde o autor desenvolvia a sua história em torno
de um mundo controlado por uma grande máquina. Ela gerenciava desde as
condições atmosféricas para a possibilidade da existência e continuidade da
vida até o comportamento humano. Tudo era comandado por este potente artefato
com inteligência. O layout do ambiente, a formação e informações que cada ser
vivente deveria trazer ao nascer e por aí ia se formando a história deste
mundo. E todo o complexo funcionava sem a percepção da programação que se
desenvolvia, haja vista que os indivíduos vinham com diferentes níveis de
raciocínio e com limites previamente estabelecidos.
Não
vou contar o livro todo. O fato interessante está nos acontecimentos
programados para reequilibrar o sistema e evitar danos à programação. As
guerras, as doenças, a violência e tudo mais eram intrigantes interferências
que colocavam em perigo o funcionamento correto do esquema estabelecido. Era
necessário eliminar estas interferências fossem eliminadas. Eram inseridas
pequenas ações de correção. Espécies eram extintas, populações eliminadas e
tantos outros comandos com objetivo de equilibrar todo o processo e mantê-lo
funcional.
O
que me fez lembrar isto foi a leitura poucos dias atrás das pesquisas
realizadas no campo da física quântica. Dentro destas pesquisas uma delas se
refere à possibilidade de vivermos uma realidade simulada. Tal qual o livro que
citei antes, a maioria das pessoas e de estudiosos das diversas áreas do
conhecimento humano se referem a isto como um delírio da ficção científica ou
como uma blasfêmia contra todos os dogmas religiosos. Imaginem o universo, o nosso mundo e nós,
seres racionais dotados de inteligência resultados de um complexo sistema que
determina toda a nossa realidade ou quem sabe a nossa irrealidade.
Um
grupo de pesquisadores da Universidade de Bonn, na Alemanha, desenvolveu um
método para identificar se o mundo que percebemos é mesmo real. Os cientistas
liderados por Silas Beane, da Universidade de Bonn na Alemanha são os
revolucionários que acreditam na tese de que o nosso universo pode ser uma simulação
numérica feita em um computador insanamente poderoso. Ele
parte,entre outros estudos das teorias de dois filósofos importantes: Platão e
Descartes.O primeiro,com sua criação do Mito da Caverna (onde nosso mundo seria
uma projeção de um mundo perfeito ) e o segundo pela sua citação de que tudo
que a gente vê e sente poderiam ser sensações criadas por um ser.Juntando tudo isto ao conhecimentos da física quântica
tenta provar ( ou não ) que fazemos parte de um mundo simulado.
Não
vou entrar na intricada explicação da teoria da cromodinâmica quântica (TCQ), de
nanos, mícron, quarks e glúons. Deixo para os físicos,pois não é minha área.Meu
objetivo é fazer as pessoas refletirem sobre muitos acontecimentos de nossas
vidas que parecem programados.Há até expressões que usamos cotidianamente como “tinha
que acontecer assim”.Quem sabe lá os acontecimentos que estão ocorrendo, a
maioria inacreditáveis, seja na área do comportamento humano ou as grandes
catástrofes não sejam erros nos comando da programação da matriz? Poderia levar
este devaneio a acreditar que os desvios de conduta do homem sejam
interferências virais alterando comandos e resultados? Ou, a história do final
do mundo tão falada seja um processo de reformulação do sistema e dos softwares
eliminando arquivos mal intencionados, dados nocivos e elementos que não estão
respondendo e correspondendo a programação estabelecida pela matriz.
Deixo
mais uma questão para reflexão. Quem será o programador desta realidade simulada?
Quem será o controlador deste universo que pode ser uma simulação numérica feita em um inacreditável computador potentíssimo? E nós,
seríamos as estações ou terminais que deveriam manter o controle do mundo em que
vivemos e estaríamos falhando?
Leia mais em:
Os caminhos ou trilhas pedagógicas

Novos rumos do ensino a distância
Quando
deparo com a notícia de que faculdades americanas estão disponibilizando mais
de cem cursos na modalidade de ensino a distância e que estão interessadas em
expandir para o mundo inteiro verdadeiras franquias deste tipo de ensino se faz
necessário uma reflexão sobre isto. Esta nova oferta de educação vem num
crescendo em nosso país e competindo com a tradicional forma presencial.
Lembro
que há mais ou menos uns vinte anos Roger Schank já alertava para a evolução
deste fenômeno definido como nova alternativa educacional tecnológica. Com ela
vem uma avalanche de questões entre prós e contras. Entre eles a validade
técnica dos cursos, os procedimentos de aplicação pedagógica, o envolvimento
administrativo do processo e da conduta discente daqueles que sob o fascínio da
facilidade de obter um diploma optam por esta alternativa. Um computador
conectado a internet, um endereço de e-mail e disciplina para estudar e vencer
módulos para aquisição de conhecimento, ou como gostam os teóricos, construir
seu conhecimento. Trabalhos, provas, aulas presenciais e apresentação de
trabalho final avaliado por seus tutores. Realmente é uma revolução na
educação. Uma das interrogações que
tenho é do objetivo das universidades quanto a implantação e implementação
desta atividade. Óbvio que num sistema capitalista nada se faz sem visar
lucratividade. Não podemos é cair apenas na visão comercial. Toda a instituição
educacional tem seus valores éticos exatamente relacionados aos princípios da
educação. Que assim o façam. Outro aspecto é o processo de mesmice que paira
sobre qualquer processo dito novo em educação. Mudam-se nomes e formas,mas nada
mais há do que a transferência do velho para uma nova capa. Qual a real
transformação que esta nova dinâmica trará através de um sistema de documentos em hipermídia que são
interligados e executados na Internet, a WEB. Não irão transferir conteúdos,
metodologias e técnicas convencionais para uma forma de ensino sem chance
retração ? Claro que não. Certamente as Universidades e instituições de ensino
que não buscarem uma profunda mudança nos seus paradigmas educacionais
elaborando e criando metodologias motivadoras para aquisição do conhecimento e
para o enfrentamento da competitividade deste mercado promissor. A relação
aluno-professor se altera totalmente. O professor passa a ser tutor de um
indivíduo que irá construir seu conhecimento individualmente, sozinho e pelo
seu esforço. Haverá um tripé de relações: o tutor que mostrará caminhos, o
buscador ( aluno ) compilando seu conhecimento e provando resultados e o
computador como uma grande biblioteca atualizada a cada instante a sua
disposição. Será um processo que há muito tempo escuto falarem na teoria: o
aprender fazendo. Não haverá mais aquela relação diária de motivação
professor-aluno. Do outro lado da rede o indivíduo com dificuldades ou não, com
carências ou não terá que produzir e
provar conhecimento. Caem com isto grande quantidade de conceitos e tradições
da educação convencional. Realmente é uma revolução irreversível na educação e
toda a sociedade deve estar preparada. É a mesma mudança que ocorreu nas
relações interpessoais quando surgiu a comunicação digital na velocidade da luz
alterando drasticamente a forma
tradicional. Numa empresa, numa escola e muitas vezes numa residência nos
comunicamos através de e-mail, comunicadores digitais, blogs e outras formas alternativas.
São exatas, sem dubiedade, possuindo registro de data e hora e gravadas. Não há
mais meias palavras. Assim nesta nova modalidade de ensino não haverá meio
conhecimento.
John Dewey (1916) em suas reflexões já comentava a falha nos sistemas
educacionais que debulhavam conhecimento sobre um ser passivo chamado aluno. Sabemos
que as instituições de ensino superior tem sucesso reconhecido quando se dispõe
a utilizar uma metodologia do fazer e aprender. Muitos de meus alunos, ditos
problemáticos, eram ótimos quando realizavam cursos técnicos paralelamente ao
ensino médio. Já vivi a experiência com alunos de curso de ensino médio
concomitantes a curso técnico destacarem-se nas disciplinas técnicas e depois
apresentarem ótimo rendimento nas
disciplinas teóricas. O fazer é motivador e a teoria é um fardo necessário que indubitavelmente
se associa ao conhecimento queiramos ou não. O tradicional faz exatamente o
contrário. Primeiro enfadonha e afasta. Quem sabe não seria mais interessante
iniciar a alfabetização recortando e desenhando letras para depois saber o som
e nome de cada uma ? Muitas vezes já escrevi e outras tantas falei que os
currículos escolares são idealizados como se todos os alunos tivessem um
cérebro, percepção e interesses iguais. Muito se fala no respeito as
diferenças. Isto na teoria. Não se criou ainda um currículo, grade curricular
ou como queiram chamar que possibilite o fazer conhecimento. As instituições de
ensino, seja em que nível for, assim como seus professores terão que apresentar
justificativas muito claras da necessidade do educando aprender determinado
conteúdo. O ensino a distância com toda as suas facilidades para o aluno e como
um novo mercado para as instituições de ensino fatalmente irão alterar
propostas de ensino.
Repito que levar o tradicional para dentro de uma nova
tecnologia que possui um dinamismo numa velocidade incrível é o mesmo que
amassar barro sem nada construir com ele. E as escolas de ensino médio não
podem perder tempo em discussões sem rumo, pois estarão sofrendo o mesmo efeito
desta nova modalidade de ensino. Já estão aí algumas escolas oferecendo a
Educação de Jovens e Adultos via educação a distância. E não esqueçam de se
perguntar por que o aluno não gosta da escola ? Não se esqueçam de perguntar se
teu aluno aprendeu “bastante” para ele ou para o conceito padrão de aprender. E
por fim, por que o sistema ( não gosto de dizer governos,pois é um todo de
interesses) não faz questão que se mude tudo isto ? Há muito ainda que refletirmos sobre esta
inovação avassaladora que é o EAD.
(Renato Hirtz – agosto 2012 )
Fonte da imagem:
Gestor Escolar
Lendo estes dias sobre gestão
escolar veio a imagem de minha primeira diretora. A escola ainda existe em um
município da grande Porto Alegre.Vão-se trinta e tantos anos,quando lá cheguei
recém formado cheio de sonhos e com uma sede de ensinar e aprender. Ainda
estava cursando minha segunda faculdade e me desdobrava entre lecionar em uma
escola particular, esta que era estadual e assistir aulas à noite. Nada de
preocupação com o cansaço. O salário de professor ainda valia o esforço bem
como a profissão era valorizada.
Meu
contato com a diretora desta “escola do interior” foi de respeito e admiração. Sua
altivez não se dava por sua estrutura física e sim pela sua postura como
educadora e administrativa. Haviam prós e contra sua forma de administrar. Fazia
valer o que estava escrito nas orientações contidas na Lei. Chamava a atenção, e
também era motivo de certas críticas feitas a meia boca e aos pés de ouvidos a sua
rotina. Ao chegar na escola recebia no portão junto com o vice dos turnos e cumprimentava
os alunos de forma solene chamando-os pelo nome. Um passar de olhos e já
detectava se havia algum problema com este ou aquele. Um sorriso aos pais que
conduziam seus filhos até lá e o portão era fechado. Conversa rápida com seus
vices-diretores e lá se ia a cozinha. Saboreando um café mantinha uma boa
conversa com as funcionárias. Saía da li e dava mais um tempo de prosa com o
pessoal da secretaria. No caminho controlava as salas de aula. Já era hora do
recreio e lá se ia a pequena sala dos professores. Conversava com um e com
outro. Algum aviso de urgência era dado e se dirigia a sua sala. No turno da
tarde realizava a mesma rotina, com um porém. Não se dirigia a sua sala. Saia
para comparecer aos órgãos competentes.
A
escola ia muito bem se destacando tanto no aproveitamento, na organização, na
integração da comunidade escolar, nos recursos e até um novo prédio foi construído
em sua gestão. A intimidade profissional com aquela diretora foi aumentando com
o passar de um tempo. Certa ocasião, num período vago surgiu uma oportunidade
informal de conversar mais abertamente com ela. Questionei, com certo receio, a
sua rotina na escola. Ali recebi uma lição. Respondeu-me que um administrador
escolar antes de qualquer coisa deveria exercer o papel político escolar. Ao
receber os alunos e pais tinha a oportunidade de dialogar com eles. Ao se
dirigir ao refeitório e conversar com as funcionárias tomava ciência das
necessidades diárias de alunos e professores. Quando chegava a secretária obtinha
conhecimento administrativo e na sala dos professores a solução de pequenos
problemas, junto com sua supervisora, numa conversa informal. Era desta forma
que se inteirava de sua escola, resolvia situações que podiam se avolumar com o
passar do tempo. Na sua sala tinha a oportunidade de programar reuniões, planejar
atividades e atender casos mais complexos. A tarde, fazia a gestão política
indo buscar, nos órgãos competentes, recursos para satisfazer as necessidades
do estabelecimento de ensino do qual era diretora. Quando não conseguia seus
objetivos nesta área buscava parcerias com a iniciativa privada. Meus vices se
encarregam de conduzir a escola e eu de manter e aprimorar as condições para
que todo o trabalho seja levado a termo com produtividade.
Aprendi
com ela que um gestor escolar não necessita ser aquela figura austera e presencial.
A austeridade afasta e sua convivência amiúde com a comunidade escolar a
vulgariza. Ele tem que determinar competências e proporcionar que todo o
processo compartilhado que idealizou (em conjunto com sua comunidade escolar)
chegue a termo e de modo produtivo. Confiança e cobrança de responsabilidades
com sua equipe e valorização de cada ação em separado ou no seu conjunto é ponto
indiscutível. Isto gera motivação para que se aprimore cada vez mais as ações
da prática pedagógica. Aqui lembro de um outro gestor administrativo que
conheci. Ele criou uma forma de agradecer e motivar sua equipe. Através de uma
votação entre a comunidade escolar, na semana do professor, os eleitos como educadores,
pais e alunos destaques recebiam um singelo diploma de honra por seus méritos. Uma
mera atitude que servia de motivação e integração entre todos da comunidade
escolar. Vi muitos colegas refletindo suas ações com esta atividade. Propostas
de mudanças eram discutidas para que no ano seguinte houvesse uma concorrência
mais acirrada sempre com o objetivo de melhoria da qualidade da aprendizagem.
O
gestor escolar deve ser um buscador de soluções, um integrador, um organizador,
aquele que propõe, aceita mudanças, confia e determina ações de modo que toda a
comunidade escolar reflita sobre a prática pedagógica. Indica competências para
a execução do trabalho escolar e define o papel que cada um tem para que a
escola volte a ser um lugar não só de saber, mas também de crescimento social,
pessoal e de cidadania plena. Enfim, ele é um político educacional.
(Renato Hirtz – junho de 2012).
O efeito zapping na Educação
Depois
da geração Y dos anos 70/80 surge a partir dos anos 90 a geração Zapping. Sendo
uma nova forma de entrar em contato com o conhecimento e,por conseqüência
, manter uma relação interpessoal
diferente coloca-se como um desafio não só aos educadores como também ao
mercado de trabalho.
Numa ascensão extraordinária estes
jovens entram em contato com uma enorme facilidade com um uma carga violenta de
informações gerada pelo avanço da tecnologia que reúne de forma inesgotável
conhecimentos muito dinâmicos sobre todos os ramos da atividade humana
inclusive em relação aos seus contatos interpessoais. Alguns estudiosos e
especialistas no assunto tratam esta nova forma de crescimento quase insidioso como um problema complexo de
analisar onde uma avalanche de dados são
colocados diante do alunado ou mesmo de profissionais. Outros comparam esta
condição ao surgimento do iluminismo, do renascimento e de outras tantas
revoluções culturais em que o conhecimento ,antes de domínio restrito,passa a
ser de acesso público.
Explicando melhor, a geração zapping
é aquela cujo berço foi praticamente um computador, com um controle remoto de
TV como brinquedo, cresceu curtindo pequenos aparelhos eletrônicos, descobriu
os games, manipulou muito cedo um celular e teve que aprender a conviver e
dominar o avanço tecnológico voraz e veloz. Eles fazem parte de uma comunidade
que está conectada num turbilhão de informações que se somam numa rapidez
incrível, imediatas e que envolvem o mundo inteiro. Eles são peritos em zappear
informações minuto a minuto. Agem como um fã ardoroso de televisão que alterna
de canais a todo o momento. Na realidade ele está procurando programas que lhe
interessam ou chamem sua atenção.
A
grande preocupação dos pesquisadores, dos educadores e de pessoas envolvidas em
recursos humanos não é a quantidade de informações que este indivíduo entra em contato. A questão é da
forma como estas informações são codificadas e decodificadas. É a maneira como
este indivíduo trabalha e usa destes verdadeiros bancos de dados infinitos de
informações quando entra no game da vida real e tem que produzir dentro do
mercado de trabalho.
Até
a algum tempo, o máximo que tínhamos eram os gravadores, o vídeo - tapes e
algumas formas de reprisar uma informação. Claro, além dos livros que trazem
uma informação estática, na visão dos dias de hoje. A atenção aos noticiários, por
exemplo, deveriam ser acompanhados de muita atenção e anotações para não
perdermos o famoso “fio da meada”. Não havia
muitas alternativas de retomada de informações.Fatos ocorriam e não podiam ser
repetidos. Experiências e transformações não podiam ser reconstituídas. Tudo
isto levava a uma maior concentração diante de novos conhecimentos. Hoje o
conhecimento passa a ser facetado e superficial.O aprofundamento das questões
que envolvem novos conhecimentos são rápidos e focados no imediatismo da
informação. A síntese de muitos dados que se colocam a nossa frente de forma
imediata e simultânea gera um novo tipo de pensar o mundo. É uma forma intensa
e infinita provocando alternâncias de escolhas
que chamam a atenção ou que são mais interessantes. Fragmentadas estes
dados o educando torna-se suscetível aos apelos da globalização, zappeando ,por
conseqüência para aquilo que lhe é satisfatório. Desta forma traz para suas
relações pessoais o mesmo efeito do zapping. Ao se colocarem diante de uma
situação problema, algo desinteressante ou não apaixonante partem em busca em busca de outra
informação mais interessante. Partem do princípio de que podem tudo e de tudo
se livrar ao simples toque de um botão ou de uma tecla. Na escolha da profissão,
no mercado de trabalho e nas suas relações amorosas, inconscientemente, ocorre às
mesmas coisas. Tornou-se desinteressante certamentente ocorrerá uma troca de
canal.
