Uma mulher vistosa.
Extremamente objetiva e excelente no
comando de uma equipe de trabalho. Sua voz rompia o silêncio dos corredores e
salas da repartição pública onde trabalhava. Sempre com um sorriso nos lábios
possuía uma habilidade no trato dos problemas mais simples aos mais complexos. Era
uma fonte de energia e transferia com
facilidade esta capacidade aos seus comandados.
Não
havia trabalho ou problema que lhe causasse algum desconforto. Vestida com
elegância, sempre maquilada e sobre seus sapatos de saltos alto somava-se a uma
boa varrida numa faxina em uma sala até recepcionar com todo o cerimonial
devido uma autoridade que vinha tratar assuntos profissionais. Sempre possuía
uma solução na ponta da língua. Detentora de raciocínio rápido vislumbrava
sempre uma alternativa de solução para algum entrave que surgisse.
Não
se descuidava de sua aparência. Social ou despojadamente mantinha uma elegância nata. Sempre nas
quartas-feiras, por força de suas horas extras, tirava um tempinho para ir ao
salão de beleza para tratar seus cabelos, pele e principalmente as unhas. Deixava toda a
rotina de trabalho direcionada de tal forma que nada ficasse pendente na sua
ausência.Verificava a situação de cada setor sob sua responsabilidade. Nada
podia parar por estar ausente. Depois de todo um ritual de orientações e
repetidas verificações de que tudo andaria em nível de excelência partia para
sua sessão de embelezamento.
Naquela
tarde alguns problemas deveriam ser solucionados ao final do expediente e ela
deveria retornar. Nada podia sair fora de seu conhecimento e comando. Dispensou
o uso do carro. Foi lépida e faceira caminhando até o instituo de beleza. Era
assim que às vezes chamava. Como já tinha uma certa idade, na sua época esta
era a denominação dos atuais salões de beleza. Uma caminhada de ida e volta lhe
faria bem. Entre muitos cumprimentos aos conhecidos e alguns admiradores chegou
ao seu destino.
Entre
lavar, tratar e mudar a tonalidade da cor dos cabelos conversava alegremente com
suas conhecidas. Ali era uma espécie de central de notícias novas e
oportunidade de relembrar casos passados. Fazer as unhas das mãos e dos pés era
a próxima etapa separada por um paradisíaco cafezinho. Era um momento seu. Coisa
que beirava a magia de histórias de princesas. Tudo pronto e satisfeita com o
resultado é hora de retornar ao mundo real. Despedidas feitas,sai em direção ao
prédio onde trabalha.
Sua
sensação era de que todos na rua sabiam que ela havia saído de um instituto de beleza.
Novamente entre acenos e expressões de saudações aos que a conheciam cuidava
para não roçar as mãos em
nada. Numa sacola iam seus sapatos. Nos pés um chinelo de
dedo para não estragar o esmalte. Deveria ficar bem seco para voltar a calçar
seus habituais sapatos de salto alto. A cor do esmalte contrastava com a cor de
sua pele. Ficará muito bonito.
Atravessando
uma rua e outra, passando pelos transeuntes com cuidado para não pisarem em
seus pés chegou a uma parada de ônibus. Ali se aglomeravam muitas pessoas na
expectativa da chegada dos coletivos. A calçada ocupada no seu todo impedia a
sua passagem. Desviou para o leito da rua e o bendito chinelo de dedo solta uma
das tiras. O desequilíbrio foi inevitável. O tropeço mais ainda. E diante de
uma pequena multidão, Fiorela, desaba. Foi ao chão por inteira.
Socorrida
por alguns cidadãos prestativos ergueu-se tentando manter sua altivez e sorriso
machucado e embaçado pelo tombo. Agradecida segue quase em disparada na direção
do local onde trabalhava. Sacola rasgada,chinelos na mão,joelhos esfolados e
cabelo desfeito era o verdadeiro quadro da dor e sem a moldura. Poderia ter
quebrado um dos pés ou uma das mãos.Quem sabe um braço. Imagina se tivesse
contundido o rosto.
Sua
chegada na repartição foi um alvoroço. Sua situação gerou as mais diversas
reações. Das tradicionais expressões de espanto até risos contidos giravam em torno da chefe. Entre encontrar
paninhos e água para lavar os machucados, escova para reparar o penteado e
palavras de consolo ouve-se as primeiras palavras de Fiorela.
-
Calma gente. Calma.Vamos manter a calma. Foi só um susto. Ainda bem que
consegui salvar o esmalte das unhas das mãos e pés ! Ainda bem. Nenhum arranhão
no esmalte ! O cabelo se dá um jeito. Vamos voltar ao trabalho.
E
lá se foram todos de volta a rotina.
(Renato Hirtz – 2012 – Lembrança
de um fato real)
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