E
como lidar com tudo isto? Voltamos a bater na mesma tecla. O acompanhamento
familiar. Tomar contato com toda a tecnologia é importantíssimo, mas regrar o
uso e a forma como, principalmente a internet pé usada é de importância
vital.Isto dá trabalho, mas a educação começa no primeiro ano de vida. Os pais
devem analisar com que profundidade e entendimento seus filhos estão usando
todo este manancial da Internet. Não devem deixa-la como babá de seus pimpolhos
como foi a TV nas gerações anteriores. Mesmo com todo o avanço não podemos
esquecer que esta geração Z inicia sua história de vida com fragilidade de
conhecimento e de discernimento do certo e do errado. Do real e irreal.Esta
geração é impelida a estabelecer relações interpessoais com um grande número de
“amigos”, de “seguidores” e de “fãs” pois participam das redes sociais desde
muito novinhos. Há vantagens e desvantagens neste processo. A vantagem é saber
lidar com as diferenças e divergências. Um fator nocivo é que introspectam a capacidade
de livrar-se, de bloquear ou eliminar o grupo, tribo ou contato como num passe
de mágica se estes não apresentarem mais interesse ou deixarem ser coniventes
com seus princípios .Perdem rapidamente a ideologia familiar ou a adquirem uma
ideologia de grupo. Nem sempre estes grupos são tão interessantes ou produtivos
para a sociedade. Passam a pensar como coletivo e muitas vezes perdem sua
individualidade.É papel dos pais iniciar todo um trabalho de conscientização
dos valores individuais e coletivos já na primeira infância, do direito de sua
individualidade, da participação em grupos e ter seguidores produtivos. A
continuidade deste processo se dará na escola que através da escolarização e da
educação deste indivíduo, pois educação é um processo de construção. O
professor não tem uma varinha mágica para descobrir as potencialidades
existentes no adolescente. Pais e educandos esperam da escola aquilo o mesmo
efeito Zapping quando deixam sob a responsabilidade da instituição de ensino expectativas
uma solução rápida, imediata e idealizada por eles para seu filho. Os educando
devem pensar seriamente sobre esta nova forma de aquisição de conhecimento e
como lidar produtivamente com ele para auxiliar o educando na descoberta de sua
identidade, de suas habilidades, seus gostos e suas preferências. Deve ensinar
que na vida sempre há escolhas e que não podemos fazer zapping de todas as
situações que nos incomodam. Pais e escola diante de tantas opções inebriantes
devem buscar formas para seus pupilos entenderem que a frustração é algo
inerente ao seu caminhar pela vida.
Muito antes do
conteúdo (ele está ao alcance de suas mãos, já falamos) o educando necessita orientações
e técnicas para aprofundar o entendimento deste mundo de informações e, a
saber, lidar com situações problemas que se apresentarão quando ultrapassar os
portões de sua escola.
(Renato Hirtz – junho de
2012)
Gestar
Revendo “meus
guardados” encontrei todo o material de um projeto que desenvolvi em uma escola
que trabalhei, em Porto
Alegre.
Sou
adepto convicto da educação por projetos e por compartilhamento de informações
e experiências. Este tipo de atividade agrega valor ao conhecimento e
desenvolve a capacidade do indivíduo de saber transitar de forma mais adequada
nas suas relações interdisciplinares.
Dentro de minha escola, além de
exercer minhas funções como professor, e por uma série de acontecimentos particulares
me propus a ir mais além. Contribuir com algo mais. Uma boa parte de nossos
alunos apresentava problemas característicos da adolescência ou da idade madura
que prejudicavam sua autoestima,principalmente. O Serviço de Orientação
Educacional com um único profissional para atender a mais de mil alunos não
tinha outra forma do que ater-se aos casos mais complicados. Saí em busca de
material que me subsidiasse para colocar em prática um projeto que auxiliasse
nossos alunos. Adaptei várias técnicas de grupos de autoajuda e idealizei o que
chamei de Gestar (Grupo de Estudo e AutoAjuda Renovação). Com apoio da Direção
da Escola,numa das salas de
aula,iniciamos as atividades do grupo.
No início, ainda sem
credibilidade, com um grupo reduzido, mas assíduo, começamos as reuniões. Ao
longo de dois anos de existência o “grupo” se manteve forte. Com uma
assiduidade variável ( dependendo do estado de espírito de cada um ) obteve
resultados muito positivos direta ou indiretamente. Notoriamente a mudança de
comportamento dos participantes diante de seus problemas do dia-a-dia
estabeleceu a certeza de que esta atividade era produtiva.
Com o objetivo de oportunizar e
promover em cada participante a autoestima, a autovalorização, a descoberta de
suas potencialidades e de suas falhas como indivíduo, com a idéia firme de que
devemos “viver só por hoje realizando tudo com a maior perfeição como se tudo
isto dependesse a continuidade da minha vida amanhã.”. Foi estabelecido um
código de postura rígido (para os participantes e visitantes) e procedimentos
para realizar as reuniões. O “grupo” se encontrava uma vez por semana, numa
atividade que durava não mais de duas horas de atividade. Ao final de cada
reunião sem eles sentirem criava-se numa
verdadeira integração familiar. Um passava a tutelar as ações do outro ao longo
da semana.
Já encontrei muito deles.
Hoje,com família constituída e profissão definida seguem sua vida e guardam na
memória nossas reuniões. Isto vem mostrar que muito mais do que grandes
transformações na educação, radicais mudanças de currículo e coisas do gênero
não trazem efeitos tão desejados. O aluno do ensino médio,principalmente, quer
aprender. Ele quer aprender a viver, a resolver os problemas que lhe incomodam,
a livrar-se de suas angústias e ter entendimento do seu momento de vida.
Escolarizar se torna muito mais fácil quando tudo isto fica sob controle do
jovem. Nós somos assim, mesmo com toda a experiência acumulada.
É muito difícil trabalhar com o
aluno, até mesmo de nível superior que está numa transição tentando adquirir
uma identidade seja como pessoa ou como profissional. O processo educacional
que deveria ser iniciado em casa, desde o berço, chega a escola sem o
embasamento familiar. Há todo um contexto onde família, escola, educador e educando
se vêem envolvidos. É o famoso efeito “zapping”. Tudo deve ser muito rápido.
Todos os processos são executados de forma imediatista e simultânea sem
detalhadas explicações, sem muita orientação e com pouca conversa. O que
importa é o resultado e não interessa quem gerará este resultado. Como
conseqüência a instituição educacional fica diante de indivíduos com educação e
cultura (não me refiro a escolarização) aquém do exigido para o nível de ensino que estivermos
considerando.(Renato Hirtz – maio 2012).
P.S.: Grande abraço à Andréia
Tais Fonseca, Alexandre Brandão, Anahy de Vargas Ribeiro, Fábio Augusto Alves
Barbosa, Fernanda Glinka, Márcia Greff Demétrio, Mirele Rosa dos Quadros,
Vanderley Silva Rodrigues, Vanessa Casanova Silveira, Vanessa de Souza,
Vinícius dos Santos Estima. Este grupo ajudou a levar em frente o projeto acima
descrito.
Fomos esquecidos
Com o passar do tempo muitas
coisas boas que ocorriam ao longo das atividades escolares foram se perdendo. Se
hoje dizemos que a escola tem autonomia administrativa-pedagógia para deliberar
sobre seus rumos, porém antes havia mais opções de projetos para serem desenvolvidos.
Os governos da época proporcionavam oportunidades para os professores se
atualizarem e implementavam projetos interessantes para serem desencadeados com
alunos e que produziam relevantes resultados.
Lembro
que havia períodos de atualização para professores. Havia, na minha área de atuação,
por exemplo, os Programas de Saúde. Profissionais da área ao longo de uma
semana ministravam os encontros. Outro era o de Prevenção ao Uso e Combate as
Drogas, Prevenção de Acidentes e Primeiros Socorros na Escola. Outros tantos
que eu e meus colegas tivemos a oportunidade de realizar com profissionais
especializados. Por outro lado, as Feiras de Ciências, as Patrulhas do Verde, as
Hortas Escolares. Nas outras áreas do ensino acontecia o mesmo. O Clube
Literário, Clube de Línguas Estrangeiras e muitos outros. Atividades nas quais
os alunos se viam envolvidos e os governos davam relativo incentivo.
Em
uma das escolas que trabalhei tínhamos a Semana Cultural onde os estudantes
apresentavam trabalhos livres sobre os conteúdos desenvolvidos e figuras
ilustres eram convidadas a participarem. A Feira do Livro era uma semana
badalada na escola Os alunos trabalhavam autores, entravam em contato com
editoras, com escritores e tudo isto contribuía para desenvolver o senso de iniciativa
do aluno (o que os tornavam proativos) e proporcionar educação e cultura, além
de uma boa escolarização. Em uma Coordenadoria de Educação onde exerci função
pedagógica conseguimos, por 3 anos consecutivos, manter um Festival Estudantil
da Canção Crioula buscando parcerias com iniciativas privadas e mantenedora. Conseguimos
reunir na última mais de uma centena de inscrições de alunos da costa doce e
região carbonífera. Foi inesquecível ver alunos realizando lidas campeiras e
apresentando suas canções próprias. Foi um aprendizado extremamente produtivo
em todos os sentidos. Poderia ficar aqui relatando dezenas de atividades com as
quais eu e tanto outro profissional da educação teve a oportunidade de participar.
Estou
relatando tudo isto para dizer que nós professores fomos esquecidos pelos governos.
Não vou citar nenhum, pois este não é o objetivo a que me proponho. Tínhamos 44
horas semanais onde 4 horas nós podíamos nos dedicar a uma atualização, a
elaborar uma atividade, criar um projeto ou narrar aos nossos pares
experiências de erros e acertos que tínhamos obtido. Veio depois às 40 horas, das
quais 4 horas eram de estudos. Nós nos encontrávamos, nem que fosse para “falar
da vida dos alunos”. Além da escolarização, nossa preocupação era com a
educação do aluno. Fomos carregando nosso fardo de responsabilidades com as
quais fazíamos parcerias. E viramos titulares destas responsabilidades. E quanto
mais nosso fardo se abarrotava de responsabilidades que eram dos pais, da
sociedade, da mantenedora ou dos governos mais sozinhos e esquecidos ficávamos.
Foram nos impondo de forma maquiavélica a titularidade destas novas funções. E
chegamos ao ponto de trabalhar mais de 40 horas, não em uma só escola e sim num
ir e vir entre várias escolas para garantir a sobrevivência na carreira. Somos
teimosos, solitários e esquecidos como profissionais que gostam de ler, de
estudar, de saber mais, de ir além de seus limites. Quem nos oportuniza isto?
Quem deveria nos oportunizar isto.
Hoje
nos imputam a culpa de todas as mazelas na educação. A visão de governo, da
comunidade e dos alunos é uma linguagem binária. Ou o professor é acomodado e
finge que ensina, ou ele é um general que exige demasiadamente do aluno. Os
pais na sua omissão vêem nos professores a salvação ou a derrocada educacional
do filho. O governo na sua visão míope nos vê como inimigos mortais ou como
chorões sempre de chapéu na mão querendo um “aumentozinho”. E não é nada disso.
Não há “zona
de conforto” em educação.
Os tempos mudaram, a tecnologia avançou, a sociedade tem
novas prioridades, o mundo está exigindo uma nova postura de todos. Educação se
faz de forma compartilhada. Ninguém sozinho faz Educação. É necessária uma nova
visão de professor. Não uma visão de dez décadas atrás. Não mais de um
indivíduo vocacionado. Vocacionado também, mas que necessita ser tratado como
profissional da educação e para tal não pode sobreviver apenas. É inviável o
professor “táxi” que roda quilômetros de um estabelecimento de ensino para
outro para somar no final do mês um salário de cama-mesa-banho. E
consequentemente não tem tempo, muitas vezes para ler um jornal. Vejam os novos
conceitos de administração de recursos humanos. Um deles é proporcionar ao seu
empregado oportunidades de desenvolvimento de sua capacidade de exercer a sua
função. Se isto não acontece por que não estabelecer um salário compensador
onde o educador possa desempenhar a sua profissão com dedicação exclusiva em
uma determinada escola. Desta forma terá tempo para aprimorar seu conhecimento
e técnicas educacionais e desfrutar de uma vida sócio-cultural compatível com a
importância de seu papel no contexto social. Com isto ganha a educação, o
alunado e a sociedade.
(Renato Hirtz – maio 2012)
Ainda sobre Projetos
Na Semana passada, minha filha participou das atividades
de encerramento de um projeto na sua escola pública. Sempre que posso compareço
ao dia da apresentação das conclusões destas atividades. Primeiro para
prestigiá-la juntamente com seus colegas e, em segundo, por que defendo que a escolarização,
por conseqüência a educação e a cultura são muito bem trabalhadas ao longo de
todo este tipo de processo.
Começa que os alunos são desafiados a construir um
conhecimento diferenciado mediado pelo grupo de professores que utilizam seus
conhecimentos para orientar os grupos participantes. A busca de informações
seja pela consulta bibliográfica, por um processo de pesquisa ou com a
intermediação de profissionais que não participam da comunidade escolar
enriquecem o trabalho final. A movimentação seja dentro da sala de aula, nos
laboratórios de informática, biblioteca e outros órgãos sejam públicos ou
privados descaracterizam aquela aprendizagem monótona do cotidiano escolar. Por
fim, os pais (lamento que sejam ainda em pequeno número) participam ou ao menos
tomam conhecimento do que o estabelecimento de ensino esta propondo. Há um
resultado muito produtivo nesta caminhada.
Quando a escola trabalha com projetos integradores,
multidisciplinares ou como queiram intitular, os educandos em sua totalidade e
em intensidades diferentes ou não participam. Eles identificam os fatos a serem
tratados, levantam problemas, elaboram hipóteses, partem para a busca de
respostas (montagem e experimentação de idéias). Finalizam com argumentação
sólida a apresentação final (conclusões) dos trabalhos de grupo. Na realidade
estão colocando em prática todos os passos da metodologia científica. Esta
metodologia não pode ficar alienada de nenhum processo nas ciências, sejam elas
humanas, científicas, ou sociais. Não há assunto que a geografia fique colocada
em um segundo plano. Vivemos num meio geográfico e aí entra a biologia
entendendo todas as relações entre os seres vivos deste meio geográfico. E tudo
isto existe por que se realizam fenômenos físicos e químicos que interferem
nesta distribuição geográfica. Isto tudo para ser entendido depende da
interpretação de fatos e eles devem ser relatados de formalmente através do
conhecimento da Língua Portuguesa. Estas relações ocorrem através de uma linha de tempo, facilmente
explicada pela História que pode narrar os aspectos sociológicos, filosóficos e
religiosos de um conhecimento que o aluno está adquirindo. E tudo isto deve ser
colocado matematicamente correto seja através de gráficos ou estatísticas que
proporcionarão um entendimento proporcionalmente eqüitativo sobre tudo o que o
aluno aprendeu até então. E toda esta aprendizagem pode ser transmitida aos
colegas, ou quem sabe publicado num blog em uma língua estrangeira que pode ser
o Inglês ou Espanhol.
Tudo isto dá trabalho e foge ao padrão de ensino
estipulado pelo sistema ideológico e político que está vigente no momento ou
vem que vem subsistindo através dos tempos. É a relação arcaica entre Poder e
Educação. Agora, se a escola tiver bem presente sua filosofia educacional, em
que tipo de sociedade está inserido, o que esta sociedade quer de sua escola, os
recursos comerciais e empresariais que podem absorver seus educandos e
auxilia-los na aquisição de conhecimento e principalmente o que a comunidade
escolar espera desta escola o discurso para trabalhar sistematicamente com este
tipo de atividade se torna irrefutável. Não que se fuja aos conteúdos
programáticos, mas eles podem render muito mais em prol do alunado.
Outro aspecto que vejo de importância são as integrações
entre escolas. Estes dias tomei conhecimento, com satisfação, que a várias
escolas aqui de nossa regional estão trabalhando com “conexões” entre escolas.
Lembrei quando trabalhava em uma escola particular onde os alunos, através de projetos,
convidavam outras escolas para participarem das apresentações que se
transformavam em verdadeiros seminários. Da música a matemática os alunos se
esmeravam para mostrarem seus conhecimentos aos colegas. Ultrapassavam muitas
vezes suas limitações e alunos considerados “problema” ou medianos descobriam
potencialidades adormecidas. Além da construção de conhecimento, a cultura crescia
nos participantes que conviviam durante um turno ou dois com as diferenças
entre seus pares. Outro fator era o ressurgimento do orgulho por sua escola, instância
até então relegada a um segundo plano. Até hoje encontro alunos que recordam
dos sábados de integração cultural e falam com orgulho de seus desempenhos
naquelas atividades.
Alguns aspectos são importantes nesta caminhada. A
participação do professor é importante como mediador de todas as funções de
preparação, construção e finalização de um projeto. Esta comunhão entre
professor e aluno provoca uma aproximação salutar e ambos passam a se conhecer
não só como mestre e aprendiz, mas como pessoas humanas que aprendem a conviver
cada um com sua bagagem de experiências. Atiçar o aluno a buscar sempre mais e
atingir níveis de produtividade maior daquela que ele está acostumado apresentar.
Provocar o aluno a sonhar com um resultado palpável e que ele possa alcançar. Torná-lo
insatisfeito com procedimentos fáceis e ativar sua capacidade de pesquisar, ir
atrás e com curiosidade. Despertar no aluno o rigorismo pelas informações a
serem transmitidas e sua capacidade crítica pelo que está produzindo. Por fim, tanto
o professor como o aluno pode exercer seu papel político nas suas relações e
nas relações com seus pares.
Cabe
a escola como um todo, nos dias de hoje e com todas as dificuldades que
circundam o ato de educar e ensinar, um grande desafio. Sair da histórica
mesmice e ajudar, realmente o aluno a construir um sentido para sua vida. E
nada melhor do que aprender compartilhando todas as relações e desafios que irá
encontrar fora dos muros escolares. E como diz Paulo Freire “Ensinar
e aprender têm que ver com o esforço metodicamente crítico do professor de
desvelar a compreensão de algo e com o empenho igualmente crítico do aluno de
ir entrando
como sujeito em aprendizagem, no processo de desvelamento que o
professor ou professora deve deflagrar. (Freire, 1996, p.134).
(Renato
Hirtz – maio 2012)
Educação x Escolaridade
Todos estão
cientes de que a escola sobrecarregou-se de responsabilidades além de seus
primeiros objetivos originais. E sua resposta a estes novos encargos criou uma
onda de conflitos que estão requerendo uma retomada de conceitos básicos para
que haja um redirecionamento de funcionalidade que irá despender muito tempo, boa
vontade e readaptações profundas.
Ao longo do tempo a escola assumiu a
responsabilidade da educação num sentido amplo. Um processo muito complexo para
uma instituição de ensino,envolvendo diferentes contextos sócio-culturais
envoltos em uma gama muito grande de acontecimentos que na formação de um
indivíduo. Portanto,educação é algo muito mais abrangente e ultrapassa os
limites estabelecidos pelos muros de um estabelecimento de ensino. Educar, então,
não é função apenas da escola e não é sua responsabilidade a ausência de
educação. Na escola formamos o educando. Ali deve ocorrer o processo de
escolarização. Nela ocorre a instrumentalização para a formação do indivíduo
que vai ser instruído para seu desenvolvimento como ser pensante. O resultado
final, prioritariamente será a aquisição de conhecimentos. Além disto, e por
todo o contexto vivido pelo aluno dentro da escola na convivência com seus
pares, professores, funcionários e gestores educacionais ocorrerá sua formação
como pessoa. Entretanto, isto não seria prioridade da escola e sim ela deve
servir como uma complementação da educação que é a escolarização. O indivíduo
não se educa apenas na escola. Ela tem seu início muito antes da escolarização.
Volto
a repetir que a educação vai muito mais além do processo ensino-aprendizagem. Desde
o momento do nascimento a criança está em processo de educação. A convivência
familiar é parte deste caminho que só termina quando o indivíduo deixa de
existir. Naquela festinha de aniversário a meninada pode e deve ser educada para saber conviver em comunidade. Nós
nos instruímos na escola. Nela também nos educamos, mas nas atividades de uma
associação de bairro, na igreja, no estágio, na convivência em um clube, enfim,estamos
sempre nos educando. Aqueles que renegam regras estabelecidas de convivência
certamente serão chamados de sem educação ou tiveram uma educação deficiente. E
vejam que há aqueles que mesmo antes de estarem matriculados numa escola podem
ser considerados mal-educados. “Partindo do princípio que a educação abrange
todas as possibilidades educativas e acontece em diferentes contextos de
socialização no decurso da vida (interações familiares, dos grupos de pares, laborais,
associativas, políticas, culturais, escolares, a Internet, a mídia. No fundo, a
sociedade em geral) ela não deverá ser redutoramente confinada à Escola.” (Maura Mendes
-Investigadora do CIID - Centro Identidades e Diversidades. IPL).
Educação
não é sinônimo de escolarização. Tornou-se assim através dos tempos, e
principalmente no nosso país pelas circunstâncias que foram se acumulando historicamente
e que serve de tema para outro momento. "O educando é idealizado pela
ideologia vigente e, na prática, pretende-se enformá-lo pelo sistema educativo,
através da instituição formal que é considerada a escola" (Vieira, 1999:
349).
É na Escola
que parecem depositar-se as maiores esperanças sociais no que concerne à
formação dos indivíduos. Porém, "todas as aprendizagens inscritas no
decurso da vida de um indivíduo começam muito antes da entrada na escola"
(Vieira, 1999: 349) e muito depois da saída desta, e "as situações
educativas já não podem atualmente dizer respeito unicamente a um [?] professor
perante um grupo" (Mialaret, 1999: 16).
Obvio
que não se pode fugir da obrigação do professor transmitir conhecimento
(escolarizar) ao educando. Não se pode deixar de lado todas as questões
educacionais que envolvem toda a caminhada do educando, inclusive sua educação
escolar. O que não podemos é assumir solitariamente a Educação de uma criança, de
um jovem ou mesmo de um adulto respeitando suas diferenças em todos os aspectos
humanos. Precisamos é reverter esta máxima da educação escolar ser considerada
como o ambiente mais significativo e primordial onde o processo educativo
acontece. Ela não é a única instituição responsável pelos processos de formação
pessoal, pela formação das identidades, pela construção dos objetivos de vida
de cada um. Ela é um espaço entre outros tantos tão importantes quanto um educandário.
Enfim, a escola deve escolarizar sempre e co-participar da educação do
indivíduo. Num próximo momento trataremos como podemos agir na educação do
indivíduo. (Renato Hirtz – maio 2012)
Relacionamentos fugazes
Já
convivi e continuo convivendo com muita gente jovem seja no âmbito social, quanto
no profissional. Por formação, adquiri a capacidade de
observação.Surpreendo-me,muitas vezes,observando detalhes do comportamento das
pessoas.Talvez,um psiquiatra diria que isto é seria um determinado desvio sei
lá do que.Não é esta a linha de pensamento que quero desenvolver.
Com
o passar do tempo, estou chegando à conclusão de que não só o jovem, mas ele em
maior intensidade perdeu de certa forma, a capacidade de se apegar às pessoas e
as coisas que estão ao seu entorno ou que lhe envolvem diretamente. Ouço com
muito mais freqüência que “seja bom enquanto dure”.Outra expressão é “a fila
anda” e “voltei a pista para negociar”.São expressões que denotam
estabelecimentos de compromissos de toda ordem muito casuais.
São
em número muito menor, nos dias de hoje, observarmos jovens e adultos com
idades mais avançadas que estabelecem relacionamentos fugazes. Há um
imediatismo virulento se estabelecendo nas relações interpessoais sejam na vida
privada, nas relações sociais e profissionais. A história do indivíduo é muito
facetada de envolvimentos e eventos, aliás, não há uma caminhada constante na vida
de um indivíduo.Em tudo há uma necessidade de respostas imediatas.Serve ou não
serve.É bom ou ruim.Produz efeito desejado ou não.Não há espaço para
adequação.Tudo isto torna os envolvimentos muito superficiais e de retorno
quase sempre frustrante,sem comprometimento e libertário.
Conversava
com um executivo do setor de recursos humanos de uma empresa multinacional de
considerável importância no cenário nacional, Sua queixa era bilateral. De um
lado a empresa, por força da globalização, busca produtividade e lucro imediato
através de suas contratações, por outro lado o recrutando visa compulsivamente
salários e vantagens iniciais que se adquirem fazendo história com o passar do tempo.
Nem a empresa, nem o contratado se dão tempo. Isto traz uma carga muito grande
de frustrações para os dois lados.Em vista disto, muitas empresas, conscientes
deste problema, estão criando departamentos que são verdadeiros centros
educacionais objetivando a formação do seu colaborador. Uma total reciclagem em
termos de conduta, conhecimento e visão de futuro. Se assim não for feito a
rotatividade de contratações e rompimentos de relações trabalhistas é volumosa.
A
globalização traz consigo incontáveis aspectos positivos, da mesma forma que
coloca os países e seus habitantes no dilema de posicionar-se como um ser
imediatista e produtivo, caso contrário ficará a margem do processo. É
necessário domínio total da sua área profissional.Habilidades na solução de
problemas de forma instantânea é fator preponderante,não esquecendo a
capacidade de superação no trato das relações interpessoais. E, aí vem a queixa
mais freqüente dos recrutadores de departamentos de recursos humanos quando
dizem que nossos jovens chegam despreparados às portas das empresas. Sem
experiência profissional sim,admite-se. Mas despreparados para assimilar orientações,
informações, ler e interpretar rotinas de trabalho... Não.Isto não é
admissível.E a culpa volta como uma flecha mortal para sua formação de nível
fundamental e médio.
E
o que diríamos, nós educadores?
Vou
postar mais adiante minha opinião.
Acrescente
a sua. Vamos formar um hipertexto com alternativas de soluções ?
(Renato Hirtz - abril/2012)
Sobre o muro
Acabei de ler o
livro Davi Emanuel contra o Apocalipse, de Lucas Steinmetz. Em
determinada passagem do livro o demônio diz que aquele que costuma ficar
em cima do muro ao longo de sua vida já está ao seu lado.
Esta
afirmação me levou a relembrar algo que li, não lembro bem aonde. Era
uma fábula ou lenda que um determinado autor escreveu para explicar o
sofrimento de uma bondosa senhora que após a sua morte foi levada ao
limbo ou purgatório. Para ela era inexplicável a sua presença naquele
local.Passados não sabia quanto tempo,veio ao seu encontro um mentor
espiritual e ela,as raias da indignação,o questionou.
Com
uma mágoa incontrolável, queria encontrar a razão pela qual após 86
anos no plano terreno, sendo uma excelente filha, impecável esposa e sem
ter ao menos desejado um mal sequer aos seus semelhantes, ali estava.
Era um paradoxo.Nunca cometeu um erro sequer por livre arbítrio.Sempre
cumpriu com os preceitos cristãos.Raramente faltava ao sacrifício
dominical,a missa.Nun ca levantou a voz contra seus orientadores
espirituais,mesmo que soubesse que eles muitas vezes iludiam os irmãos
com seus discursos apocalípticos para tirar proveito do temor ao
Pai.Jamais havia denunciado alguém por atos ilícitos.Muitas vezes
procrastinou ações para não ferir este ou aquele. Enfim, nunca cometeu
mal algum e estava ali num espaço de tempo que a solidão doía e o
castigo inexplicável era demais. Deus ? Quem era criatura que impunha
tal provação a uma filha dedicada que não deixava de orar para todos os
santos e principalmente para ele.
O
Anjo, assim vamos chamá-lo, olhou-a com um misto de compaixão e espanto
assim ficando por certo tempo. Ela com o nível de angustia acima do
suportável conteve-se ao máximo,enquanto lágrimas carregadas de dor
caiam em seu colo.Com um gesto lento e doce a entidade divina agarrou a
sua mão e começou a falar com firmeza.
Chamou-a
de filha e disse que a razão dela estar naquela situação justificava-se
exatamente em tudo o que ela havia dito. O que ela tinha feito em
benefício de seus semelhantes ? Perdeu muito tempo tentando ficar em pé
sobre o muro, com medo de errar. E esta posição foi o grande erro de sua
vida.Nada fez para auxiliar,para corrigir,para modificar e desta forma
não havia exercido a maior missão que o Pai havia incumbido aos seus
filhos.Ela omitiu-se da correção de erros,de lutar pela justiça e apenas
cumprir com preceitos dogmáticos de sua religião não acrescentava nada
em sua vida.O Pai quer disponibilidade,amor fraternal e ação.E ela havia
apenas se preocupado consigo mesmo.Ali estava para aprender que
a missão do ser humano lá na Terra era muito mais de doação do que
armazenar dádivas divinas para si mesmo.Nunca havia feito mal a
ninguém,porém muito pouco havia feito em prol de seus irmãos.
Se
houvesse um final do mundo neste momento, o purgatório estaria lotado
de pessoas que vivem olhando seu próprio umbigo e que proclamam serem
boazinhas. Superlotação ocorreria no inferno por aqueles que sempre
estão com discursos cheios de boas intenções e embolsam dádivas divinas
para agradar ao Papai do Céu.
Quanto
a mim... vocês me encontrariam num destes dois lugares,pois missão
difícil de cumprir nesta vida é “amar o próximo como a si mesmo” ao
menos por vinte quatro horas,uma vez por semana.
(Renato Hirtz,abril 2012)
Uma manhã de reflexão
Nestes dias
fui ao centro da cidade onde moro. Gravataí é uma cidade interessante.Ao
mesmo tempo que possui um desenvolvimento ativo contrapõe-se ainda o ar
de cidade do interior.Tudo no centro desta cidade é próximo.O
comércio,instituições municipais,hospitais e bancos convivem lado a
lado facilitando a vida dos munícipes.Gosto da zona central deste
município.
Nada disso tem haver com o que me levou a um dia de reflexão sobre a
vida e dos encontros nada fortuitos encontrados em nossos caminhos. Já
havia resolvido toda minha agenda daquela manhã de sol acalentador.Fui
em direção a uma parada de ônibus para retornar para casa.Um grande
número de pessoas estavam a espera de sua condução,assim como eu.Algumas
formavam grupos de tagarelas que comentavam os mais diversos
assuntos.Outros chegavam angustiados questionando se este ou aquele
coletivo já havia passado e já emendavam uma boa prosa entre si.
Observei que um rapaz atravessava a rua carregando uma pasta modelo
executiva (as antigas 007) e pelo seu andar conclui que estava
embriagado. Vinha em minha direção,aliás é uma coisa que eu atraio são
indivíduos carentes,mendigos,problemáticos e embriagados.Talvez um
“carma” ou uma missão.Sou bom ouvinte e tenho uma veia bem desenvolvida
para o tipo “paizão”.
- Bom dia meu senhor, com sua licença qual o ônibus que pego para ir ao Pan?
? Raciocinei rápido e não consegui achar a informação solicitada.
- PAN, meu senhor, P, A e N. Desculpe, mas é Pronto Atendimento.
-Ah! Existem algumas linhas de ônibus que passam por lá - citei o nome delas e ele sorriu.
Ele deposita a sua pasta no chão ao seu lado, olha para uma senhora que está próxima e diz:
-Cuidado, minha senhora. Não vá bater na minha pasta.Aí dentro tem uma
bomba.Se a senhora tropicar nela vai explodir e BUM ! Estaremos ao lado
de Deus, Nosso Senhor, rapidinho.
A senhora olha espantada e toma certa distancia olhando seriamente para o rapaz.
-Desculpe minha senhora. Estou brincando com a senhora.estou feliz hoje e gosto de brincar respeitosamente.
Sorri e olha para mim.
- O senhor é um iluminado, um iluminado e enxerguei isto quando estava
atravessando a rua. estava mal e cheguei perto do senhor e fiquei bem.O
senhor é filho de Ogum e é iluminado.
- Não é bem assim. Fico contente que estás feliz.
- É estou indo para o PAN ver meu querido pai. Ele teve um derrame hoje
pela manhã e eu,mesmo bebam,salvei a vida dele.Os para médicos da Samu
disseram que seu não tivesse feito massagem cardíaca e respiração
boca-a-boca até eles chegarem...ele tinha conhecido rapidinho meu
irmão...Jesus Cristo.
Passa outro senhor por perto e ele fala em voz mais alta ainda:
- Olha a bomba! Apontando para a pasta e sorrindo. Pede desculpas pela
brincadeira ao senhor que lhe devolve um sorriso e um ar de estranheza.
- E como está teu pai agora?
- Bem... quer dizer está no PAN fazendo exames e medições adequadas ao caso dele.
Notei
que ele tinha uma facilidade em se expressar com certa correção
gramatical. Não estava maltrapilho.No pescoço havia uma corrente com um
crucifixo e nos dedos de uma das mãos havia um anel que não tinha
aparência de bijuteria.
-Onde aprendeste a realizar os primeiros socorros?
- Meu senhor, tenho o ensino médio completo. Sou formado em Técnico em Eletricidade Industrial.Aprendi
a fazer os primeiros socorros lá no Senai.Uma professora e um grupo de
paramédicos nos ensinaram.Com isto salvei meu querido pai.
-E não exerces a tua profissão?
-
Exerço. A de bebum ! (dá uma gostosa gargalhada). Sou baladeiro e bebum
profissional.Até hoje não descobri o que fazer com meu certificado do
ensino médio e muito menos com o do técnico.Virei bebum
profissional...profi,meu senhor.
Com uma gargalhada gostosa se abaixa e começa a abrir a sua pasta.
-Olha
a bomba! Olha a bomba! Vou lhe mostrar o que eu trago dentro desta
pasta. Calma pessoal,é brincadeira,desculpem-me ! Sou muito brincalhão,
mas não sou abusado!
Abre
a pasta e para meu espanto lá dentro havia em torno de uma doze
caixinhas de remédio, a maioria com tarja preta e uma garrafa pet
pequena com um líquido cor de vinho. Havia documentos e papéis.Entre
eles o certificado do ensino médio e do técnico que ele havia falado.
- O que é isto?
- Senhor, isto é para que eu possa ficar feliz e se alguém não está
feliz eu dou um destes comprimidos e pronto (grande gargalhada). Agora
vou lhe mostrar a bomba.Aqui.Esta aqui é demais.
Exibe uma garrafa pet cheia de vinho tinto e toma um gole.
-
Esta faz esquecer que estudei para nada!Nada! Nada! Minha mãe é que me
fez estudar e me levou no médico, pois eu era imperativo (outra
gargalhada). Nada disso, eu sou bebum profi.Profi!
Aproxima-se o ônibus e ele rapidamente fecha a maleta. Dá um descoordenada corridinha.Entrando no ônibus vira-se e grita:
- Iluminado, fica com Deus! Olha a bomba! Olha a bomba!
Fiquei
ali parado olhando o ônibus se afastar. O que leva uma pessoa a esta
situação ? Como o espírito deste indivíduo vê este plano e a que veio,
na verdade. Há culpados ? Quem?
Pensem nisto e tentem chegar a uma conclusão.
(Renato Hirtz - novembro 2011)
Sem glamour político
Conversava um dia destes com um jovem que quer ingressar na carreira
política. Já trabalhando em serviços comunitários vê a necessidade de
poder legislar no âmbito municipal para conseguir realizar de forma mais
eficaz os anseios de sua comunidade. Muitos projetos estão organizados
na sua cabeça.
Me dei conta é que a maioria deles eram grandiosos ou de grande
impacto social.Sua vontade de acertar as coisas no seu município e na
sua comunidade beiravam as raias da alucinação.Os argumentos para cada
uma de suas ações são profundamente embasadas em dados técnicos e podem
ser executados caso houver os tais de acordos políticos.
Depois de ouvir suas propostas passeia comentar com ele um outro
lado, um outro viés da gestão administrativa que me chama a atenção há
alguns anos. O munícipe quer ver seus anseios atendidos, sejam eles
individuais ou coletivos, pela administração pública de modo rápido e
prático. Outra postura é que o cidadão não dá muita atenção ou valor a
grandes obras pontuais,na verdade necessárias em sua grande maioria para
o desenvolvimento de determinado bairro ou mesmo da cidade.O que ele
quer é ver as necessidades básicas atendidas.E as vezes são pequenos
detalhes que vão tornar a vida dele mais prazerosa e torna-lo mais
confiante nos seus governantes.E estes detalhes não encarecem o erário
público,ao contrário evitam grandes gastos ao final do processo.
Ponderei com ele que pequenas ações tornam o ambiente onde vive os
cidadãos muitas vezes são mais importantes do que grandes obras. O
concerto da calçada,a lâmpada da rua queimada,a colocação da tampa de
lobo que está quebrada,a colocação de uma porta na associação dos
moradores,um enfermeiro há mais neste ou naquele posto de saúde,enfim
conjunto de pequenas ações administrativas que são muito mais
reconhecidas do que reformas ou construções de maior vulto.
Comentei a ação de um departamento de água e esgotos que formou uma
equipe de sete ou oito funcionários que numa ação sem maiores custos e
evitando gastos muito mais elevados verificavam casa por casa, rua por
rua, bairro por bairro as conexões de canos de água entre a rede externa
e interna para localizar vazamentos de água e caso existissem
solucionavam o problema imediatamente ou agendavam a sua correção.
Pouparam custos com desperdício de água,omissão de pagamento de taxa de
consumo de água por possíveis desvios e evitavam,desta forma,consertos
mais complexos que iriam certamente onerar os cofres públicos de forma
direta ou indireta.
São pequenas ações,assim como o concerto de cadeiras na sala de
espera das repartições públicas,aquele simples fio pendurado no
consultório médico do posto, o vidro quebrado na escola, a poda
sanitária da árvore cujos galhos caem sobre o passeio público, a placa
simples com o nome das ruas, as setas de indicação de bairros tornam a
cidade mais aprazível e os habitantes mais felizes.
Poderia ficar relacionando uma série de coisas que se pode fazer num
município com custos menos elevados e até,muitos deles,em parceria com o
próprio cidadão ou suas associações de bairro,recebendo estes um
abatimento em seus impostos prediais,por exemplo,se estabelecem
compromissos de conservação da limpeza de suas ruas ou outras atividades
que serviriam para desenvolver a cidadania.Há ruas de determinados
bairros que os moradores fazem um verdadeiro festival de integração,aos
sábados pela manhã,limpando suas calçadas e meios fios,regados a boa
conversa entre um chimarrão e outro.
Quando calei, o jovem ainda sem a marca da vivência política,
propriamente dita, sorriu timidamente e concordou plenamente comigo
ressaltando apenas que tudo isto era possível realizar, mas não teria o
glamour político e não daria discurso nem voto a uma pretensa reeleição
ou eleição.
Coloquei minha canção e viola na sacola e mudei de assunto.
Autor:
Renato Hirtz
Fonte imagem:
Causo : Seu Ziraldo
Vovô
Ziraldo ou tio Zira como era conhecido pelas pessoas é uma figura
especial. Aos oitenta e dois anos possui um nível de vaidade que beira
as raias da alucinação.Cabelo cuidadosamente cortado e penteado,barbeado
com requinte e com um bom gosto para se vestir provocava até nos mais
jovens uma inveja saudável. Para dar uma voltinha por aí com sua “eterna
noiva” de oitenta anos não media esforços.Dona Hortência recebia uma
severa reprimenda se descuidava da aparência e estilo ao se
vestir,observando com rigor quando o peso dos anos fazia vacilar seu
caminhar elegante.
- Olha a corcunda, Tência ! (o nome original foi abreviado com o passar
do tempo). É de bom tom mulher andar corretamente com sapatos de
saltinho. Não tirava os olhos da postura de sua mulher. Sempre foi muito
exigente consigo e com sua esposa ao longo dos quase 65 anos que se
conheciam.Compra de perfumes,cosméticos,sessões de
massagens,cabeleireiro,dentistas e visitas sistemáticas ao doutor ,ou
melhor,aos doutores eram religiosamente efetuados.Nada podia atrapalhar
as suas vidas ou afetar a aparência deles.
Dona Hortência fala com orgulho da beleza que seu Ziraldo possuía na
juventude e do seu ciúme que lhe corroia as entranhas quando iam aos
bailes do clube da cidade natal. Os olhos verdes,o cabelo loiro liso e
grosso caído na testa, seus ombros largos provocavam frenesis nas
garotas quando ele adentrava ao salão e sofriam com os "olhos gordos "
que botavam quebrantes ao namoro dos dois.O casamento,a lua de mel e
dali para frente o relacionamento sempre foi intenso. Vô Zira com um
sorriso de canto de boca estufava o peito fazendo um barulho gutural
para disfarçar orgulho que crescia no íntimo ao ver sua noiva falar tudo
aquilo. Neste momento ele interrompia com aquele ar de inocente
humildade:
-Não é tudo isto. Eu dava para o gasto.Linda sempre foi a Tência.Olhos
negros combinando com a cor do cabelo,pele morena,lábios de uma grossura
sedutora,seios....seios fartinhos,coxas na medida e aquele traseiro...
- Tenha mais respeito Zira. Tem visita na sala.Depois de velho ficou tarado ?
- Fiquei não. Sempre fui ! E a culpa é deste teu corpaço...
-Quieto! Já chega. És de pouca vergonha.
Houve uma sonora e gostosa gargalhada e o som de um beijo na face da
dona Hortência que revida com o cotovelo afastando carinhosamente o seu
velhinho de perto.
-Modos... modos menino.
E assim viviam os dois numa verdadeira casa de boneca onde uma vez por
semana se fazia presente a Marli para fazer uma faxina. E ela era motivo
de uma briguinha entre os dois.Dona Tência cismava que Zira não
desgrudava o olho do traseiro da faxineira e ele negava de mãos juntas
"por esta luz Divina que me ilumina".
Quando a filha mais velha ia visitar os dois havia uma conversa muito
particular entre mãe e filha. E o assunto era timidamente repetido pela
dona Tência:
-Acho que teu pai à medida que avança na idade está ficando tarado,
maníaco ou esclerosado. Coloca horário para tudo.Principalmente quando
chega a noitinha.Café da tarde tem que ser as quatro,janta as sete e
deitar tem que ser as 10 horas.Nem um minuto mais,nem um minuto menos.
- Ah, mamãe! Estas são manias de pessoas idosas. Vocês sempre
estabeleceram horários para tudo quando éramos crianças.E papai fixou
esta rotina.
- Menina ele entra em pânico quando não consegue deitar no horário e só
falta mandar as visitas embora quando se aproxima do horário de dormir.
E,o pior é em relação ao sexo.É quase todos os dias me incomodando e
sempre no mesmo horário.Ele não perdeu as forças ainda.
- Calma mamãe. Ainda bem que papai tem saúde e não está entrevado numa cama ou coisa parecida.
-Outro dia fomos a uma festinha de aniversário de uma vizinha, lá no
final da rua e ele me fez passar por uma situação constrangedora. A
festa estava ótima,bastante salgadinhos,docinhos e refrigerantes e
quando o relógio marcou nove e meia da noite me deu a impressão que ele
tinha sofrido uma possessão demoníaca.Queria ir embora de qualquer
jeito.No meio de uma boa prosa com uma conhecida minha tive que deixar a
mulher falando sozinha.Teu pai me agarrou pelo braço com aquela mãozona
e quase me arrastou pela rua ,pois tinha que chegar em casa as quinze
para dez.Tu acredita ?
-Vou falar com Gilberto. Meu irmão vai falar com papai sobre isto.
- Não cai na asneira de dizer que eu falei alguma coisa. Diz para Gilberto dar uma volta e sondar a situação.
Passado alguns dias, lá estava Gilberto assando um churrasco para
recepcionar os dois progenitores. Vô Zira não dispensava uma boa cerveja
sempre que podia comemorar alguma coisa.Estar na casa do filho comendo
um churrasco,sentado numa boa cadeira de praia,vendo os netos correndo
pelo pátio merecia uma comemoração.
-Pai, como estão as coisas?
-Não podiam estar melhores. Tudo em paz,aposentadoria na medida
certa,tua mãe com saúde ,eu e meu velho guerreiro firme e forte.....o
que mais que eu quero.
-Vais ficar aqui para dormir e aproveitar o domingo conosco. Seu
Zira remexeu o corpo na cadeira, ficou hirto e quase em estado de choque
falou com voz alta e firme:
-Não! Não! Não trouxe meus remédios e não posso passar sem eles. Nada
disso.Oito horas me leva para casa,pois antes das quinze para dez tenho
que tomar meus remédios e deitar com tua mãe as dez.
-Hei, mas porque este estresse?Qual o motivo desta angustia?E porque este horário tão rígido?
-Rapaz, não contraria teu pai. Tenho oitenta e dois anos e não é tu que
vai me dar rumo agora.Vou para casa.Eu e tua mãe tomamos nossos
remédios e dez horas....cama !
-Não entendi a necessidade dos quinze para dez e deitar às dez horas.
-Putz!É que eu separo os remédios da tua mãe e os meus. No meio dos
nossos remédios eu coloco a azulzinha.Rapaz,o efeito começa em quinze
minutos e não sou bobo de perder o efeito que provoca em mim e na tua
mãe.
Ouve-se uma gostosa gargalhada que é interrompida rapidamente pelas
mudanças faciais do Vô Zira. Com uma carranca de botar medo até em
fantasma olha para o filho e dispara:
- Se tu me contar para tua mãe ou para mais alguém... eu te capo e nem
azulzinha vai adiantar.Assunto encerrado e me passa uma lasca desta
picanha mal passada.
Sem acreditar no que ouviu Gilberto só consegue dizer:
-Sim senhor.
Renato Hirtz
Março/2011
A PRETA CREUSA
Barbosinha era um funcionário de uma Secretaria da Educação. Formado em
Pedagogia, com especialização em Supervisão Escolar, foi transferido
para uma Coordenadoria de uma cidade do interior. Era um especialista em
educação e como tal muito educado, trabalhador, dedicado e gostava do
que fazia.
Recém chegado na Coordenadoria, como é natural, não tinha noção de como
era a rotina de trabalho, com os colegas e com os meandros da política
local. Ficou determinado pela chefia imediata que iria fazer supervisão
nos estabelecimentos de ensino no interior da região. Orientar,verificar
e resolver “in loco” os problemas que pudessem estar ocorrendo na
dinâmica pedagógica era sua missão.. Os locais eram os mais diversos e
variavam as distâncias. Algumas escolas se localizavam a grandes
distâncias,levando quase meio dia de viagem,ainda mais pelas condições
precárias de acessibilidade.Foi-lhe dito que a visita de um supervisor a
estas unidades escolares,em 99% dos casos,era uma festa.Isto acontecia
porque os professores e as diretoras das escolas gostavam das
“novidades” referentes à educação e outros assuntos (fofocas,na verdade)
que estavam em pauta no momento.
Mandaram o Barbosinha falar com o encarregado do transporte. Ele teria
uma condução disponível para seu deslocamento e de outros colegas
supervisores que o acompanhassem,caso houvesse necessidade.Não perderiam
tempo utilizando-se do transporte coletivo que era precário na região e
com horários reduzidos.
Lá se foi o “Professor Barbosinha”, feliz da vida conversar com o
encarregado do transporte. Seu Virgílio, funcionário cedido pelo
município sede, era um baixinho, atarracado, com um bigode de fazer
inveja e com uma melena penteada no capricho com gel fixador. Estava
encostado na Brasília76,carro oficial azul e branco usado pela senhora
coordenadora.O carro tinindo de tanto lustre estava embaixo da sombra
que fazia uma velha figueira.Coçando a orelha com aquela espetacular
unha do dedo mínimo,ficou só de olho no “peão” que vinha se aproximando.
-Sou o professor Barbosa. Muito prazer em conhecer o colega.Sou o novo
supervisor da coordenadoria.Vim conversar com o Senhor sobre a condução
que vamos usar para visitar as escolas.
-Ah!Sim, sim. O Senhor vai usar a Preta Creusa. O sistema está
funcionando. Às vezes a bateria dá “os doces”,mas é só da um tranco e a
coisa funciona.As “luz”,conforme a buraqueira apagam,mas logo volta.O
resto funciona normalmente.Só tem que cuidar é com a direção .É muito
sensível e o setor de direção tá com uma pequena folguinha.
O Barbosinha não quis interromper o Seu Virgílio. O que ele havia
perguntado ou pensou em perguntar é como ele poderia dispor do veículo
que iria usar.
-Não se esquece de ver com antecedência – continuou o Seu Virgílio
cofiando o bigode com a unha de tamanho avantajado – é a distância que
vai andar para calcular o quanto tem que levar de gasolina extra. O
senhor vai abastecer nos postos de gasolina indicados pelas prefeituras
dos municípios que fazem parte da região.Vamos ver a “preta” e já lhe
deixo com as chaves. Quando o Seu Virgílio abriu a porta da garagem, o
Barbosinha quase teve uma síncope cardíaca. O veículo,a “preta Creusa”
era uma Rural 1966(e olha que o fato ocorreu em 1987) de cor preta,com
uma tarja branca nas portas,com uns escritos que só dava para ler
“SUTERGS” ou coisa parecida.
A porta do motorista quase veio abaixo quando Barbosa abriu, forçando
um sorriso de contentamento. Os bancos uma vez foram pretos possuíam
remendos de matizes variados.Barbosinha limpou com a mão aquilo que
chamavam de banco e sentou-se com uma palidez invejável.Virou a chave e
tentou dar partida do motor.Só ouviu-se um “tec”.
- Para que é a bateria. Eu falei que ela era geniosa.Tem uma de reserva
lá atrás.Faz-se uma ponte e já era,falou Seu Virgílio. Feita a ponte
foi dada à partida no motor. Quando o motor começou a funcionar parecia
que o ar ao redor do famigerado veículo havia sumido.Uma espessa nuvem
de fumaça branca tomou conta do local e o cheiro de gasolina tornou-se
insuportável.
-Eu não disse! Gritava emocionado o Seu Virgílio. A “preta creusa” não
nega fogo.O senhor passa no posto de gasolina da esquina e
abastece.Depois passa no Setor de Manutenção da Prefeitura e pega um
macaco do Brás emprestado,caso fure algum pneu.
Corcoveando que nem mula lá se foi o Barbosinha tentando dirigir aquele
veículo do inferno. Era uma situação de risco de vida imediato.O freio
funcionava na quinta pedalada,o volante tinha exatamente duas voltas e
meia de folga,as marchas engrenavam quando queriam (e escapavam também
da mesma forma!)....mas fazer o que ? Era aquilo ou longas horas de
espera na beira das estradas pelos ônibus de linha.
Abastecido o veículo dirigiu-se ao Setor de Manutenção como havia sido orientado.
- Boa tarde! Vim pegar o macaco do Brás... Nem tinha terminado de falar
Brás e se deu conta do que tinha dito. Barbosinha,pensou,sobre a
mancada produzida!
O atendente que estava na entrada do portão com um sorriso no rosto
grita pelo nome do Brás. Um negro com um metro e noventa,uma verdadeira
muralha,vestido em um macacão que um dia devia ter sido amarelo,pois
estava totalmente sujo de graxa aparece na porta do galpão.
- Hã ?
Barbosinha gelou quando pensou que o atendente iria dizer exatamente o
que ele havia falado segundos antes e saltou na frente dizendo:
-Nada de importante.Só passei para conhecê-lo. O Virgílio manda lembranças e um abraço...
Consegue engatar a primeira marcha e sai de fininho dando um adeusinho para o Brás que até hoje não entendeu nada.
Renato Hirtz
Outubro de 2004
Vovô Zílio (verídico)
Um
velhinho daqueles que qualquer um gostaria de ter como avô.
Alegre,perfumado e muito faceiro gosta de estar sempre bem informado.Não
há o que não lê e está sempre atrás de boa informação.
Lúcido, extremamente lúcido nos seus oitenta e cinco anos. Ainda
trabalha em uma empresa três vezes por semana e produz satisfatoriamente
para acrescentar a sua aposentadoria uma boa parcela de reais.Sua
conversa é agradável,atual e uma boa fonte de informações sobre vários
assuntos.
Estes dias veio me questionar sobre mudança de sexo, pois sabe que sou
professor de biologia. Fez uma relação de famosos e não famosos que
trocaram de sexo alguns dos quais eu nem sabia que haviam feito isto.Bem
falante,disse que não tinha nenhum preconceito sobre estes
procedimentos,pois cada um tem o direito de escolher e dar um rumo a sua
vida.A sua curiosidade era sobre os procedimentos cirúrgicos para tal
fim. Sentei-me com ele na frente de um computador e comecei a mostrar
uma série de slides onde apareciam todos os passos para realizar tal
transformação.
Como bom professor fui didaticamente explicando cada etapa,o que era
feito e de que forma.Com muita atenção sentia que ia absorvendo toda
explicação e entendia perfeitamente a leitura que fazia de cada
imagem.Questionava quando não entendia e fazia comentários das
dificuldades de recuperação do paciente,da técnica cirúrgica,do
espantoso avanço da medicina e os slides foram mostrando a finalização
da operação.
Quando chegamos ao último slide onde aparecia o órgão genital feminino
após certo tempo do ato cirúrgico, inocentemente voltei-me para ele e
disse, automaticamente, que ali estava um homem transformado em uma
mulher com os órgãos genitais ( vulva e vagina) perfeitos. Neste
momento, vovô Zílio começou a rir. Passou a gargalhar quase
convulsivamente sem parar.
Fiquei sem graça,quase atônito me questionando o que havia dito de tão
hilário para causar tamanho alvoroço.Após alguns segundos que pareceram
uma eternidade,ele já refeito e vendo minha fisionomia de
espanto,colocou sua mão sobre meu braço e disse:
- Não fique abalado, meu filho. Não é nada com a troca de sexo ou com
sua explicação que me fez cair na gargalhada.Se você não tivesse dito
que aquilo era uma vulva e uma vagina eu não lembraria...Me dei conta
que faz tempo que não vejo uma !
Ainda sorrindo, agradeceu a explicação e saiu pensativo porta a fora.
Renato Hirtz
Fev/2011
CAUSO : JAMBOLÃO, O SEGURANÇA
Era uma noite muito fria.
Terminada a sua jornada de trabalho, sem carro e sem carona, o
Professor Freitas ia pela rua pouco iluninada com sua pasta envelhecida
pelio tempo e fumando um cigarro. Pensava nas contas a pagar, nos
filhos, na esposa e nos seus alunos e alunas que poderiam ter uma vida
bem melhor se ouvissem os seus conselhos.
O professor Freitas era daqueles professores dedicado, correto e sempre
buscando uma forma de auxiliar seus alunos com uma palavra amiga, com a
dica de um luar para trabalhar, um curso gratuito para fazer, enfim, um
paizão. Pouquissímos alunos e alunas não gostavam de conversar, brincar
e, principalmente, assistir as aulas do Freitas. Um amigão,um paizão,um
cara lehal diziam os seus alunos e os ex-alunos.
Conhecia todo o mundo. O policial militar da quadra,o pai do fulano,a
mãe do ciclano,a vó da beltrana e sabia das dificuldades que seus alunos
passavam.Lá se iam vinte e tantos anos de profissão e não havia um
rosto,um olhar,um gesto que não indicasse ao bom professor uma
necessidade daquela gurizada.
Lá ia ele por aquela rua em direção a parada do ônibus, quando ouve um
ruído de um carro que se aproximava mansamente. Não pode ser, pensou o
professor Freitas. Será que vou ser assaltado na vila que já dedico
quase quinze anos de trabalho ?O que vão me roubar? Meu relógio
paraguaio que consegui comprar com muito custo ou meu tênis que mal
terminei de pagar. E se me roubam a pasta com os cadernos de chamada e
minhas anotações nesta agenda que ganhei há dois anos atrás ? Não, só
falta me roubarem o dinheiro dapassagem e euter que ir caminhando atéem
casa. O som do motor, um ronco pesado e que marcava uma cadência
horripilante se aproximava cada vez mais. O estômago do profesor Freitas
se contorcia e a sensação do perigo eminente contraia todos os músculos
corpo do professor.
Uma pequena olhada de canto de olho e o quadro se tornou assustador. Um
opala preto,com os vidros escuros e um turbo em cima do capo completou a
dose de pavor que tomava conta daquele professor agora sentindo-se o
ser humano mais indefeso da face da terra. O carro para alguns metros à
frente e a porta de abre. -Mestre! A voz era rouquenha, tétrica e vinha
do fundo dos pulmões de um jovem negro de uns dois metros de altura. Um
verdadeiro ármario que saia de dentro daquele opala preto e se
locomoviapesadamente na direção do franzino professor.
-Mestre, o que faz aqui há esta hora? Tu tá perdido meu fessor?Com um
sorriso escancarado e uma linguagem de malandro, o rapaz abria os braços
na direção do professor que recebeu um abraço esmagador. O professor
viu o chão se abrir aos seus pés, um suor gelado aflorou por todo o
corpo e um calafrio insistia em arrepiar sua pele. Foram instantes de um
verdadeiro filme de terror,pavor,pânico....Ele não sabia como descrever
o que passará em sua cabeça;
- Jambolão, que susto me deste. Estou indo para a parada de ônibus.Perdi minha carona e vou esperar o ônibus na esquina.
- “No problem” meu mestre, eu faça a tua segurança até o ponto.
Virando-se para o carro, já deixado um pouco para trás, grita para os
três ocupantes que lá estavam:
- Ô cachorrada, vamo acompanhá o mestre até a parada do ônibus fazendo a
sua segurança. Na maior e de mansinho.Vamos firme,meu mestre que quem
tá com o Jambo,tá melhor do que com Deus!
- Tá bom.
Foi à única coisa que o professor Freitas conseguiu dizer. Jambolão
tinha sido aluno dele até a 5ª série e por uma série de razões havia
parado de estudar e se dedicado a prática atos que iam de encontro
aquilo que se chamava “ bons costumes”,infelizmente.
- Gente boa, a voz era retumbante, tu não sabes que eu tenho boas
lembranças das tuas trovas nas aulas que tu davas na 5ª série, porém, o
negrão aqui tá batalhando numa outra área. Distribuo,dou atraque nos
mané,mas lembro bem das tua lição,meu “brodi”.Sabes...Sabes que até dou
uma graninha,por fora,para os menos favorecido aqui e ali.Ajudo os
velhinhos e compra de mim quem qué.Não sou de insisti.
- Ah! Entendo, mas tu estás bem? Não pensa em retornar aos estudos e
concluir o ensino médio e batalhar por uma profissão mais tranquila?
- Até penso meu mestre. O tempo é que é curto prá cumprir com todos os
meus afazeres.O dia tinha que ter mais horas,vinte e quatro para todos
os meus compromissos é muito pouco.
E lá iam os dois na direção do ponto do ônibus. Chegando,o opala
estacionou na esquina,deslizou os faróis e o motor.Um dos rapazes coloca
a cabeça para fora,pela janela,e grita:
- Temo aqui, quarqué coisa metemo bala e voceis se abaixa!
-Não... Não é preciso nada disso, o professor Freitas nunca tinha passado por uma situação daquelas.
O garotão contava dos assaltos,da venda de drogas,das atitudes
disciplinares que impunha aos que lhe deviam e mostrava as duas pistolas
que o acompanhavam na sua labuta diária.
Ao mesmo tempo em que sentia remorso por não ter podido ajudar mais o
então, menino da quinta série achava interessante que o “deliquente”
mostrava um coração bondoso com alguém que uma vez tentou ajudá-lo. Era
um verdadeiro paradoxo. Neste momento, explodiu-lhe na cabeça uma
péssima e irreparável situação. E se naquele momento a viatura da
polícia militar passasse por ali.Naquele momento,vendo aquele quadro.não
haveria explicação que fizesse entender ele ao lado do indivíduo mais
procurado do bairro por uma série de delitos.Imaginava a repercursão do
fato.Cinco elementos detidos pela polícia entre eles um professor da
escola do bairro ! Não, o martírio teria que ter um fim. Era uma mistura
sensações que engasgava o pobre professor: o cuidado do ex-aluno para
com ele e o histórico de transgressões que ele havia cometido.
Verdadeiramente um terrível paradoxo.
- Jambolão, aí vem um táxi lotação. Vou nele para não te atrapalhar e
não chegar tarde em casa. O Jambolão dirije-se ao meio da rua e com os
braços abertos começa a fazer sinal para o táxi lotação parar. O
motorista ao vê-lo não sabe se acelera ou pára. Abre a porta do veículo e
branco como uma folha de papel só tem tempo de dizer:
-Sim...
-Este é meu mestre. Leva ele na legal até onde ele disser e nós vamo só na proteção.
“Meu mestre!”, pensou o professor Freitas. ”Meu mestre” do quê ? E subindo no táxi lotação virou-se para trás e falou:
-Obrigado Jambolão. Valeu a força e te cuida!
-É isso aí, mestre dos mestres. Toca a coisa que “estamo” na tua cola.
O motorista riu amarelo e acelerou. Seus olhos não desgrudaram do
retrovisor e devia estar rezando a todos os santos,pois era o professor
Freitas e ele naquele veículo. Constrangido o que o professor conseguiu
dizer foi:
-Não sou mestre do que estás imaginando. Vai tranquilo que sou
professor e aqui está o dinheiro da passagem.Ele foi meu aluno na quinta
série. O que o professor Freitas ouviu a seguir foi um grande supiro do
motorista e o ronco do motor do opala do Jambolão que vinha “na
segurança”.
Autor
Renato Hirtz
CAUSO: A CARONEIRA
Lurdimila era uma funcionária de escola, solteirona, cheia de manias e
fricotes. Sempre pintada de modo exagerado que lembrava mais uma máscara
chinesa do que outra coisa.Não gostava de ser comparada com as outras
colegas de função, pois tinha feito o supletivo de 1º grau e achava que
estava num patamar acima das demais.Em vista disto, não ficava
partilhava recreio com as colegas e sempre exigia atividades menos
pesadas.Adorava ficar encostada no balcão da secretaria e de quando em
quando se metia a dar informações e a despachar pais e outras pessoas
que ali compareciam.
Tinha
uma mania que todos os colegas detestavam. Não se descuidava de
escalar-se para uma carona e muitas vezes exigia a alteração de roteiro
de quem lhe dava a carona, ou para vir para a escola ou para ir de volta
a sua casa.Não esperava ser convidada e o pior, não colaborava com a
vaquinha para a gasolina.E, morava a uns 10 minutos de ônibus da escola.
No
horário da saída dos alunos e professores, o pessoal que tinha carro e
já possuíam seus caroneiros tratavam de ir logo embora (quase fugindo),
pois a Lurdimila, mesmo com o carro lotado, pedia carona e dava um jeito
de entrar e sentar-se de modo confortável.
Paulo
Emílio e Sérgio Ricardo eram dois jovens professores que faziam parte
daquele sofrimento. Morando num outro município e nas proximidades do
mesmo bairro iam sempre juntos de carro, alternando ora no carro de um
ora no carro do outro para poupar combustível.Eram dois grandes
gozadores e não perdiam uma chance de se divertir ou aprontar alguma
brincadeira com os colegas.Nada de maldade, mas sempre estavam atentos
para uma “pegadinha”.
Os
dois professores eram considerados excelentes, além disso, estavam
sempre dispostos a colaborar nas atividades extraclasse, preocupados com
o rendimento dos alunos, procurando trazer sempre novidades e atrativos
para seus alunos. Os dois ainda estudavam na Universidade, trabalhavam
outras escolas e tinham seus compromissos sociais como todo o bom jovem.
Viviam,
por isso, sempre com os horários preenchidos e voando de um lugar para o
outro cumprindo com suas obrigações. Andavam sempre no limite de
velocidade em seus fuscas a fim de cumprir com suas obrigações.
Certa vez, saindo da escola, já com o fusquinha lotado (com outros dois caroneiros) foram barrados pela Lurdimila.
-Professor
Sérgio Ricardo, hoje o senhor não escapa de me dar uma caroninha.
Podiam me deixar na praça central da cidade.Tenho um compromisso e não
posso chegar atrasada.
-Mas
estamos com o carro lotado. Veja se outro professor não te leva para
lá.Sérgio Ricardo não gostava de colocar mais de quatro passageiros no
seu fusca, pois forçava muito a suspensão do carro e o consumo de
combustível era maior.
-Mas
é só até o centro. E os outros professores estão com os caroneiros
certos.E estou com pressa e eles se amarram muito para sair.
E
Lurdimila não espera resposta. Mete a mão no trinco da porta, empurra o
banco do passageiro (com passageiro e tudo) e entra com seu traseiro
grande dentro do fusca.Sentou é o modo de dizer.Ela despencou em cima
dos dois colegas e os esmagou nas laterais do veículo.
-Vamos professor. Estou com uma pressinha.Não posso me atrasar.
Sérgio
Ricardo, furioso com a situação e pronto para dar um fim naquilo tudo,
arranca com o fusca acelerando tudo o que podia e imprimindo a
velocidade máxima que o carro permitia. E já conhecedor da estrada fazia
as curvas para direita e esquerda em velocidade e perícia de um piloto
de provas. O fusca voava pela estrada que separa a escola do centro da
cidade.
A
cada cantada de pneus, nas curvas, o silêncio dentro do carro
aumentava.A conversa foi se extinguindo até que se fez um silêncio
mortal. Lurdimila quase em sussurro bate no ombro do Sérgio Ricardo e
diz:
-Professor, eu estou com pressa, mas nem tanto. Pode ir um pouquinho mais devagar.
-Esta
é a velocidade normal que eu ando. E olha que hoje eu não estou com
pressa. E Sérgio Ricardo continuava sua desabalada carreira até o centro
da cidade. Na praça central ele para o carro com uma freada de queimar
pneus.
-Chegamos dona Lurdimila. Bem no horário.
Neste momento um cheiro de urina toma conta do interior do carro. Todos se olham e Lurdimila branca como um papel, diz:
-Não adiantou nada chegar no horário. Entra na próxima rua e me deixa em casa que eu “afrouxei as urinas” e tenho me trocar.
Sérgio
Ricardo estava furioso, pois o banco traseiro do fusca estava molhado
de urina, arranca com o carro, novamente, em desabalada carreira e para
na frente da casa da Lurdimila.
-Pronto. Amanhã eu trago a conta da lavagem do carro.Quando quiser outra carona é só pedir.
Entre
risos e lamentações pelo cheiro da urina que pairava no interior do
carro, lá se foram os quatro professores aos seus destinos.,porém,
tinham uma certeza:Lurdimila nunca mais iria pedir carona para eles.
E assim aconteceu.
Autor:
Renato Hirtz
CAUSO: A MOELA
O dia estava ensolarado. Havia aqui e ali uma cerração característica
das manhãs de inverno, nos lugares mais baixos.Com o passar das horas se
dissiparia. O grupo de supervisores da Delegacia de Educação estava
aposto esperando a condução que os levaria a uma escola distante do
município sede.Se tudo ocorresse normalmente, chegariam lá por volta do
meio-dia.
A diretora da escola já havia entrado em contato com a Chefia da
Supervisão avisando que esperaria com um almoço quase festivo o grupo de
supervisores.
Adroaldo era o supervisor administrativo.Já aposentado, por sua
experiência e dedicação, havia retornado ao trabalho.Homem matreiro
sabia soltar uma piada ou gozar com a cara de alguém sem formar o menor
sorriso.Era terrível, por exemplo, ficar ao seu lado durante uma
reunião.Falava aos sussurros os maiores impropérios e sandices que se
poderia esperar. Martha e Gélica (era assim mesmo o nome desta
professora) faziam uma dupla e tanto.A primeira era supervisora
pedagógica e a outra, administrativa.Eram a corda e a caçamba.Não havia
cristo que as separasse quando tinham que exercer suas funções
profissionais.Nem imaginavam os seus apelidos: a “gorda” e a “magra”. O
professor Marinho era um gaudério dos bons.gente fina mesmo.Bonachão,
com um bigode de fazer inveja, misturava a pilcha gaúcha com o abrigo
esportivo, já que era professor de educação física.Quando dava uma
folguinha corria ao carro e tirava da porta-mala o seu
violão.Milongueiro dos bons. Havia a Fabrícia e a Francisca.A primeira
era uma moça magrinha de fazer dó, porém muito competente e simpatia,
fazia par com a Professora Francisca, sua tia.Era uma senhora
cinquentona, que se colocava como mãe de todos tanto para elogiar como
para dar carraspanas se as coisas não corriam bem. Lindomara era
assistente de gabinete.Moça despachada e voluntariosa.Não queria saber
de nada se tivesse de comprar uma briga em nome do Coordenador.Uma
crítica mal colocada e a peleia era das brabas.
Embarcaram cedinho, os sete, com destino a dita escola. Lá pelas dez
horas da manhã já apresentavam certa fadiga.Estavam cansados de ouvir os
causos e piadas do professor Adroaldo.O traseiro ardia e a fome
começava a incomodar.
- Para o carro (era uma Kombi, o veículo de transporte) em uma
lancheria para que possamos comer alguma coisa e esticar as pernas, seu
Romualdo,falava a professora Lindomara que não conseguia ficar parada
muito tempo em um mesmo lugar.
Seu Romualdo era o motorista.Baixinho, de barba bem escanhoada, cabelo
detalhadamente penteado.Parecia um cantor de boate (das brabas!). Entre
“vou comer isto” e “acho que vou comer aquilo”, o professor Adroaldo
olhou daqui e dali e por fim pediu uma água mineral.Sentou-se um pouco
afastado do grupo das “meninas” só observando o local.
-Me dá um pão louco de especial com salamito e um copo de café preto,
pediu o professor Marinho e foi comer o “especial” em baixo da figueira
que ficava na frente da lancheria. Sanduíche aqui, pãozinho com manteiga
para lá, fatia de bolo àquela e Fabrícia, muito gulosa, pediu um pastel
dos grandes e um refrigerante. Conversa vai e vem e Fabrícia depois de
ter comido metade do pastel “saborosissímo”, elogia:
- Espetacular este pastel feitinho na hora.Tem até azeitona preta das
grandes! Neste instante, o professor Adroaldo chega na mesa das “gurias”
e com um tom irônico diz:
- Falem baixo, pois caso contrário o cascudo que esta no pastel da Fabrícia acorda e voa!
O silencio foi geral e acompanhado de espanto.Todas olham para o pedaço
de pastel na mão da Fabrícia.Era um cascudão daqueles bem alimentados,
duro e lustroso. O banheiro ficou pequeno para as “gurias” vomitarem até
a alma.
Passado o pânico e refeitas do acontecimento se dirigiram como uma
“carga de cavalaria” em direção ao dono da lancheria.Este estava com um
pano entre as mãos e o torcia com desespero.Encostado no balcão estava o
Professor Adroaldo (com aquela cara inocente), o professor Marinho
(tapando a boca para não mostrar o largo sorriso) e o seu Romualdo (com
uma cara de velório). Fabrícia se deslocava socando o chão, em coro com
as demais, fulminando o dono do estabelecimento com o olhar.Levantou o
dedo indicador na direção do proprietário da lancheria e quando ia abrir
a boca foi interrompida pelo professor Adroaldo.
- Calma professora! Está tudo acertado.Com o pedido de desculpas do
senhor aqui vai de graça o refri, o pastel e o cascudo de lembrança. Foi
água fria na fervura.As “meninas” ficaram sem saber o que fazer.Os três
saíram de fininho escondendo o riso de gozação pelo acontecido. As
“gurias” entram na Kombi sem dizer uma palavra, com o estômago
embrulhado, a fome já corroendo e a raiva à flor da pele pela atitude
doProfessor Adroaldo.
Na escola foram recebidos pela professora Miguelina, uma alemã possante
que efusivamente recebeu a todos e os conduziu a uma sala de aula
improvisada como refeitório. Ela tinha sido designada como diretora para
aquela escola, pois havia concluído o normal rural (um tipo de
supletivo para as professoras que não possuíam titulação).
O cardápio constituía-se de canja de galinha, arroz com galinha e
salada de batata com galinha desfiada.Como a fome era tanta, a canja de
galinha foi consumida com grandes elogios à diretora que tinha passado a
manhã preparando tudo.Só o professor Adroaldo não comia a canja
colocada em seu prato, não parava de falar e quando questionado pela sua
atitude, justificou que a viagem o havia enjoado e lhe tirara a fome.
Fabrícia com seu apetite quase doentio pediu licença para o Professor
Adroaldo perguntando-lhe se podia aproveitar e comer a canja de seu
prato.O professor com um sorriso quase diabólico, coloca o prato na
frente da colega e diz:
- À vontade colega.Se gostares de uma deliciosa canja com moela inteira, faça bom proveito!
Boquiabertos todos se entreolharam com o rosto deformado pelo espanto. A
corrida campo afora foi maravilhosa de se ver.Vômitos
compulsivos,gritinhos nervosos de nojo e desmaios ocorreram.A Professora
Miguelina se esvaía em pedidos de desculpas.O professor Marinho e o
motorista Romualdo riam e ainda criticavam a desfeita:
-Empurra a moela para o lado e continua comendo. Ela estava fechada,
porqueira.Não tem problema.A fome é tempero de qualquer comida - falava o
professor enquanto saboreava o tão badalado arroz com galinha e salada
de batata,depois sorver tão famigerada canja.
Já o professor Adroaldo sentado na sombra de uma árvore comia com
prazer um pacotinho de bolachas recheadas,com sorriso disfarçado de
satisfação sarcástica pronto para iniciar os trabalhos de supervisão.
Autor:
Renato Hirtz
CAUSO : O CHATO DA TURMA
Astrogildo era um daqueles alunos criados no interior.Por mais que
se esforçasse não conseguia perder o tipo característico de “grosso”.De
origem alemã, mantinha o sotaque carregado e aquele jeito ingênuo de
interiorano.Em se tratando de boas maneiras ou etiqueta não possuía
nenhuma.Sutiliza e “fragnômetro” passaram longe do rapaz.Em compensação,
estava sempre pronto para ajudar os colegas e professores no que
precisassem.
Apesar de ser corpulento tinha uma simpatia pueril que atraía seus
colegas.Era o colega que divertia a turma, provocando risos e levantando
o astral de todos ora com suas frases mal formuladas ou com suas
intervenções desastrosas na sala de aula.
Na sua turma, 1º ano do ensino médio, era considerado um aluno abaixo
da média, porem muito esforçado.Às vezes se tornava chato.Atrapalhava o
andamento das aulas com suas parvoíces. Com “as guria” , como dizia, era
um desastre se bem que muitas colegas o consideravam um gatinho.Não
podia abrir a boca senão estragava tudo.Se falasse era um caos.Com um
vozeirão de “alto falante de poste” , como os colegas o chamavam, dava
um susto certeiro em quem estivesse por perto ou se falasse ao ouvido de
alguém.
Quando estava numa “roda” o pessoal já ficava de sobreaviso.Gesticulava
muito quando falava e com isto não era raro dar um tabefe em alguém,
sem querer.Se chegava para cumprimentar ou abraçar um amigo a coisa
ficava perigosa.Quase esmagava a mão do sujeito ou quebrava costelas com
um “abraço amigo” .
Era um trapalhão devido ao seu tamanho e modos bruscos.Se entrava
atrasado na sala de aula, junto com o pedido de “cença” ouvia-se um
estrondo.Era a porta que ele fechava atrás de si.Se um professor o
chamava para fazer alguma coisa ou lhe entregar algo, podia contar que a
cadeira onde estava sentado ia parar no chão.
As intervenções que fazia durante as aulas eram cômicas e tiravam a
concentração da turma e provocavam largas risadas.O problema que as
perguntas que fazia eram realmente dúvidas para ele.
- “Fessora” o sujeito da frase não é o cara que faz a ação? - questiona seriamente a professora de Língua Portuguesa.
-Sim, é aquele que faz a ação.Qual a dúvida?
-E o que tem que ver o sujeito oculto se eu não sei quem é?Como vou saber se foi ele ou outro que fez a coisa?
-Calma Astrogildo.Vamos por parte.A expressão sujeito oculto.....A
professora com toda a paciência esclarece da melhor forma para
Astrogildo o significado de sujeito oculto. Nas aulas de Matemática tudo
complicava.Era muito difícil entender tantas regras e fórmulas.
-Astrogildo, pega a tua calculadora e soma para mim 7,39,mais 4,325 e
9,45.Qual é o total? Houve um breve instante de silêncio na sala e
todos dirigiram a atenção para o rapaz que não tirava os olhos da
calculadora.
-Não dá pra fazer “ssor”.A minha máquina não tem vírgula ou não “to” achando a dita.
Os colegas se entreolharam com risadinhas discretas de escárnio.O
professor forçou um sorriso amarelo, engoliu em seco e iniciou uma
explanação de como utilizar corretamente a calculadora.
E assim o Astrogildo ia levando o ano letivo, refazendo um trabalho
aqui, recuperando uma disciplina ali e superando com muito esforço os
obstáculos que vinham pela frente.
Com história, geografia e inglês as coisas iam relativamente bem.Tirava a nota que precisava para manter-se na média.
O problema pior era as aulas de biologia.Apesar de ter um interesse
quase doentio pelas aulas, seu desempenho era terrível.Adorava como o
professor ministrava as aulas, quando “borboleteava” com assuntos
paralelos a disciplina e quando, para relaxar, contava “a boazinha do
dia”.
Às vezes não entendia “de cara” a piada contada pelo professor, mas
participava da risada geral.O mais interessante, e tentava imitar, era a
“malandragem” do professor em driblar as sacanagens que os alunos
preparavam para fazer uma “gozação” sobre algum assunto ou situação em
sala de aula.
E uma certa ocasião, o professor concluía o conteúdo do bimestre que
era sobre Reprodução Humana, depois de ter respondido quase uma centena
de perguntas (a metade do Astrogildo!) e revisado certamente uma três
vezes, explicou o conteúdo que cairia na prova bimestral.
O Astrogildo entrava em pânico cada vez que ouvia a palavra prova ou
teste.Desta forma, despejou sobre o coitado do professor uma série de
perguntas relativas a prova.Com uma paciência divina o professor
procurou esclarecer da melhor forma Já trôpego e com uma certa
impaciência o mestre prepara-se para sair da sala quando o Astrogildo
questiona quase aos berros:
-“Ssor”, os genitais entram na prova?
- Sim, Astrogildo.O Capítulo sobre os Órgãos Genitais cai na prova.
- E os testículos entram também?
O professor no limite de sua paciência e já atordoado com o burburinho
característico da troca de períodos e saindo pela porta, berra:
- Se entra eu não sei, meu filho, mas que ajuda.... ajuda!
A turma cai numa gargalhada só e Astrogildo ficou sem entender nada!
Autor:
RENATO HIRTZ
CAUSO: CAÇADORA DE BORBOLETAS PERDIDAS
Lá
estávamos nós eufóricos para colocar em prática toda a teoria das aulas
de Zoologia Animal obtidas no terceiro trimestre do Curso de Biologia. O
professor extremamente exigente,com domínio fora do comum do conteúdo e
de uma didática invejável havia marcado uma pesquisa de campo e coleta
de material numa área de preservação natural localizada próximo a
instituição de ensino. Feitos todos os preparativos e com um roteiro
minucioso do que deveríamos observar, identificar e coletar .
Entramos em um ônibus e nos dirigimos para lá.Éramos em torno de
quarenta e poucos alunos com mochilas,redes para coletar borboletas e
outros insetos,vidraria para guardar coletas e uma boa porção da bobice
da juventude e do afã de obter o melhor material coleta de toda a turma.
Lá chegando, não houve tempo de escutar as últimas palavras do
professor alertando para os cuidados com o terreno e com os animais mais
agressivos ou perigosos existentes no local.
O objetivo estava muito bem definido: identificar,desenhar e descrever o
maior número de espécies e coletar o maior número de espécimes
possíveis mesmo que para isto houvesse uma verdadeira depredação animal
no local.Era o ímpeto de mostrar que sabíamos e que éramos capazes de
fazer uma excelente coleta para obter uma boa nota.
O quarteto era formado por três meninas e um rapaz que em grande
alarido se dirigiam para um aglomerado de árvores, muito fechado e quase
intransponível. Entre gritinhos e risadas sumiram em meio a vegetação e
não conseguiram ouvir o final da frase do professor orientador,nem o
reforço gritado pelo seu assistente: - Cuidado com... - Têm algumas...
Não se contou cinco minutos e ouviram-se gritos e o farfalhar dos galhos
das arvores, pássaros que alçavam vôo e a voz estridente do rapaz:
- Corre, corre e não olha para trás!Não para, larga tudo! Os outros
alunos que estavam por perto, mais o professor assistente que estava
atendendo um grupo mais adiante correram na direção dos gritos e viram o
quarteto sem fôlego saindo do mato em desabalada corrida, gritando e
gesticulando:
- Sai! Sai!
Outra menina berrava:
- Corre! Corre! E o que se viu atrás deles era uma espécie de nuvem
negra, em forma de uma seta gorda, produzindo um zumbido nervoso...
- Abelhas!
E o último a chegar ao portão da reserva foi o professor com uma leve
torção no joelho devido ao escorregão durante a maratona indesejada.
Entre uma puxada de ar e outra o professor consegue pronunciar:
-Eu avisei que naquele local havia várias colméias e que vocês deveriam
adentrar com cuidado para não provocar as abelhas, mas acho que não me
ouviram. E o rapaz com os um vitorioso brilho nos olhos olha para o
professor, aproxima-se e mostra um vidro:
- O susto foi grande, mas não perdi a viagem. Consegui capturar uma
abelha....um inseto himenóptero, apídeo e/ou meliponídeos !
O professor com a face de um rubor indescritível e produzindo um sibilo alto vociferou a um palmo do rosto do aluno:
- É... é...conseguiste um exemplar ? E pela burrice de vocês consegui dois ferrões de abelha aqui no meu pescoço!
O quarteto saiu de fininho olhando por onde pisava. E a atividade
continuou a pleno vapor, após comentários nervosos sobre o incidente.
Cassandra era uma aluna dedicada e que se destacava por dois motivos na
turma. Primeiro que obtinha excelentes notas nos trabalhos e provas e
por ter um porte avantajado.Ela era alta e....bem fortinha.Tinha uma
predileção estranha pela palavra lepidóptero que repetia sempre que
podia encaixar na sua conversa.Borboletas era a sua predileção.E no
trabalho que se desenvolvia na reserva ambiental o que mais ela
procurava para observar,descrever,desenhar e coletar eram as
lepidópteras...as benditas borboletas. E não era difícil vê-la com sua
rede correndo ou se esgueirando entre os galhos na captura de um
espécime.
Quase no final da tarde Cassandra enxerga uma borboleta branca com
desenhos em vermelho e preto. Um espécime lindíssimo.Ao som de gritinhos
sai em desabalada correria atrás do animal com a rede de coleta.Todos
ficam na expectativa da captura.A borboleta voa alto campo afora
parecendo perceber aquele gigante na sua caça.As duas se afastam do
grupo.Uma batendo asas ao sabor do vento e a outra imprimindo maior
velocidade na corrida com o pescoço esticado e olhos fixos na presa.
Neste instante o professor começa a passos largos acompanhar a
trajetória da aluna. Segundos depois ele já corre com certa dificuldade
pelo tombo ocasionado pelo incidente anterior.Os colegas começaram a ir
atrás do professor.Já era uma corrida em grupo.Aproximam-se de um local
com uma vegetação mais alta.Um capim muito verde que dava um toque
especial a paisagem.O professor gesticula e grita:
- Para! Cuidado com...
E todos viram Cassandra afundar no campo até os ombros.
-Ai! Socorro! -
O professor se aproxima quase sem ar e consegue dizer:
- Cuidado com o lodaçal!
E Cassandra já sem sua rede de captura e em pleno desespero gruda-se
nas pernas do professor que escorrega e se junta à aluna lançando lodo
para todos os lados. Agora era um dueto que pedia ajuda. Os alunos
conseguiram retirar o professor com certa dificuldade do lodaçal, mas
Cassandra com todo o seu tamanho e peso foi impossível.
Todas as táticas foram utilizadas.Só restou chamar os caseiros do local
que vieram com um minitrator e puxaram a caçadora de borboletas para
fora do atoleiro.
A tarde caía, era inverno.
Professor e aluna retornaram tiritando de frio,em pé no ônibus,para a
Universidade.Fora a tímida gozação dos colegas,pela presença do
professor e seu assistente ficou a frustração de Cassandra que não
conseguiu seu espécime mais raro e ficou até o final do curso com o
apelido de Caçadora da Borboletas Perdidas.
Autor:
Renato Hirtz
CAUSO: PARA NÃO ESQUECER
A escola era num bairro de alunos de classe média e média baixa. Todos
se conheciam, pois estudavam desde o Jardim de Infância.
Consequentemente, a amizade era de longa data.Não obstante,haviam as
rivalidades que surgiram com o passar do tempo ou com aqueles alunos que
chegavam de outras escolas. Os professores conheciam todos.
Costumes,potencialidades,dificuldades,os pais e até mesmo os avós.A
escola era uma verdadeira família e os alunos se comunicavam sem
necessitar falar tal o nível de conhecimento que possuíam uns dos
outros.
A turma era do terceiro ano do ensino médio e já se ia quase a metade
do ano. O professor Rinaldo era querido por todos e tinha uma forma
peculiar de ministrar as suas aulas que os alunos mostravam interesse e
aprendiam bastante. Havia Reginaldo,um gordinho muito safado com cara de
bebê que aprontava todas.O Severino era um magrão que esqueceu de parar
de crescer e se destacava na turma,lógico,pelo seu tamanho e um
vozeirão de amedrontar.Janira era a espoleta que acompanhava as
travessuras dos seus colegas e vivia dando gargalhadas por qualquer
coisa e José que era um problema.Esquecido,tonto e muito nervoso era
"tirado" sempre para sofrer nas mãos de seus colegas.
E foi com ele que aconteceu uma “ocorrência” das brabas num certo dia. O
professor Rinaldo estava ministrando uma “aula daquelas”, todo
concentrado e eufórico por seus alunos estarem prestando muita atenção. O
assunto era interessante para os alunos e por isto todos prestavam a
atenção.Um cochicho aqui e outro ali era o máximo que se ouvia,além da
voz do professor. José estava com os olhos e boca tão abertos olhando
para o professor falar que este lhe dirige uma pergunta:
- José está entendendo o que estou falando?
- Hein?
- Perguntei se estás compreendendo o que estou explicando?
- O quê? -Por favor, José, preste a atenção, pois desta forma perderás o “fio da meada”!
- Fio do quê? Acho que já perdi.
E, era este o grande defeito do José. Perdia tudo.Cadernos,livros,o
inseparável boné (quando não o perdia),o horário,enfim era um esquecido.
E a aula já se ia para o seu final. Haveria um intervalo e depois o
professor Rinaldo continuaria na mesma turma para mais um período.
-No próximo período usaremos o livro e anotaremos algumas coisas no
caderno, falou o professor Rinaldo. Ele mal tinha acabado de falar e
José interveio.
-Professor eu esqueci meu caderno e livro da sua matéria. Trouxe todos
os outros livros e cadernos,menos estes ! A turma caiu na risada.
- Isto é filme velho, professor, o José não esquece o que está grudado
no corpo, pois o resto já era, diz Reginaldo. E o sinal estridente do
intervalo foi ouvido. Os alunos foram para o pátio gozar de seu recreio.
No retorno do intervalo o professor Rinaldo deparou-se com um pequeno
tumulto no fundo da sala de aula e no meio dele está José branco como
papel e muito nervoso.
- O que aconteceu aí, questiona o professor em tom de voz firme.
- Olha só o que fizeram com meu material escolar professor! É uma
barbaridade! Por que não vão fazer isto com as coisas das mães deles!
José berrava já iniciando um choro de desespero. Professor Rinaldo se
aproxima do bolo de alunos que rodeiam José e sua classe, abre caminho
por entre eles e se depara com algo inusitado. Todo o material escolar
do José estava geometricamente empilhado em cima da classe atravessado,
geometricamente no centro,por um prego monumental que saia do outro lado
do tampo da mesa.
- O que é isso? Quem fez isto? Pessoal, isto é coisa que se apronte?
Quem foi o mentor e o executor desta barbárie?- professor Rinaldo
mantinha a fleuma, mas por dentro era uma cascata de risos. A cena era
insólita, indisciplinada e ao mesmo tempo cômica. Como tiveram aquela
idéia ? Indaga a turma e nada. O silêncio era fúnebre.Depois de usar de
todos os seus artifícios de educador e até uma veia longínqua de
policial,o professor determinou que chamassem a diretora da escola para
solucionar o caso.
Lá veio a professora Ernestina. Uma dama no trato com os
alunos.Calma,firme e comedida em suas palavras e ações ouviu atentamente
o relato do professor. Parou em frente a turma,olhou no rosto de
todos,respirou profundamente e com um esboço de sorriso tímido se
dirigiu candidamente para Reginaldo e disse:
-Por favor, Reginaldo, pegue seu material e me acompanhe até a sala da Direção sem discussões prévias.
Reginaldo num vermelhão pegou seus livros e cadernos, colocou embaixo do braço e saiu em direção ao corredor.
-Por favor, José, disse a diretora, pegue seu material e se dirija, também, a sala da direção.
-Sim senhora, estou indo...para onde mesmo ?
E a turma veio abaixo numa gargalhada sonora quando José agarrou seu
material para colocar embaixo do braço e a classe veio junta. A diretora
e o professor não agüentaram ver a cena dantesca e tiveram que se unir
aos risos da turma.
-Desculpe, esqueci que pregaram meu material na classe.
Na sala da direção a professora Ernestina questiona Reginaldo:
-Por que pregaste o material do José na classe?
Reginaldo sentado em frente à diretora levanta os olhos com aquela carinha de bebe e dispara:
- Todo o mundo diz que o José esquece tudo, só não esquece o que está
pregado no corpo. Preguei o material dele na classe para ele não
esquecer em casa.
- Três dias de suspensão e só volta com o pai e a mãe, e vê se não esquece!
E José olha par a diretora e pergunta ansiosamente ?
- E porque mesmo a senhora me chamou aqui ?
Autor:
Renato Hirtz
CAUSO: DISCURSO DE “CONTIÚDO”
Rubião foi eleito vereador por seus méritos, pelo seu esforço e pela participação efetiva nas ações realizadas em prol dos menos favorecidos da sua cidade. Criado pelo mundo, muito cedo teve que trabalhar e em vista disto afastou-se dos estudos quando estava na 3ª série do antigo primário. Matuto, de cultura reduzida, nunca se interessou em continuar seus estudos e com isto, tornou-se um indivíduo tido como “ignorante”, “grosso” e em bocas pequenas “muito burras”, mas era esforçado o vivente
A escola da vida e talvez, o seu instinto de preservação é que o auxiliavam na sua carreira política.Chegou a ser presidente da comissão de obras na egrégia câmara de vereadores de sua cidade.
Certa feita, acompanhando um engenheiro de obras para a verificação da
construção de uma ponte de vão considerável no município, aprontou uma
das suas.feitas as devidas medições e avaliações topográficas foi
constatado que a edificação da referida ponte não poderia ser de
madeira, como desejava o Rubião.Seria inviável e naquele caso haveria a
necessidade de ser construída uma ponte de concreto armado, com
pilastras e outros recursos de engenharia.
-Mas como não dá? Dá sim.Coloca uns troncos bem grossos e uns “taubuão”
e ta feita à ponte, retrucou o Rubião. O Rubião já olhava para o
engenheiro com um ar de impaciência.
Este, por sua vez, vendo que não adiantava tentar esclarecer, em detalhes, o nobre edil tentou simplificar a explicação.
-Caro vereador.A largura e o comprimento da ponte é muito grande.Por
aqui passarão carros e caminhões pesados.Uma ponte construída com
madeiras não suportará o peso e, além disso, há a Lei da Gravidade.Vai
vir tudo abaixo.
Imediatamente Rubião, com um ar de soberba e satisfação, em alto e bom som rebate.
-Meu amigo doutor, se o “ploblema” é esta tal de Lei, faço um projeto
de lei na câmara e eu e meus “cumpanheiro” “revoguemo” a dita! Não tem
“ploblema”.
O engenheiro e os que estavam ao redor se entreolharam e foram saindo
de mansinho, escondendo os risos entre as despedidas e abraços
formais.Rubião não perdendo a pose, abre o vidro do carro e grita para o
engenheiro:
- “Decha” comigo doutor.Me dá uns 15 dias e está “Lei de Gravidade” ta revogada ““.
Outro dia, por força de protocolo foi convidado para participar de uma
reunião sobre “Problemas de Segurança Pública no Município”.Assunto que
estava em alta no momento, merecendo a atenção das autoridades. Na
reunião estavam presentes o Prefeito, o Presidente da Câmara de
vereadores, o Juiz de Direito da Comarca, o Promotor, o Delegado de
Polícia, Advogados, Professores, Presidentes de Associações e o Rubião
que fazia parte da Comissão de Segurança do Município, também.
Reunião iniciada e ouviram-se as considerações de cada uma das
autoridades presentes, colocando seus anseios, problemas e soluções para
o problema que estava sendo tratado. Rubião, no seu íntimo, ficava
admirado quando ouvia alguém falar bonito.E pegava daqui e dali alguns
termos e expressões que achava interessante e que lhe soava bem aos
ouvidos. E não havia dúvida.Podendo emprega-las ao longo de seus
discursos, assim o fazia.Não interessava que as palavras ou expressões
se encaixassem de forma correta ou não ao assunto que estava tratando.O
importante para ele era falar bonito e impressionar quem o estivesse
ouvindo, positiva ou negativamente (o que acontecia na maioria das
vezes).
E lá pelas tantas, o coordenador da reunião passa a palavra ao
Rubião.Aprumou-se na cadeira puxa o “nicrofone” e inicia sua fala:
-Meus senhores e minhas senhoras.Não vou dizer o nome de cada um, pois
levaria muito tempo e o “ploblema” é estrutural.A “cromplexidade” do
“ploblema” é tanta que não sei por onde devo começar a “reatar” cada uma
das partes de provocam tal situação.O importante é identificar se as
atitudes das autoridades do “municips” esta ou não de acordo com a
legalidade das ações que devem eliminar o “ploblema” que ora “aflége” a
população menos assistida.O certo é que uma coisa é uma coisa e outra
coisa é outra coisa e não vamos misturar as coisas se não vai ficar tudo
na mesma coisa.Uns “prende”, outros vão lá e “soltam os bandidos” e
ainda tem outros que condenam os bandidos e os “dvogados” vão lá e
tentam soltar de novo.E aí “se conséste” a problemática do “ploblema”
.Tem que prende e deixa preso, sem os “dvogado” se mete à tira eles de
lá.E tenho dito.
O silêncio era divino.As pessoas que ali estavam levaram alguns
segundos para absorver a tamanha profundidade da intervenção do
caríssimo vereador.Estavam estáticas até que alguém resolve bater palmas
timidamente e ser acompanhado por outros.
Até hoje não se sabe se a salva de palmas foi pela brilhante
intervenção do Rubião ou para que se pusesse um fim naquela reunião
malfadada.
Autor:
Renato Hirtz)
CAUSO: FESTA DE NATAL
A escola ficava localizada no centro de uma vila.Era um prédio todo
de alvenaria e ostentava certa opulência pelo tamanho e arquitetura.As condições físicas eram muito boas.Era considerada uma escola padrão.
Alexandrina era uma professora de carreira que chegou a diretora por
seus méritos.Dona de uma vitalidade sem igual não parava de incentivar
os professores, promover atividades com os alunos e encontros de
integração entre a comunidade escolar.
Certa feita, preocupada com os parcos recursos destinados a escola,
resolveu organizar um CPM (Círculo de Pais e Mestres).A tarefa não foi
assim tão fácil.Na primeira reunião apareceram quatro
pessoas.Alexandrina não desistiu.Na entrada e saída dos alunos parava no
portão e quase pegava os pais pelo pescoço para fazer uma verdadeira
evangelização com vistas à formação do tão necessário CPM. Nova data foi
marcada para a reunião onde seriam formadas as chapas para eleição da
diretoria do COM.
Para desânimo da pobre professora Alexandrina oito pais e dois
professores compareceram ao encontro.Porém, um dos pais, com grande
entusiasmo assumiu a liderança da reunião e quase no grito, pressionando
outros pais, formaram uma chapa.E era a única chapa. Com grande esforço
e utilizando-se do dia da entrega dos boletins, consumou-se a eleição e
a vitória, é claro, da chapa única.
O presidente, senhor Arydolvino (“com y, por favor”) homem de boa e
chata conversa, no outro dia deu início ao tramites legais para
regularizar o COM junto aos órgãos competentes. E Arydolvino, com todo o
entusiasmo passou a conviver junto com a direção, professores e alunos o
dia-a-dia da escola.Na entrada dos alunos, lá estava ele junto com o
coordenador de turno, fiscalizando.No recreio, lá estava ele orientando
as atividades e fazendo a “segurança” dos alunos.O Arydolvino estava
presente até na hora da distribuição da merenda “verificando” se os
alunos comiam ou não.Só não participava das reuniões pedagógicas e
administrativas devido a admoestações que sofrera por parte dos
professores.
Apesar de tudo isto, ele tinha que ser suportado.Era Presidente do COM e
em prol da escola, não havia dúvidas, trabalhava bastante.Havia
conseguido material esportivo, de audiovisual, alimentos e verduras para
complementar a merenda com doações de comerciantes da comunidade.Era
chato e metido, mas conseguia o que queria em prol da escola. Entre umas
mazelas e outras, a coisa ia andando.Aproximava-se o final do
ano.Arydolvino queria fazer uma grande festividade de
encerramento.Deveria ser uma atividade pedagógica-cultural fabulosa e
marcante.
E daí para frente às atividades do presidente entraram em um ritmo
frenético.Até nos planejamentos de final de ano, dos professores, ele
queria dar o seu “pitaco”.Fazia contatos com comerciantes, industriais e
políticos para arrecadar brindes, presentes, balas e doces para a festa
de Natal. Tinha-se a nítida impressão que o Arydolvino estava à beira
de um enfarto.Nas reuniões do CPM sugeria, aprovava e partia para a ação
mesmo sem o aval dos outros membros da entidade. -Dona Diretora, já
“tamos” com o pão e a salsicha, “prôs cachorro”.O bolo de Natal tá
feito.Três padarias vão fazer cada uma um bolo, a gente “imenda” e “taí”
o bolão! A Diretora mal absorvia uma informação e já vinha outra em
atropelo. -Os “brindis já temos um pouco” e bala para gurizada não vai
“falta”.Faz-se pacotinhos e pronto.Vamos “faze “ mais uns “pras
emergência” e para os furões.
O planejamento das professoras era muito mais pedagógico do que
festivo.Cada turma faria sua apresentação aos pais, que seriam
convidados, e o encerramento seria entoar a tradicional “Noite Feliz” e
depois haveria uma confraternização singela com comes e bebes.O mais
importante seria a distribuição de roupas e alimentos, recolhidos pelos
alunos, a uma instituição de caridade da comunidade escolhida através de
uma votação. Mas o Arydolvino queria algo grandioso!E para arrematar
sua programação informa a Diretora: _E tem mais, Dona Diretora.O Papai
Noel, que serei eu, descerá de helicóptero no pátio da escola, jogando
papel picado e balas para a gurizada.Só vamos fechar os portões pra
festa ser só dos nossos alunos. No dia marcado para a festa o calor era
insuportável.Mesmo não acreditando na programação do seu Arydolvino,
tudo foi preparado.Local para o trono do Papai Noel, o bolo colocado em
uma mesa enfeitada, as caixas com os brindes, com os doces e as balas.E
todos os alunos foram organizados em filas para esperar o tal Papai
Noel.
Para espanto de todos um helicóptero sobrevoa a escola jogando papel
picado e com um vôo rasante caem pacotes de balas no pátio.Não houve
quem segurasse aproximadamente 600 alunos.
Helicóptero pousa e seu Arydolvino vestido de Papai Noel desce da
aeronave.É praticamente amarrotado pela massa de crianças fazendo
pedidos, querendo toca-lo, dar um abraço e ganhar um beijinho. Quando o
Papai Noel consegue sentar no seu trono o pavor toma conta daqueles que
estavam auxiliando-o.
Pelos muros surge uma massa de crianças, jovens e adultos querendo um
presente do velho Noel.Era uma correria.O Noel pingando de suor e já
apavorado gritava:-Traz mais bala.Não me deixa sem bala! Os brindes me
tomaram todos!
A diretora, branca como giz, em pânico bradava por sua vez: -Calma
gente! Por favor, tragam mais pacotinhos de bala!Mais bala! E alguém
responde, com tremendo terror: -O bolo não resistiu ao ataque!”.Os
brindes evaporaram! E as balas estão terminando!”.
A diretora em total alucinação, suando de calor e de pavor esbraveja: -Chama a Brigada que vão matar o Papai Noel!
Autor: Renato Hirtz
CAUSO: PESO PESADO COMPLICADO
Romildo era um dedicado supervisor da disciplina de
Educação Física.Trabalhava numa equipe de supervisores de uma
Coordenadoria de Educação do interior. Tinha um tamanho descomunal devido
às práticas desportivas, principalmente no atletismo. Com quase 25 anos
de dedicada carreira com excelentes e pesadíssimas aulas de Educação
Física estava agora transmitindo aos seus pares suas experiências.
Era um pesadão e de uma meiguice sem igual.Vivia buscando novidades,
técnicas e não poupava esforço para manter as escolas da região com
estes conteúdos e com o necessário material esportivo.Buscava apoio
daqui e dali e mantinha exaustivos contatos com a Secretaria de Educação
para conseguir com que as escolas ficassem supridas com o material
devido.
Durante a semana vivia com seus outros três colegas supervisores, da
mesma disciplina, seja de ônibus, carro oficial ou mesmo de carona
visitando as escolas, promovendo torneios na região e realizando
acampamentos escolares de férias com alunos e professores. Mesmo com
toda esta atividade era pesadão. Um verdadeiro atrapalhado devido à força
descomunal promovida por seus músculos. Por mais que cuidasse, sempre
causava algum estrago. Se ia abraçar alguém quase quebrava a pessoa ao
meio.Se ia consertar alguma coisa... Não havia esperanças.T erminava
quebrando outra. Suas mãos eram verdadeiros tijolos.
E por tudo isto, certa ocasião, chegou na sala do coordenador com a palanca da viatura na mão.
-Com licença senhor coordenador.Aconteceu um probleminha. O coordenador
gelou, pois probleminha com o Romildo era sinônimo de
problemão.Questionado o Romildo, sem jeito e com aquele sorriso
angelical, tremendo as bochechas e girando a peça na mão diz:
-O motorista não veio e eu precisei usar a viatura.Não sei o que
houve.Fui engatar a marcha e fiquei com a palanca na mão.
- Bom se o problema é este, fala com a chefe administrativa e pede uma
autorização para levar a viatura para o conserto.Isto acontece.
-Mas não é só isto.Na hora que fui sair do carro o banco quebrou.
O coordenador já irritado aumenta o tom de voz e exclama:
-Manda o Zé mecânico arrumar também.
-Mas tem mais uma coisinha, diz Romildo sentindo o calor percorrer seu
corpo e o suor escorrer por baixo da camisa.Quando o banco quebrou, o
senhor sabe, eu tenho 130 quilos, o assoalho da viatura cedeu e
abriu...ficou um baita buraco e fui literalmente ao chão.
-Chega! Manda arrumar tudo e não chega mais perto da viatura. Anda de
ônibus ou caminhão, mas não pega mais a viatura!
O Romildo, muito encabulado, pede desculpas pelo ocorrido e sai da
sala.Ao fechar a porta, como sempre, não mede a força com que puxa a
porta e...um estrondo.A porta fecha com um baque tremendo. O Romildo olha
para a secretária que iria entrar na sala e sorri envergonhado lhe
entrega a maçaneta.
-Senhor coordenador abra a porta por dentro, por favor, que houve um probleminha!
Dias depois, o Romildo se preparava para ir a uma nova visita numa das
escolas de um município pertencente à região da Coordenadoria. Iria ele
mais três colegas. Inclusive ficariam por lá uns três dias, promovendo um
evento esportivo. Bem cedo rumaram para o seu destino.
No meio do caminho pararam para fazer um
lanche, pois tinham tomado café cedinho da manhã. O restaurante, na
beira da estrada, era daqueles de encher os olhos de qualquer pessoa
gulosa.Havia desde torresmo até torta de bolacha. Romildo começou a comer
torresmo e parou na famosa “torta de mocotó”. Era uma receita quase
secreta do dono do restaurante feita com creme do mocotó gelado ou coisa
parecida. Não deixou de tomar um bom suco de laranja e de rebate um café
preto ao final. Os colegas lembrando que não poderiam ficar ali por
muito tempo foi o basta para a gulodice do Romildo.
A escola era bem modesta, daquelas tipicamente
rural.A reunião com os professores, diretora e alguns alunos líderes de
turma começou às 14 horas.O que o Romildo comeu no almoço, não vamos nem
comentar.Foi coisa de assustar.Já iam 30 minutos de reunião resolvendo
como seria o encontro esportivo, Romildo sente um calafrio, com aquele
suor frio, acompanhando de uma cólica infernal.Parecia que a sua barriga
estava invertendo de posição.
-Preciso ir ao banheiro, disse Romildo pálido que nem papel e derrubando a cadeira ao levantar.
-A casinha fica do lado de fora do prédio, pois os banheiros estão em reforma.São duas, mas não...
A diretora não terminou de falar a frase e o que se viu foi àquela
montanha feita gente em desabalada carreira porta fora.
Em questão de segundos ouviu-se um estrondo. Todos correram para fora e
viram o quadro da dor sem moldura.Uma das casinhas caída para trás,
Romildo tentando sair de dentro, entalado com as calças nas mãos e todo
borrado.
-Eu ia dizer que a primeira casinha não era para usar que estava com o alicerce podre!
A tarde passou e com ela Romildo muito envergonhado com um calção
emprestado por um dos alunos,sentado quieto como nunca,olhando sua
camisa,cuecas e calças secando numa cerca de arame enfarpado.
(RENATO HIRTZ)
CAUSO : SÓ ENCRENCAS!
Josivaldo era motorista contratado como funcionário público para
atender o pessoal de uma coordenadoria de ensino lá do interior. Era o
sonho daquele rapaz criado na roça, mas que não conhecia dificuldades,
pois a família tinha uma boa situação financeira.Os pais eram
plantadores de soja e o menino sempre teve o necessário. Sempre foi
considerado “muito louco” e aprontava das suas.Sua fascinação era por
automóveis.
Quando começou a alcançar nos pedais da camioneta e do trator de
propriedade de seu pai, não teve quem o segurasse.Uma vez o velho pai
teve e busca-lo na Delegacia de Polícia, pois estava dirigindo
perigosamente sem habilitação.
O Josivaldo tinha fama de “barbeiro”.Só conseguiu passar no teste de
direção na 5ª vez em que prestou prova prática.Era um horror.Conseguiu,
entretanto, ser contratado para o tão sonhado cargo: motorista! Apesar
de tudo isto, ele adorava o que fazia, mas fazia muito mal.Estava sempre
no horário, com a viatura sempre brilhando e cheirosa internamente.Não
descuidava da sua aparência por causa das gurias.Este era um
problema.Não podia ver um rabo de saia que se alvoroçava todo.Ficava
doido mesmo.
Com a tabela de horários e compromissos do coordenador nas mãos, ficava
de plantão na frente do prédio da coordenadoria, encostado na
viatura.Aproveitava o tempo para ouvir um “som” e cuidar das gurias que
passavam pelo local..
Numa manhã, o Coordenador deveria sair mais cedo do que o horário
habitual, devido a um compromisso num município vizinho.Deveria
inaugurar uma escola e receber uma homenagem da Câmara de Vereadores do
local.Não poderia chegar atrasado a cerimônia, pois seria uma falta de
respeito para com as pessoas.
Quem chegou atrasado foi o Josivaldo, com cara de sono, banho recém
tomado, bafejando e temendo por uma reprimenda severa do coordenador. E
não deu outra, o coordenador esbravejava, batia com os punhos nas
pernas, sapateava e em seu terno azul marinho, suava aos cântaros.O
cabelo lateral, comprido que era usado para disfarçar a calvície teimava
em cair para o lado dando um aspecto cômico a figura do coordenador e
com isto ficava mais furioso.
-Chega de “lero-lero” e toca em frente.Não podemos chegar atrasado.Vamos logo, rapaz.
Colocou o cinto de segurança e se ajeitou no banco. Josivaldo acelerou o
carro tudo o que podia e largou a embreagem de sôco.A viatura já
desgastada pelo uso trepidou e deu um solavanco brutal para frente.O
banco do carona, onde estava o coordenador, deu um estalo e caiu para
trás.Com o susto, o Josivaldo deu uma freada daquelas e o banco solto
com o coordenador foi parar embaixo do painel.A situação era trágica e
ao mesmo tempo cômica.Literalmente estufado de ódio, preso pelo cinto de
segurança, lívido de raiva o coordenador berra:
-Me tira daqui, seu imbecil.Quem foi que te ensinou a dirigir,
mula!Olha o meu estado! Olha como ficou a minha roupa!Vamos logo...!
Retirado com certa dificuldade da situação em que se encontrava,
iniciou-se o trabalhado de consertar o banco quebrado.Como não havia
ferramentas, o jeito foi arranjar um pedaço de arame e tentar solucionar
o problema.Não havia como viajar no banco traseiro já que estava
ocupado com material escolar que seria levado para a escola a ser
inaugurada.Arrumado o banco lá se foram estrada afora. Depois de rodar
por uns 15 minutos o Coordenador já estava suando aos cântaros, devido
ao esforço que fazia para se manter sentado e ao mesmo tempo manter o
banco no lugar.Cada reduzida de marcha ou aceleração o banco ia para
frente e para trás.Rodados alguns bons quilômetros, com certa
tranqüilidade, o Josivaldo mais preocupado com o “som” (o rádio) do que
com a estrada, não vê um buraco no asfalto e acerta-o em cheio.O estouro
do pneu é inevitável.E a fúria do coordenador chega quase as vias de
fato.Ele queria pegar o Josivaldo pelo pescoço e estraçalhá-lo.
-Não fala nada!Se disseres alguma coisa, não respondo por mim, troca o pneu rápido e não abre este teu bico.
O Coordenador espumava de raiva sob o Sol escaldante.Josivaldo tremia
de raiva e praguejava que só com ele aconteciam aquelas coisas.Em
verdadeiro atropelo iniciou a troca do pneu estourado.Mas sua saga não
havia terminado.Girou a manivela do macaco e retirou o rodado.Girou mais
um pouco a manivela do macaco e ouviu-se um estalo.Tudo veio abaixo.O
eixo da roda ficou cravado no asfalto.O macaco havia quebrado.
O coordenador sapateava, soqueava o ar, dava pontapés para um lado e
para outro e imaginava como seria chegar atrasado ao ato oficial.Suado,
cansado, amarrotado e escabelado, espumava. Josivaldo no meio da
estrada, gesticulava os braços para parar outro carro e pedir
ajuda.Conseguida a ajuda com um agricultor da vizinhança retornaram a
estrada.Nestas alturas eles voavam.Era total a loucura para vencer o
percurso que faltava.Quando se aproximavam do local, em desabalada
carreira, visualizaram uma pequena multidão reunida na frente da escola
que seria inaugurada.
E o pior aconteceu. Ao sair do asfalto para pegar a rua de acesso à
escola, não houve condições de frear o carro.Josivaldo até tentou,
coitado.A viatura derrapou como se estivesse numa estrada de sabão e foi
parar, envolto em uma poeira só, quase debaixo do palanque. O
Coordenador,em meio à poeira, moído de raiva e com uma vergonha de dar
dó, sai da viatura todo amarrotado e coberto de pó..Para completar a
cena, alguém grita do meio da pequena multidão:
- É o Senhor Coordenador de Educação!
Ele não sabia o que fazer.Ao mesmo tempo em que acenava com uma das
mãos agradecendo a salva de palmas,limpava-se com a outra, sorria e
fulminava com os olhos o Josivaldo. Este atordoado com a situação sai da
viatura e com um orgulho quase ingênuo diz, sorridente em meio ao som
de uma banda marcial desafinada:
-Viu, não disse que chegaríamos na hora certa!Eu sou o cara !
(Autor Renato Hirtz)
CAUSO: FESTA DE NATAL
A escola ficava localizada no centro de uma vila.Era um prédio todo
de alvenaria e ostentava certa opulência pelo tamanho e arquitetura.As
condições físicas eram muito boas.Era considerada uma escola
padrão.
Alexandrina era uma professora de carreira que chegou a diretora por
seus méritos.Dona de uma vitalidade sem igual não parava de incentivar
os professores, promover atividades com os alunos e encontros de
integração entre a comunidade escolar.
Certa feita, preocupada com os parcos recursos destinados a escola,
resolveu organizar um CPM (Círculo de Pais e Mestres).A tarefa não foi
assim tão fácil.Na primeira reunião apareceram quatro
pessoas.Alexandrina não desistiu.Na entrada e saída dos alunos parava no
portão e quase pegava os pais pelo pescoço para fazer uma verdadeira
evangelização com vistas à formação do tão necessário CPM. Nova data foi
marcada para a reunião onde seriam formadas as chapas para eleição da
diretoria do COM.
Para desânimo da pobre professora Alexandrina oito pais e dois
professores compareceram ao encontro.Porém, um dos pais, com grande
entusiasmo assumiu a liderança da reunião e quase no grito, pressionando
outros pais, formaram uma chapa.E era a única chapa. Com grande esforço
e utilizando-se do dia da entrega dos boletins, consumou-se a eleição e
a vitória, é claro, da chapa única.
O presidente, senhor Arydolvino (“com y, por favor”) homem de boa e
chata conversa, no outro dia deu início ao tramites legais para
regularizar o COM junto aos órgãos competentes. E Arydolvino, com todo o
entusiasmo passou a conviver junto com a direção, professores e alunos o
dia-a-dia da escola.Na entrada dos alunos, lá estava ele junto com o
coordenador de turno, fiscalizando.No recreio, lá estava ele orientando
as atividades e fazendo a “segurança” dos alunos.O Arydolvino estava
presente até na hora da distribuição da merenda “verificando” se os
alunos comiam ou não.Só não participava das reuniões pedagógicas e
administrativas devido a admoestações que sofrera por parte dos
professores.
Apesar de tudo isto, ele tinha que ser suportado.Era Presidente do COM e
em prol da escola, não havia dúvidas, trabalhava bastante.Havia
conseguido material esportivo, de audiovisual, alimentos e verduras para
complementar a merenda com doações de comerciantes da comunidade.Era
chato e metido, mas conseguia o que queria em prol da escola. Entre umas
mazelas e outras, a coisa ia andando.Aproximava-se o final do
ano.Arydolvino queria fazer uma grande festividade de
encerramento.Deveria ser uma atividade pedagógica-cultural fabulosa e
marcante.
E daí para frente às atividades do presidente entraram em um ritmo
frenético.Até nos planejamentos de final de ano, dos professores, ele
queria dar o seu “pitaco”.Fazia contatos com comerciantes, industriais e
políticos para arrecadar brindes, presentes, balas e doces para a festa
de Natal. Tinha-se a nítida impressão que o Arydolvino estava à beira
de um enfarto.Nas reuniões do CPM sugeria, aprovava e partia para a ação
mesmo sem o aval dos outros membros da entidade. -Dona Diretora, já
“tamos” com o pão e a salsicha, “prôs cachorro”.O bolo de Natal tá
feito.Três padarias vão fazer cada uma um bolo, a gente “imenda” e “taí”
o bolão! A Diretora mal absorvia uma informação e já vinha outra em
atropelo. -Os “brindis já temos um pouco” e bala para gurizada não vai
“falta”.Faz-se pacotinhos e pronto.Vamos “faze “ mais uns “pras
emergência” e para os furões.
O planejamento das professoras era muito mais pedagógico do que
festivo.Cada turma faria sua apresentação aos pais, que seriam
convidados, e o encerramento seria entoar a tradicional “Noite Feliz” e
depois haveria uma confraternização singela com comes e bebes.O mais
importante seria a distribuição de roupas e alimentos, recolhidos pelos
alunos, a uma instituição de caridade da comunidade escolhida através de
uma votação. Mas o Arydolvino queria algo grandioso!E para arrematar
sua programação informa a Diretora: _E tem mais, Dona Diretora.O Papai
Noel, que serei eu, descerá de helicóptero no pátio da escola, jogando
papel picado e balas para a gurizada.Só vamos fechar os portões pra
festa ser só dos nossos alunos. No dia marcado para a festa o calor era
insuportável.Mesmo não acreditando na programação do seu Arydolvino,
tudo foi preparado.Local para o trono do Papai Noel, o bolo colocado em
uma mesa enfeitada, as caixas com os brindes, com os doces e as balas.E
todos os alunos foram organizados em filas para esperar o tal Papai
Noel.
Para espanto de todos um helicóptero sobrevoa a escola jogando papel
picado e com um vôo rasante caem pacotes de balas no pátio.Não houve
quem segurasse aproximadamente 600 alunos.
Helicóptero pousa e seu Arydolvino vestido de Papai Noel desce da
aeronave.É praticamente amarrotado pela massa de crianças fazendo
pedidos, querendo toca-lo, dar um abraço e ganhar um beijinho. Quando o
Papai Noel consegue sentar no seu trono o pavor toma conta daqueles que
estavam auxiliando-o.
Pelos muros surge uma massa de crianças, jovens e adultos querendo um
presente do velho Noel.Era uma correria.O Noel pingando de suor e já
apavorado gritava:-Traz mais bala.Não me deixa sem bala! Os brindes me
tomaram todos!
A diretora, branca como giz, em pânico bradava por sua vez: -Calma
gente! Por favor, tragam mais pacotinhos de bala!Mais bala! E alguém
responde, com tremendo terror: -O bolo não resistiu ao ataque!”.Os
brindes evaporaram! E as balas estão terminando!”.
A diretora em total alucinação, suando de calor e de pavor esbraveja: -Chama a Brigada que vão matar o Papai Noel!
(Autor: Renato Hirtz)
DEPILAÇÃO A FOGO (CAUSO)
Doutor
Francisco era o nome do presidente do Círculo de Pais e Mestres de uma
escola privada, comandada por uma congregação de freiras.Era uma
instituição de porte médio, muito bem organizada e com objetivos bem
definidos, tanto pedagógicos como administrativos. Doutor Francisco era
um cirurgião dentista bem afamado que dedicava parte de seu tempo
colaborando com o colégio onde estudavam seus filhos.Organizava festas,
almoços, jantares e atividades integradoras tanto para alcançar fundos
para a construção de um novo pavilhão, como para a confraternização dos
integrantes da comunidade escolar. Homem alto, com uma cabeleira
grisalha, mito bem cuidada, barba bem aparada e de uma simpatia sem
igual.Era incapaz de levantar a voz com quer se fosse, mesmo em
situações difíceis.Sua calma era invejável e sua ponderação
inigualável.Sabia conduzir um debate ou uma discussão de modo que ao
final todos saiam satisfeitos.Era querido por todos e muito determinado,
apesar de parecer lento em suas decisões.
Certa feita foi lançada a
idéia de realizar-se uma quermesse com o intuito de arrecadar dinheiro
para as reformas do refeitório, adquirir um fogão industrial novo e um
forno elétrico.O Forno a gás já era bastante velho e poderia acarretar
algum perigo quando colocado em funcionamento. Imediatamente o Doutor
Francisco e os demais participantes do CPM (Circulo de Pais e Mestres),
reuniram-se para deliberar as ações que deveriam ser tomadas para que a
atividade ocorresse com sucesso. Surgiram uma série de sugestões de
bancas, tendas e outras atrações que dariam um diferencial a festa. O
ponto culminante seria um almoço).
Distribuídas às funções de cada grupo
entre pais, professores e alunos todos iniciaram suas programações.Como
arrecadar brindes, construir suas tendas e barracas e assim por
diante.O grupo dos pais que formavam o CPM se encarregou de fazer o
almoço. Eram em número de oito os integrantes da diretoria.Seis homens e
duas mulheres.Reunidos, acertaram o cardápio que seria frango assado
(no forno), lasanha, arroz branco e outros complementos.
Um dia antes do
grande evento, a escola apresentava-se com um grande alvoroço.Todo o
mundo se agitava preparando as tendas, barracas e a decoração do
pátio.Todos trabalhavam com alegria e integração. No outro dia pela
manhã, bem cedo, o Doutor Francisco lá estava com uma roupa apropriada
para o trabalho.Todos estavam ocupados em limpar os frangos, cortá-los,
colocá-los no molho temperado, montar as lasanhas, preparar o arroz e as
saladas.
A festa iniciou às oito horas com apresentações artísticas.As
pessoas iam chegando e quermesse se animava aos poucos. No refeitório da
escola, Doutor Francisco dá a ordem para colocar os frangos e lasanha
para assar. O forno deveria ser aceso. Lá foi o Doutor Francisco acender o
forno e nada. O forno não acendeu.
-Deixa comigo, disse um outro pai. E
abre o registro e ascende um palito de fósforo e nada.
-Acho que é
problema no bico. Deve estar entupido. Mexe daqui e mexe dali e nada. Vai
um e vai outro pai tentando acender o bendito forno e nada. Após várias
tentativas, o Doutor Francisco resolve fazer a última tentativa. Acende
um palito de fósforo e se aproxima da boca do forno, com toda a calma. Houve-se um “bum” acompanhado de uma grande labareda de fogo que sai
de dentro do forno. Com um grito o Doutor Francisco cai sentado no chão e
ouve-se um coro de vozes dizendo “Oh!”. Todos correram em direção ao
Doutor Francisco e a imagem que viram era extremamente cômica. O Dr.
Francisco branco como cera, estava sem sobrancelhas, cílios, barba e só
com a metade do cabelo, da cabeça para trás. Estava literalmente
depilado.
Levado a um posto de saúde próximo foi constatado que nada de
mais grave havia a acontecido, apenas uma pomada foi receitada para
passar no rosto. Ao retornarem para a escola e ao entrarem no
refeitório, para espanto de todos, o forno estava aceso e pronto para
ser usado. Doutor Francisco com sua tradicional calma olha para todos,
com seu rosto lustroso devido à pomada e com uma cara de extraterrestre
diz:
-Vamos lá pessoal ! Ainda bem que só perdi os pelos da parte de
cima! E a depilação nem doeu!
AMERENDA (causo)
A
professora Maria Linda trabalhava em uma escola da periferia. A turma
da 4ª série era formada por trinta e oito alunos e Linda como era
chamada era uma professora dedicada,minuciosa e que impunha uma
disciplina rígida aos seus pupilos. Desde a forma de entrar em sala de
aula, a postura, os cadernos e livros, o cuidado com a vestimenta e com a
linguagem e atitudes, tudo era levado muito a sério pela docente assim
como respeitado pelos estudantes.
Fazia um trabalho muito apreciado
pelos pais e deles tinha total apoio para tanto. Não media esforços para
trazer uma novidade aos alunos, promover um passeio, fazer uma
festinha, assistir um filme na sala de audiovisual improvisada. Era a
forma de premiar seus “filhos” quando apresentavam bom rendimento na
aprendizagem. Os alunos eram carentes, mas ela os incentivava a terem amor
próprio e a dar valor as pequenas coisas e ao pouco que
possuíam, preservando assim os valores tão esquecidos.
Certa vez, por um
problema administrativo, faltou merenda na escola por quase um mês. Foi
um horror. Linda foi a luta e conseguiu, por doação pacotes de bolachas
com as quais mantinha uma certa alegria na hora da merenda. Dividia
fraternalmente cada pacote entre as crianças da sua turma e comentava a
importância de saber dividir com o outro, nas horas difíceis.
Passado
cerca de trinta dias, chega um caminhão trazendo os gêneros
alimentícios. Todos os alunos daquele turno ficaram alvoroçados e os
maiores se prontificaram para ajudar a descarregar o caminhão e ajudar a
organizar os produtos na pequena sala junto a não menos pequena cozinha
da escola. Foi um verdadeiro trabalho de formigas.
No outro dia, a
expectativa não era o conteúdo novo que a professora iria ministrar nem a
hora do conto na biblioteca ou o campeonato de futebol que se
desenvolvia entre as turmas. O foco das atenções era a hora da merenda
para poderem saborear novamente os quitutes que a tia Maria preparava
como ninguém. O sistema de distribuição da merenda era seguido
rigorosamente. Começa pelos alunos do Jardim de Infância, a primeira
série e as demais turmas sucessivamente. Os maiores, da 4ª série em
diante, merendavam na própria sala de aula. A cada dia um aluno era
encarregado de buscar a bandeja com a alimentação. Naquele dia Josiel foi
escolhido para a tarefa. Porém, Josiel era aquele tipo de aluno
tímido, nervoso e quase tudo o que fazia não dava certo.
Mesmo sob
protesto dos demais colegas lá foi Josiel buscar a tão esperada merenda.
Com todo o cuidado o menino pegou a imensa bandeja com as terrinas
cheias de uma sopa deliciosamente cheirosa. Marcava passo na direção da
sala de aula rezando para todos os santos evitando sacolejos e um
possível acidente. Quando chegou na porta da sala de aula foi recebido
por uma manifestação estridente dos colegas e sob os gritos da
professora Linda\;
- EHHHHHHH! - CALMA! CALMA!
Os gritos foram tão fortes
que Josiel ficou aterrorizado e esqueceu o pequeno degrau que existia
na entrada da porta. E não deu outra... Josiel tropeça e sob os olhares
atônitos de seus colegas a bandeja literalmente voa para dentro da sala e
cai aos pés da professora Linda esparramando terrinas, sopa e fumacinhas
para todos os lados. Em segundos intermináveis para Josiel, a professora
grita de dor pela queimadura de pingos de sopa que caíram nos seus pés e
Josiel vê seus colegas levantarem saindo de suas classes em sua direção.Num coro uníssono vociferarem:
-BABACA!
Ao mesmo tempo ouviu ao longe
os berros da professora:
- NÃO! NÃO! CALMA! Sem violência, voltem para
seus lugares. Sem violência !
Foi a última coisa que Josiel ouviu.
Quando acordou na sala da Direção viu sua professora com os cabelos
revoltos, a roupa toda suja e com rasgos. A Diretora esfregando as
canelas e braços e alguns outros professores em volta com expressões de
admiração.
- O que aconteceu? Perguntou Josiel com uma voz quase
inaudível.
- Você tropeçou, caiu e a merenda da turma foi ao chão. Os
colegas não te lincharam porque impedimos a muito custo !
- Viu... e
depois vocês dizem que a merenda escolar é muito importante para a saúde
dos alunos !
Não houve resposta.
(AUTOR: Renato Hirtz)
O BANHO PEDAGÓGICO ( CAUSO)
O Othaviano era
o mais velho,metido a malandro e querendo sempre levar vantagem em
tudo.O problema era que o tudo sempre levava vantagem dele.O Arlindo era
um pequenininho que não podia ver um rabo de saia que se atirava logo a
dar uma cantada.O porém era que ele acabava sempre levando um grande
fora ou correndo dos namorados,noivos e maridos das mulheres.O Zeraldo
era o carrancudo a primeira vista,mas um grande sacana.Aprontava grandes
sacanagens e sempre com aquela seriedade militar.Havia ainda o Roberval
era o mais tímido,porém muito sacana.Era o “come quieto”.Fazia suas
peraltices mas mantinha um certo estilo que lhe proporcionava
segurança.Completava-se o grupo com o Modestino,o Rualdo,o Josué e o
Carlitos que somavam-se as traquinagens dos demais.
Certa ocasião. o
professor Marialdo marcou com todos um trabalho de campo.Estariam “in
lócus” estudando a flora de um riacho extremamente conhecido da
cidade.Como o professor era extremamente exigente com seus alunos fez
uma longa preleção explicando todos os detalhes para execução do
trabalho. Os alunos deveriam estar com sua “maleta biológica” com todo o
material necessário entre eles tubos de ensaio com tampas, tesouras de
diversos tipos, pipetas e pinças dos mais diversos tamanhos, luvas,
botas, roupa adequada, enfim não poderia participar daquela sem os
devidos recursos necessários. As gurias venderam as jóias para comprar o
material indicado que era de alto custo, entretanto a turma dos guris
liderada pelo Othaviano decidiu buscar outra alternativa.
Reuniram-se no final
de semana e utilizando-se de material descartável e reciclável
resolveram fabricar seus instrumentos.Vidrinhos,tampinhas,arames,um
pedaço de filó (para fabricação de redes de
captura),garrafas,taquaras,botas e luvas foram adaptadas nos baús de
quinquilharias de seus pais...ao final da tarde de domingo cada um
estava com o material completo e pronto para ser usado.
E lá se foram na
segunda-feira para a tão aguardada aula prática de coleta de material
no famoso riacho. Chegando ao local previamente determinado, encontraram
as gurias eufóricas de botinhas, luvinhas e com sua maletinha
aguardando o professor Marialdo. A farra iniciou quando viram o material
dos guris.O que era para ser quadrado tinha uma forma triangular e o
esférico aproximava-se do quadrilátero.A visão do material era uma obra
inacabada do capeta !
O sol da tarde de final de março era estranhamente
escaldante e recebeu o professor Marialdo metido em uma calça de
borracha, completada por monstruosas botas, uma maleta enorme (mais para
uma mala a tiracolo do que outra coisa), com um guarda pó muito alvo,
tendo suas mãos protegidas por grandes luvas e um chapéu de palha
ridículo que completava uma figura cômica. Trazia uma rede de coleta
aquática em uma das mãos e já fazia sinal de silencio com a outra. A
figura provocava risinhos entre as gurias e altas gargalhadas entre os
guris, que estavam despojadamente vestidos e não esperavam ver aquela
imagem que mais lembrava um astronauta do que outra coisa.
Dadas as
determinações finais sobre todos os cuidados necessários a coleta e
evitar alguma contaminação, tendo em vista que era um escoadouro de
esgotos residenciais e industriais o professor em tom solene diz: - Com
muita calma, pessoal, temos a tarde inteira para realizar a atividade.
Sem pressa e muita atenção para não ocorrer nenhum acidente.Eu serei o
primeiro a descer a rampa e entrar no riacho.Vejam que ele tem muita
matéria orgânica em decomposição.Muito cuidado.Observem como se deve
proceder. Ajeita-se e empertigado dá o primeiro passo para descer a
rampa e o que ele mais queria evitar aconteceu.
Se houve o barulho do
escorregão,o baque e um gemido abafado e o professor Marialdo Rolando
com maleta e tudo em direção ao riacho. Todos ficaram momentaneamente
estáticos até o professor literalmente mergulhar no riacho, em meio a
fezes não decompostas e todo aquele material fétido.
Paralisados as
gurias só davam pequenos gritinhos e os guris não sabiam se desatavam a
rir ou com as mãos nuas ajudavam o professor sair daquela situação e
corriam o risco de contaminação. O professor se coloca em pé depois de
várias tentativas e totalmente preto devido ao material putrefato do
riacho, junta a maleta, pega sua rede coletora, deixa sua coluna
geometricamente ereta e começa a subir a rampa sob ameaças dos guris e
gurias de ajudá-lo, mas impedidos pelo pavoroso fedor que exalava e
devido à gosma que cobria o corpo do mestre.
Já seguro na margem ele
olha, com verdadeiro furor aos alunos e em tom catedrático diz:
- A aula
prática está encerrada. Até a próxima semana.
Com um barulho
característico de sapato encharcado de água, deixando um rastro de odor
terrível e visivelmente derrotado o professor entra em seu carro e sai
em desabalada carreira. Neste momento, em meio à flora e fauna
característica da região ouve-se uma gargalhada uníssona dos guris e
gurias...
(Por Renato Hirtz)
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